O anúncio foi feito no perfil do Twitter do governo da República Tcheca, que ocupa a presidência rotativa do Conselho da União Europeia (UE). "Não foi uma missão impossível! Os ministros de Energia dos 27 países-membros da UE, à exceção da Hungria, chegaram a um acordo político sobre a redução da demanda de gás para o inverno", afirma o comunicado. O documento pactuado estabelece que cada nação faça "todo o possível" para reduzir o consumo de gás em 15% entre agosto de 2022 e março de 2023 — em comparação com a média dos últimos cinco anos do mesmo período. A meta de 15% será compulsória, caso Moscou interrompa totalmente o envio de gás para a Europa.
Apesar do avanço, a UE cedeu e fez concessões a alguns países, com base nos níveis de dependência de gás e de armazenamento do combustível. De qualquer forma, a medida é vista como uma tentativa de reduzir a dependência energética de Moscou e aliviar o impacto da interrupção no fornecimento do produto russo, em retaliação às sanções financeiras impostas ao Kremlin. Os cortes de gás por parte da estatal petrolífera Gazprom não intimidaram o bloco. Além do racionamento, a UE decidiu renovar as sanções aplicadas em 2014 contra o governo de Vladimir Putin por um período adicional de seis meses, até o fim de janeiro de 2023.
"Hoje, a União Europeia deu um passo decisivo para enfrentar a ameaça de interrupção total do gás por parte de Putin. Saúdo fortemente a aprovação, por parte do Conselho, do Regulamento do Conselho relativo a medidas coordenadas de redução de demanda do gás", afiirmou Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia (órgão executivo da UE). Segundo ela, o compromisso coletivo para diminuir em 15% o consumo do gás "é muito importante e ajudará a preencher nosso estoque antes do inverno".
"Ao agir em conjunto para reduzir a demanda do gás, levando-se em conta todas as relevantes especificidades nacionais, a UE garantiu bases sólidas para a solidariedade indispensável entre os países-membros, face à chantagem energética de Putin", acrescentou Von der Leyen. Ela ressaltou que o anúncio da Gazprom sobre o corte de remessas de gás para a Europa através do gasoduto Nord Stream 1, "sem qualquer razão técnica justificável, ilustra ainda mais a natureza não confiável da Rússia como fornecedora de energia".
Jozef Síkela, ministro da Indústria e do Comércio da República Tcheca, disse que o bloco "deu um passo enorme para garantir os suprimentos (de gás) para os cidadãos e a economia durante o inverno que se aproxima". "As negociações não foram fáceis. (...) No fim das contas, todos entendem que sacrifícios são necessários. (...) O racionamento gradual nos próximos meses assegurará que tenhamos gás suficiente. Não permitiremos que a Rússia ameace nossa segurança ao interromper, de forma deliberada, as remessas de gás e que utilize o produto como arma política", declarou.
Países insulares interconectados com a rede de gás da UE ficarão isentos de racionamentos obrigatórios — são os casos de Irlanda, Malta e Chipre. De acordo com o jornal britânico The Guardian, as nações bálticas também podem solicitar isenção de cortes por terem os sistemas de eletricidade ligados à Rússia. Espanha, Portugal e Grécia demonstraram oposição a uma meta uniforme de 15% de redução, o que levou a União Europeia a considerar cada caso.
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Preocupação
Especialista da Universidade de Harvard e do Centro para Análise Política Europeia, Benjamin L. Schmitt afirmou ao Correio que o acordo para a redução de consumo de gás em até 15% por parte dos países europeus "ilustra o nível de preocupação de Bruxelas com o fato de que o regime de Putin continua a usar a energia como arma contra democracias do continente". "É vital que passos desse tipo, ligados à segurança energética, sejam tomados para que os líderes europeus mantenham sua habilidade de fornecer apoio significativo à Ucrânia, mesmo se o Kremlin seguir aplicando pressão contra o continente, por meio de cortes generalizados de energia", afirmou.
Para Peter Zalmayev, diretor da organização não-governamental Eurasia Democracy Initiative (em Kiev), o racionamento de gás é um passo na direção correta, porém, demasiadamente tardio. "Depois de anos de dependência do gás russo, isso vem com muito atraso. É óbvio que se trata de uma medida necessária, pois os europeus perceberam que não haverá mais negócios com a Rússia, como costumavam fazer, tão logo eles abandonem essa dependência", disse à reportagem. "O interessante é que os países-membros da UE estão comprometidos com um cenário de vitória da Ucrânia na guerra. Putin concluiu que não existe uma estratégia clara de vitória para ele na Ucrânia."
