Donald Trump se livrará do constrangimento mundial de deixar o tribunal algemado, mas não escapará de ter as impressões digitais colhidas e de ser fotografado, de frente e de lado, para a ficha criminal. Indiciado em 34 acusações por um grande júri do estado de Nova York, o ex-presidente deverá se apresentar à Corte de Manhattan na próxima terça-feira, às 14h15 (15h15 em Brasília). Os crimes atribuídos ao magnata serão conhecidos no mesmo dia. De acordo com a emissora de tevê CNN, eles têm ligação com fraude comercial.
A decisão de Alvin Bragg, procurador do Distrito de Manhattan, de torná-lo réu por ocultar o pagamento de US$ 130 mil (ou R$ 420 mil à época) como suborno à ex-estrela de filmes pornôs Stormy Daniels, pegou Trump de surpresa, segundo fontes próximas. O repasse a Daniels teria sido feito pouco antes das eleições presidenciais de 2016 como estratégia para silenciá-la sobre uma suposta relação extraconjugal.
Joe Tacopina, um dos advogados de Trump, antecipou à imprensa norte-americana que seu cliente vai se declarar inocente e disse que há "zero" chance de que ele aceite um acordo de culpa. "Isso não vai acontecer. Não há delito", assegurou. O advogado admitiu que o indiciamento, na noite de quinta-feira, foi recebido com "choque" por Trump, mas, de acordo com Tacopina, o republicano está "disposto a lutar".
Tacopina salientou que, apesar de Trump não ser algemado, provavelmente terá que caminhar pelos corredores do tribunal diante de jornalistas e meios de comunicação.
Stormy Daniels, 44 anos, rompeu o silêncio e confessou que se sente "orgulhosa" pela decisão da Justiça. "Trump já não é intocável", comemorou, em entrevista ao jornal britânico The Times, em local não divulgado. Ela classificou o indiciamento do ex-presidente como um fato "epico e monumental", mas admitiu temor em relação às consequências da prisão. "O outro lado disto e que continuará dividindo as pessoas e fazendo com que se levantem em armas. Seja qual for o resultado, irá provocar violência e haverá feridos e morte", advertiu.
Ontem, ao ser questionado por jornalistas sobre como vê as críticas em relação a uma suposta motivação política no indiciamento do antecessor, o presidente democrata, Joe Biden, desconversou. "Eu não tenho comentários sobre Trump", respondeu. No entanto, a ex-líder da Câmara dos Representantes Nancy Pelosi lembrou que "ninguém está acima da lei". Por sua vez, Mike Pence, que foi vice de Trump, considerou "ridículas" as acusações.
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Sem regalias
"Trump não deve esperar tratamento especial apenas porque é ex-presidente ou potencial candidato à Casa Branca em 2024", alertou ao Correio Barbara McQuade, professora da Faculdade de Direito da Universidade de Michigan e ex-procuradora federal chefe para o Distrito Leste de Michigan. "Ele, provavelmente, lutará de forma vigorosa, o que significa apresentar moções para arquivar o caso e ir a julgamento. Eu acredito que o procurador (Bragg) saiba disso e esteja preparado para o desafio."
Alan Dershowitz, historiador político da Universidade de Harvard e ex-advogado de Trump no primeiro processo de impeachment, em janeiro de 2019, afirmou ao Correio acreditar que seu ex-cliente será levado a julgamento e, eventualmente, legalmente justificado. "Ele poderá condenado por um júri de Manhattan, mas é provável que isso seja revertido em apelação."
Para Thomas Whalen, professor de ciências sociais e especialista em presidencialismo pela Universidade de Boston, o ponto mais positivo do indiciamento do republicano é mostrar que ninguém está acima da lei na democracia americana. "Especialmente alguém como o ex-presidente, que ameaçou 'a morte e a destruição' contra os supostos oponentes políticos", lembrou à reportagem.
Ainda segundo Whalen, as acusações criminais podem fazer com que Trump esteja prestes a ganhar a nomeação com candidato do Partido Republicano para as eleições de 2024. "Trump vai se retratar como um cruzamento entre Sir Thomas Moore (ex-chanceler do Reino Unido e humanista do Renascimento) e Joana D'Arc — uma espécie de mártir político. Isso jogará muito bem para a MAGA ('Faça a América grande novamente'), a base tóxica do seu partido. A grande questão é se o restante da nação sente o mesmo. Afinal, Trump não é, politicamente, um 'homem de todas as estações'", comentou.
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Duas perguntas para...
Alan Dershowitz, historiador político da Universidade de Harvard e ex-advogado de Trump no processo de impeachment
Como o senhor vê o indiciamento de Donald Trump?
É um dos mais fracos casos que já vi em 60 anos de prática do direito penal. É uma tentativa partidária de manter a promessa de campanha de Joe Biden de impedir que Trump se torne presidente. Isso coloca em perigo a democracia e o Estado de direito.
Quais serão as consequências políticas dessa decisão do promotor Alvin Bragg?
O indiciamento de Trump pode sair pela culatra, sob o ponto de vista político. A foto de Trump ficado se tornará o seu pôster de campanha.
Eu acho...
"Ainda é difícil avaliar as consequências políticas do indiciamento de Trump. Por um lado, alguns eleitores podem desaprovar a suposta má conduta do ex-presidente. Por outro lado, alguns provavelmente apenas reforçarão seu apoio. Trump está usando o indiciamento como base para arrecadar fundos para a sua campanha presidencial."