De um lado, a Coreia do Norte, que sofre os impactos das sanções econômicas impostas pelo Ocidente e um quase completo isolamento internacional. Também deseja fortalecer o seu programa de mísseis balísticos. De outro, a Rússia, que enfrenta o risco de ver exaurir os seus armamentos e munições em sua ofensiva à Ucrânia, além de ser alvo de retaliações do Ocidente. O anúncio sobre uma possível reunião entre o ditador norte-coreano, Kim Jong-un, e o presidente russo, Vladimir Putin, acendeu o alerta do Ocidente e preocupou, principalmente, os Estados Unidos. As suspeitas são de que o Kremlin estaria interessado em receber armamentos de Pyongang. O governo da Rússia não confirma o encontro entre os dois líderes. "Não, não podemos (confirmar), não temos nada a dizer sobre o tema", declarou o porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov.
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Não seria a primeira vez em que os dois países firmariam um acordo de defesa, mas a atual conjuntura, com a invasão ao território ucraniano, se impõe como um fator a mais de tensionamento geopolítico. Em 2022, um relatório divulgado pela Organização das Nações Unidas (ONU) destacou o papel que um diplomata norte-coreano teve em Moscou na aquisição de tecnologias de mísseis balísticos e na tentativa de obter cerca de 3 mil quilos de aço para o programa de construção de submarinos de Pyongyang. Jake Sullivan, conselheiro de Segurança Nacional da Casa Branca, avisou que a Coreia do Norte enfrentará consequências caso negocie armas com Putin. "Vão pagar um preço por isso na comunidade internacional", disse.
O jornal The New York Times revelou que a Rússia tem o interesse em obter peças de artilharia e mísseis antitanque da Coreia do Norte, enquanto o regime de Kim Jong-un necessita de tecnologia avançada para satélites e submarinos nucleares, além de alimentos para seus 26 milhões de cidadãos. O ucraniano Peter Zalmayev — diretor da organização não governamental Eurasia Democracy Initiative (em Kiev) — admitiu ao Correio que as notícias sobre a eventual negociação de armas entre Moscou e Pyongyang indicam uma "grave evolução" no conflito e no cenário geopolítico. "A Coreia do Norte possui um grande estoque de armamentos, os quais são compatíveis com os sistemas soviéticos. Por isso, a Rússia está ansiosa por esse tipo de cooperação", explicou. "Kim Jong-un obviamente espera algum tipo de cooperação militar de Moscou, como tecnologia para continuar o desenvolvimento de seu programa nuclear. Nessa parceria, os dois lados ganham."
Zalmayev ironiza e prefere chamar a relação entre Rússia e Coreia do Norte como entre "o feio e o mais feio". "Se olharmos para o escopo de aliados mais próximos da Rússia, durante essa guerra, veremos a Síria, a Venezuela, a Coreia do Norte, a Nicarágua, a Eritreia, e mesmo a China", afirmou. Professor de política comparativa da Universidade Nacional de Kiev-Mohyla, Olexyi Haran lembrou à reportagem que a Coreia do Norte é um Estado totalitário nuclear, que ameaça a existência de seus vizinhos. "Ela está sob sanções da ONU, mas o impacto delas é contornado com a ajuda de Moscou e de Pequim. A aproximação com o país de Kim Jong-un mostra que a Rússia não é uma superpotência, e precisa de recursos de regimes marginalizados. Se o Brasil de Lula é a favor da democracia e da paz, então, que tire as conclusões corretas."
Otan
Também no campo diplomático, o presidente da Romênia, Klaus Iohannis, denunciou ataques em território ucraniano "muito, muito perto" — ele enfatizou a proximidade — de sua fronteira. "Houve ataques registrados a 800m da nossa fronteira. Ou seja, muito, muito perto", disse Iohannis, ao receber o primeiro-ministro de Luxemburgo, Xavier Bettel. A Romênia é um país-membro da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan). Segundo a agência France-Presse, na segunda-feira (4/9), Bucareste negou a informação de Kiev de que drones russos caíram e explodiram em território romeno durante um ataque ao porto ucraniano de Izmail, às margens do Rio Danúbio. "Não houve pedaços, nem drones, nem outros componentes de outro aparelho que chegaram à Romênia", disse o presidente. No entanto, ele admitiu preocupação com o fato de que "estes ataques ocorram a uma distância tão pequena da fronteira romena".
De acordo com Haran, há indicações de que drones russos teriam inclusive atingido portos dentro do território romeno. "O que a Rússia faz é algo muito perigoso para os países da vizinhança. Alguns portos estão situados na fronteira com nações que integram a Otan", advertiu. O Artigo 5 do Tratado da Otan sinaliza que o ataque a um membro da aliança militar ocidental representa um ataque a todas as nações da organização.
Entenda as relações entre Moscou e Pyongyang
O que a Coreia do Norte pode oferecer?
Na semana passada, os Estados Unidos afirmaram que a Coreia do Norte forneceu foguetes e mísseis de infantaria a Moscou, em 2022, para o grupo paramilitar Wagner no conflito na Ucrânia. Moscou tem interesse em projéteis de artilharia que possam ser facilmente integrados, a fim de usá-los no conflito. Como a Coreia do Norte se encontra em estado permanente de guerra, desde 1953, mantém grandes reservas de artilharia.
O que os norte-coreanos querem em troca?
A Rússia tem tudo o que a empobrecida Coreia do Norte precisa: alimentos, fertilizantes e energia. Pyongyng poderia transferir, de Moscou, tecnologia-chave, know-how e capacidade de produção para alavancar a indústria bélica de Kim Jong-un.
O significado de um acordo
Estados Unidos, Reino Unido, Coreia do Sul e Japão afirmaram na semana passada, nas Nações Unidas, que qualquer pacto para aumentar a cooperação entre Rússia e Coreia do Norte violaria as resoluções do Conselho de Segurança, que proíbem acordos de armas com Pyongyang — as quais foram endossadas por Moscou. Especialistas não descartam um acordo na surdina, a portas fechadas.
EU ACHO...
"É uma mensagem para o Ocidente de que Vladimir Putin não negociará com a Ucrânia ou seus aliados em um futuro próximo. Ele está firmando as bases para uma guerra longa. Isso significa que o Ocidente precisa acelerar a produção armamentista em um nível ideal para que a Ucrânia alcance uma vitória significativa o quanto antes."
Peter Zalmayev, diretor da organização não governamental Eurasia Democracy Initiative (em Kiev)
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