Estados Unidos

Tragédia se repete e três crianças de 9 anos morrem em tiroteio nos EUA

Atirador invade escola presbiteriana particular, em Nashville (Tennessee), mata três crianças de nove anos e três adultos, antes de ser executado pela polícia. Presidente Joe Biden pressiona o Congresso a banir o comércio de armas de assalto

Rodrigo Craveiro
postado em 28/03/2023 06:00
 (crédito: Seth Herald/Getty Images/AFP)
(crédito: Seth Herald/Getty Images/AFP)

No site da Covenant School, uma instituição de ensino presbiteriana particular de Nashville (Tennessee), uma mensagem afirma que "a beleza de uma escola pré-6º ano está em sua simplicidade e inocência". "Os estudantes são livres para serem crianças — eles podem se sentir conhecidos, de forma plena e segura, por nosso corpo docente e se tornarem líderes sob sua orientação", diz o texto. A beleza e a inocência da infância foram manchadas de sangue na manhã de ontem.

Às 10h12 (12h12 em Brasília), Audrey Elizabeth Hale, 28 anos, acessou o prédio da Covenant School por uma entrada lateral, depois de atirar contra a porta. Carregava dois fuzis AR-15 e uma pistola. Matou três crianças (Evelyn Dieckhaus, Hallie Scruggs e William Kinney, todas com 9 anos) e três adultos (Cynthia Peak, 61; Katherine Koonce, 60; e Mike Hill, 61), antes de ser executado, ao trocar tiros com cinco policiais, no lobby do segundo andar da escola. 

Na casa do pai de Hale, os policiais apreenderam um manifesto e um mapa desenhado com detalhes do prédio, como pontos de vigilância e de acesso. As autoridades também encontraram escritos que diziam respeito ao tiroteio, "de como as coisas ocorreriam". Segundo a agência France-Presse, Hale pretendia atacar "múltiplos locais" na cidade.

A imprensa norte-americana, citando fontes policiais, confirmou que o autor dos disparos é um homem transgênero. No LinkedIn, Hale usava o pronome "ele" e afirmava ter se graduado pela Nossi College of Art, em Nashville, em design gráfico.

John Drake, chefe da polícia de Nashville, descreveu o atirador como "alguém que tinha vários cartuchos de munição e estava preparado para confronto e para causar mais danos do que foi feito". Segundo as autoridades, o assassino não possuía antecedentes criminais e teria estudado na Covenant School "em algum momento".  

Foi o 129º tiroteio em massa registrado nos EUA apenas neste ano — uma média de três ataques a cada dois dias. O presidente Joe Biden classificou o tiroteio em Nashville de "o pior pesadelo de uma família" e cobrou do Congresso a aprovação de uma legislação que proíba a venda de armas de assalto. "Temos que fazer mais para acabar com a violência armada — está destruindo as nossas comunidades, destruindo a alma desta nação. Temos que fazer mais para proteger as nossas escolas, para que não sejam transformadas em prisões", declarou o democrata.

"Já basta!", disse a porta-voz da Casa Branca, Karine Jean Pierre. "Quantas crianças mais terão que ser mortas antes que os republicanos no Congresso se levantem e ajam para aprovar o banimento de armas semi-automáticas?", questionou. O ex-presidente Barack Obama usou o Twitter para lamentar a tragédia. "Estamos falhando com nossos filhos. As armas são, agora, a principal causa de mortes de crianças nos EUA. Michelle e eu choramos com os alunos e as famílias da Covenant School, hoje", escreveu. O senador republicano Bill Hagerty se disse "devastado", mas não citou a tragédia. Marsha Blackburn, sua colega, limitou-se a convocar as pessoas a "rezarem" pelas vítimas. 

Kelly Stooksberry estava em um prédio de escritórios a cerca de 800m da escola. "Nós escutamos um monte de sirenes e vimos o que parecia serem centenas de ambulâncias. Ficamos assustados e buscamos encontrar informações nos sites de notícias", contou ao Correio a técnica jurídica de 30 anos. Foi então que o marido dela viu tuítes dos bombeiros de Nashville no qual confirmavam a presença de um atirador na escola. "Nosso edifício trancou as portas e nós observamos o que se passava pela janela do andar de cima. A polícia montou uma barricada para facilitar a passagem das equipes de emergência. Vimos adultos, presumi que fossem pais dos alunos. Eles começaram a correr em direção à Covenant, e me pus a filmar. Também vimos uma mulher cair, de joelhos, e se apertar, como se estivesse em ataque de pânico", acrescentou Stooksberry. 

Horas depois de se reunir com os pais de alunos da Covenant School, o psicólogo Shamender Tawar, cofundador da organização The Unity of Faiths Foundation (Tuff) e especialista em situações de crise, descreveu à reportagem a atmosfera na Igreja Batista Woodmont, onde as famílias se encontraram com os estudantes. "Pude ver o medo e a raiva nos olhos dos pais. A atmosfera parecia sombria e reverente. Havia um senso de angústia e de dormência, mas uma unidade dentro da dor", contou. Ele acrescentou que esteve com os pais das três vítimas. "Segurei as mãos deles, os abracei e tentei mantê-los calmos. Eles estavam despedaçados."

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  • Estudantes da Covenant School chegam de ônibus à Igreja Batista Woodmont, onde foram recebidas pelos pais
    Estudantes da Covenant School chegam de ônibus à Igreja Batista Woodmont, onde foram recebidas pelos pais Foto: Seth Herald/Getty Images/AFP
  • Joe Biden:
    Joe Biden: "Temos que fazer mais para acabar com a violência armada" Foto: Chip Somodevilla/Getty Images/AFP
  • Mãe caminha com os filhos, após o reencontro: desespero por notícias
    Mãe caminha com os filhos, após o reencontro: desespero por notícias Foto: Seth Herald/Getty Images/AFP

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Manuel Oliver
Manuel Oliver (foto: Arquivo pessoal)

O que o presidente Biden pode fazer para impedir tragédias semelhantes?

É importante saber que o presidente Biden sempre demonstrou intenção de resolver esse problema. No entanto, não tem apoio suficiente, nem da Câmara dos Representantes, nem do Senado. Suas intenções não bastam. Falta uma pressão social, que os cidadãos saiam às ruas e exijam que as coisas mudem. Esse problema está na complacência do Partido Republicano com a indústria das armas. Não existe nenhum tipo de regulação para ela nos EUA. O acesso às armas é livre. Em alguns estados, há pessoas de 18 anos, às vezes até menos, que compram armas. O enorme problema que temos é de raiz: o acesso às armas. 

Na condição de pai de um jovem assassinado em um tiroteio em massa, como fica o seu coração quando vê esse tipo de tragédia ocorrer repetidas vezes?

O meu coração está rasgado há mais de cinco anos. Essas histórias se passam diariamente. Quando ocorrem em uma escola, no entanto, acabam se tornando virais. Por isso, chamam tanto a atenção. Como sociedade, temos que atuar e responder com a mesma firmeza com que o lobby das armas tem feito. Há décadas, a indústria vende armas aos norte-americanos e alimenta uma cultura armamentista. Faço um apelo a uma greve nacional. Que nossos filhos não mais sejam levados à escola até que não existam as medidas, por lei, que permitam às pessoas acessarem armas. 

Eu acho...

"Os EUA precisam, desesperadamente, de leis de controle de armas mais rígidas. Em vez de se concentrarem nisso, as autoriades se focam em atacar pessoas por sua expressão de gênero, e quem amam e o que escolhem fazer com seus corpos. O governo se preocupa mais em regular meu útero do que em proteger seus cidadãos contra a violência armada."

Kelly Stooksberry, 30 anos, técnica judiciária, trabalha a 800m da Covenant School

 

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