QUEDA DE AÇÕES

Como crise do Credit Suisse manchou reputação de estabilidade da Suíça

As ações do Credit Suisse entraram em queda livre, e mesmo uma declaração de confiança do Banco Nacional da Suíça e uma oferta de US$ 50 bilhões (R$ 260 bilhões) em apoio financeiro não conseguiram estabilizar a situação

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postado em 21/03/2023 13:45 / atualizado em 21/03/2023 13:45
 (crédito: Getty Images)
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Segundo maior banco suíço e uma das 30 instituições financeiras do mundo consideradas "grandes demais para falir", o Credit Suisse encontrou seu ocaso.

Fundado em 1856, o banco agora foi comprado pelo rival e conterrâneo UBS em meio a uma negociação histórica, em um acordo mediado pelo governo suíço.

"Com a aquisição do Credit Suisse pelo UBS, foi encontrada uma solução para garantir a estabilidade financeira e proteger a economia suíça nesta situação excepcional", diz um comunicado do Banco Nacional da Suíça, que observou que o banco central trabalhou com o governo suíço e a Autoridade de Supervisão do Mercado Financeiro Suíço para promover a fusão dos dois maiores bancos do país.

Apesar disso, as ações do Credit Suisse voltaram a cair e valem hoje menos do que US$ 1 (R$ 5,23).

Foi uma reviravolta que poucos imaginariam acontecer, quando em 2008, no auge da crise financeira que varreu o mundo, o Credit Suisse, embora afetado como o restante dos bancos, conseguiu resistir à tormenta sem um resgate do governo, ao contrário do UBS, que agora virou seu salvador.

Mais recentemente, o "rosto" do Credit Suisse tem sido o deus do tênis suíço, Roger Federer. Ele sorri em cartazes nos aeroportos do país, um símbolo de força, excelência, resistência e confiabilidade.

Mas por trás da campanha brilhante havia alguns grandes problemas. Gestão divisiva, exposição cara à empresa financeira Greensill Capital, que entrou em colapso em 2021, um caso decadente de lavagem de dinheiro e uma perda da confiança do cliente nos últimos meses. Resultado: bilhões foram retirados do banco.

A debandada acabou ganhando força após o Banco Nacional Saudita, o maior acionista do Credit Suisse, com quase 10% de participação, indicar que não aumentaria seu investimento.

As ações do Credit Suisse entraram em queda livre, e mesmo uma declaração de confiança do Banco Nacional da Suíça e uma oferta de US$ 50 bilhões (R$ 260 bilhões) em apoio financeiro não conseguiram estabilizar a situação.

Roger Federer recebe um cheque do Credit Suisse após vencer um torneio de tênis em 2005 na Alemanha
Getty Images
Roger Federer virou rosto de propaganda do Credit Suisse

Dormiu ao volante?

Como isso pode ter acontecido?

Após a crise financeira, há 15 anos, a Suíça introduziu as chamadas leis "grandes demais para falir" para seus maiores bancos.

Era um recado claro às instituições financeiras: nunca mais o contribuinte suíço resgataria um banco do país, como aconteceu com o UBS.

Mas o Credit Suisse é um banco "grande demais para falir". Em teoria, tinha capital para evitar a catástrofe desta semana.

Também em teoria, os reguladores financeiros suíços e o Banco Nacional Suíço devem estar de olho nesses bancos sistemicamente importantes e podem intervir antes que ocorra um desastre.

Foi estranho, na semana passada, ver o restante do mundo reagir com preocupação real quando as ações do Credit Suisse despencaram e ignorar, a princípio, o que a Suíça estava falando.

Até mesmo a mídia suíça parecia não se importar com as manchetes do Financial Times e parecia mais interessada no debate contínuo sobre quanto apoio a neutra Suíça deveria oferecer à Ucrânia.

No momento em que todos se deram conta, tamanho dano já havia sido causado que o Credit Suisse não tinha mais salvação.

As consequências começaram a ameaçar não apenas todo o setor financeiro da Suíça, mas também da Europa.

Enquanto o governo se reunia em sessão de emergência para tentar encontrar uma solução, quase dava para sentir o cheiro do pânico em Berna.

Ao anunciar a aquisição do banco, o presidente suíço, Alain Berset, disse que "um colapso descontrolado do Credit Suisse levaria a consequências incalculáveis para o país e para o sistema financeiro internacional".

É difícil evitar a conclusão, dizem alguns suíços, de que as mesmas pessoas que deveriam ter agido para evitar o colapso do Credit Suisse estavam dormindo ao volante.

Reputação da Suíça prejudicada

Essa falta de atenção vai custar muito caro. A aquisição do UBS, pela insignificante soma de US$ 3 bilhões (R$ 16 bilhões), além de ser uma humilhação total para o Credit Suisse, provavelmente deixará seus acionistas um pouco mais pobres.

Haverá também perdas de empregos, talvez na casa dos milhares. Existem agências do Credit Suisse e do UBS em quase todas as cidades suíças. Assim que a aquisição estiver concluída, não fará sentido o UBS mantê-las.

Mas talvez o dano mais caro de todos seja a reputação da Suíça como um lugar seguro para investir.

Apesar dos escândalos ao longo dos anos relacionados às contas bancárias secretas de ditadores (incluindo o filipino Ferdinand Marcos e o congolês Mobutu Sese Seko, além de muitos outros), ou a lavagem de dinheiro para traficantes e sonegadores de impostos, os bancos suíços mantiveram essa reputação personificada na figura de Roger Federer: forte e confiável.

E agora? Um sistema que permite que um banco de 167 anos vá à falência, em poucos dias, à custa de muitos empregos e perdas maciças no valor das ações?

Isso pode causar enormes danos à reputação. O setor bancário suíço, os reguladores financeiros da Suíça e seu governo dizem que a aquisição é a melhor solução.

No último minuto, foi a única solução. Nos próximos dias, haverá algumas perguntas difíceis de responder.

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