Ao falar sobre o motim do Grupo Wagner, o presidente da Rússia, Vladimir Putin, usou pela primeira vez o termo "guerra civil" e rendeu uma homenagem às tropas do Ministério da Defesa, da Guarda Nacional, do Serviço Federal de Segurança (FSB) e do Ministério do Interior. "Vocês protegeram a ordem constitucional, as vidas, a segurança e a liberdade dos nossos cidadãos. Vocês salvaram nossa pátria da turbulência, e interromperam a guerra civil", declarou o chefe do Kremlin, ao receber comandantes militares na histórica Praça da Catedral do Kremlin, em Moscou.
"Em uma situação dramática, vocês agiram de forma clara e coerente, provaram sua lealdade ao povo da Rússia e ao juramento militar, e demonstraram responsabilidade pelo destino da Pátria e por seu futuro", acrescentou Putin. "Vocês se opuseram a estes distúrbios, cujo resultado teria sido, inevitavelmente, o caos." Na noite desta terça-feira (27), a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) assegurou estar pronta para defender-se da Rússia ou de Belarus.
Em seu discurso, Putin admitiu que, somente no ano passado, a Rússia repassou US$ 1 bilhão para os mercenários comandados por Yevgeny Prigozhin. "Entre maio de 2022 e maio de 2023, o Estado destinou 86,262 bilhões de rublos (US$ 1 bilhão) em pagamentos ao grupo Wagner", afirmou o russo, na reunião transmitida pela televisão russa. Mais cedo, o Ministério da Defesa revelou que "equipamentos militares pesados" do Grupo Wagner serão transferidos para as unidades ativas do Exército russo.
O presidente de Belarus, Alexander Lukashenko, confirmou que Prigozhin estava em Minsk, capital da ex-república soviética. Pelo pacto firmado no sábado (24), o fundador do Grupo Wagner suspenderia o avanço a Moscou, devolveria suas tropas para os acampamentos e se exilaria em Belarus. Citado pela agência de notícias russa Tass, Lukashenko contou ter convencido Putin a não matar o líder dos mercenários amotinados. "Uma decisão difícil foi tomada — acabar com Prigozhin. Eu disse a Putin: 'Sim, poderíamos eliminá-lo, não seria um problema'. (...) Eu disse a ele: 'Não faça isso. Esses caras (do Grupo Wagner) sabem se defender. Eles lutaram na África, na Ásia e na América Latina, e irão até o fim'."
Prigozhin estava desaparecido desde a noite de sábado, após o anúncio do fim da rebelião. Lukashenko não poupou Putin e fez uma crítica ao presidente russo, ao classificar o motim como "resultado da má gestão das rivalidades entre o Grupo Wagner e o Exército" de Moscou. "A situação fugiu do controle", afirmou o bielorrusso.
Professor de história da Universidade de São Paulo (USP), Angelo Segrillo analisa os discursos de Putin feitos nesta segunda-feira (26) e nesta terça-feira (27) como um indício de que ele caminha em duas direções. "Em uma delas, mostra ao público que o levante foi reprimido, sem derramamento de sangue. Em outra, tenta disfarçar uma espécie de derrota de seu governo, pois houve uma anistia aos combatentes do Grupo Wagner. No pronunciamento de sábado, Putin adotou um tom ambíguo: prometeu cumprir com o acordo mediado por Belarus e anunciou que punirá os amotinados", disse ao Correio.
Na segunda-feira, Putin ofereceu três opções ao Grupo Wagner: a desmobilização e o retorno para casa; a incorporação nas Forças Armadas russas; ou a ida para Belarus. Para Segrillo, o Kremlin sinaliza, com isso, o desejo de retirar a liderança de Prigozhin. "Acho que ele acabará com o Grupo Wagner. Mantê-lo, mesmo com outra liderança, sempre trará a lembrança do levante. Minha aposta é que ele desmobilize o Grupo Wagner e crie outra companhia militar privada." Ele lembrou que, na Rússia, o Código Penal proíbe o uso de forças mercenárias. "A maioria dos grupos não é registrada dentro da Rússia. Eles são criados em outros países e abrem filial na Rússia", disse.
Otan
O secretário-geral da Otan, Jens Stoltenberg, garantiu que a aliança militar ocidental está pronta para se defender de qualquer ameaça vinda de Minsk ou de Moscou — uma referência à chegada de Prigozhin a Belarus. Ele entende que a Otan aproveitará a cúpula em Vilnius, capital da Lituânia, em 11 e 12 de julho, para fortalecer seus sistemas de defesa.
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"Putin está em uma situação difícil. Ele realmente foi desafiado. Em vez de ter uma guerra civil, ele aceitou um acordo para evitar o derramamento de sangue. O presidente caminha na direção de manter uma face de homem forte, mas exibiu fraqueza: além do levante, foi obrigado a fazer concessões."
Angelo Segrillo, professor de história da Universidade de São Paulo (USP)