Suspeita de "balão espião" provoca novo abalo nas relações entre EUA e China

Washington adia visita diplomática a Pequim após detecção de suposto artefato espião no espaço aéreo americano, classificado como "ato irresponsável". Governo Xi diz tratar-se de um equipamento científico e lamenta episódio, atribuído a "uma força maior"

Correio Braziliense

postado em 04/02/2023 06:00

(crédito: AFP)

As complicadas relações entre Washington e Pequim azedaram ainda mais após a identificação de um suposto balão de espionagem chinês no espaço aéreo dos Estados Unidos. Autoridades do governo de Xi Jinping lamentaram a intrusão, segundo elas, "involuntária", alegando ainda se tratar de um artefato para fins científicos. Entretanto, as explicações não atenuaram a situação. Após o incidente, o secretário norte-americano de Estado, Antony Blinken, adiou a viagem que faria a partir de amanhã à capital chinesa. Mais tarde, por meio de um comunicado, ele denunciou o "ato irresponsável".

Segundo um funcionário do governo de Joe Biden, que pediu para não ser identificado, a visita de Blinken será reprogramada quando "as condições forem adequadas". "Tomamos conhecimento de que a China lamenta, mas a presença desse balão no nosso espaço aéreo é uma clara violação da nossa soberania, assim como do Direito Internacional, e é inaceitável", destacou.

Blinken conversou diretamente com autoridades chinesas, disse essa fonte, alegando que, se a viagem tivesse sido mantida nesse contexto, "teria limitado muito seriamente" a agenda. Em telefonema a Wang Yi, vice-chanceler chinês, Blinken classificou o episódio como "uma violação clara da soberania dos EUA e da legislação internacional".

O episódio se tornou público na quinta-feira, mas, segundo informações, o Pentágono vinha monitorando o balão chinês "há vários dias", ainda que sem considerá-lo uma grande ameaça. A pedido do presidente Joe Biden, o Departamento de Defesa considerou abater o aparato, mas decidiu não fazê-lo devido aos potenciais riscos para as pessoas em solo.

"Claramente, a intenção desse balão é a vigilância, e a rota de voo atual o leva a uma série de locais sensíveis", relatou um oficial, acrescentando: "Estamos tomando medidas para nos proteger da coleta de informações confidenciais por parte de inteligência estrangeira".

Desvio de rota

Inicialmente, a China pediu que não houvesse exageros sobre o assunto, mas acabou reconhecendo que efetivamente se tratava de um aparato procedente do país. "Trata-se de uma aeronave civil utilizada para fins científicos, principalmente meteorológicos", declarou um porta-voz do Ministério das Relações Exteriores chinês em comunicado. Por causa do vento, teria ocorrido um desvio de trajetória. A nota assinala que Pequim "lamenta" que o ingresso do equipamento no espaço aéreo dos Estados Unidos por "uma força maior".

Segundo a imprensa norte-americana, antes de chegar aos EUA, o balão sobrevoou as Ilhas Aleutas, no norte do Oceano Pacífico, e o Canadá. Concretamente, o aeróstato passou pelo estado de Montana, que abriga instalações de mísseis nucleares, onde foram mobilizados aviões de combate que se aproximaram dele, disse um funcionário do Pentágono. O governo canadense informou que estava investigando um "segundo incidente potencial".

Não é a primeira vez que o Exército norte-americano registra uma intrusão do tipo, mas, desta vez, o objeto permaneceu mais tempo no espaço aéreo dos EUA. Além disso, o episódio ocorre num momento já delicado, somando-se às tensões entre Pequim e Washington por Taiwan, que o governo chinês considera parte de seu território e cujo controle o governo do Xi pretende recuperar um dia, mesmo que por força.

Políticos norte-americanos reagiram com indignação ao acontecimento. "Derrubem esse balão!", clamou o ex-presidente republicano Donald Trump em sua rede social, Truth Social.

"Essa violação da soberania americana, poucos dias antes da visita do secretário de Estado Blinken à China, mostra que os sinais recentes de abertura (por parte de Pequim) "não refletem uma mudança real de política", comentaram Mike Gallagher e Raja Krishnamoorthi, respectivamente, líderes republicano e democrata de um comitê parlamentar sobre a China.

A visita de Blinken à China seria a primeira de um secretário de Estado norte-americano desde outubro de 2018, no momento em que os dois países tentam evitar que as tensões entre ambos levem a um conflito aberto.