Horror no Oriente Médio

Guerra Israel-Hamas: Familiares saem em marcha pelos 240 sequestrados

Parentes de civis capturados pelo Hamas, em 7 de outubro, caminham de Tel Aviv para Jerusalém, com o objetivo de pressionar Netanyahu. Israelense que teve sete parentes levados para Gaza fala ao Correio

Yuval Haran (à frente, de chapéu) organizou a marcha após o Hamas executar três familiares e sequestrar outros sete: gabinete do premiê é o destino final  -  (crédito: Yahav Trudler)
Yuval Haran (à frente, de chapéu) organizou a marcha após o Hamas executar três familiares e sequestrar outros sete: gabinete do premiê é o destino final - (crédito: Yahav Trudler)
postado em 15/11/2023 06:00

Em 7 de outubro passado, o israelense Yuval Haran, 36 anos, teve o pai, Avshalom Haran (66); e dois tios, Eviatar Kipnis (65) e Lilach Kipnis (60), assassinados pelo Hamas, durante ataque ao kibbutz Be'eri, a 6km da Faixa de Gaza. Os extremistas do grupo fundamentalista palestino sequestraram a mãe de Yuval, Shoshan Heran, 67; a irmã Adi Shoham (38) e seu marido, Tal Shoham (38); os sobrinhos Yahel (3) e Naveh (8); além da tia Sharon Avigdori (52) e do primo Noam (12). Às 13h desta terça-feira (8h em Brasília), Yuval e integrantes de 30 famílias de reféns saíram, a pé, de Tel Aviv rumo a Jerusalém.

Durante 63km, outras 30 famílias devem se unir à caminhada. No início da noite, enquanto descansavam no centro comunitário de Be'er Ya'akov, a 55km de Jerusalém, o organizador da marcha falou ao Correio, por telefone. "Não é um protesto, pois todo mundo está do nosso lado. Somos contra os terroristas do Hamas. Queremos ter a certeza de que o nosso governo nos escuta. Vamos caminhar até o gabinete do primeiro-ministro (Benjamin Netanyahu) e diremos a ele: 'Você tem que trazer nossos familiares agora!'. Ele é o premiê e precisa resgatar os cidadãos de Israel", comentou Yuval. 

De acordo com ele, a previsão é de que a marcha chegue a Jerusalém neste sábado (18). "Esperamos que a população se una a nós, em apoio aos familiares de reféns. Sabemos que todos falam sobre ajuda humanitária à Faixa de Gaza. Mas, e sobre o alívio humanitário aos reféns? Queremos que o mundo inteiro ouça o nosso choro", desabafou Yuval, técnico em informática em Be'eri. "Há um bebê de 10 meses, além de minha sobrinha, de três anos, e de outras 37 crianças. Há idosos, e não sabemos se eles têm acesso a medicamentos. Queremos que o mundo nos escute, assim como o Knesset (Parlamento) e o gabinete de guerra. E que nos digam que fazem de tudo para trazer os nossos familiares de volta." Nos atentados contra o sul de Israel, o Hamas invadiu mais de 20 kibbutzim, matou 1.200 pessoas e capturou 242.

Marcha de Tel Aviv a Jerusalém realizada por familiares de reféns do Hamas
Marcha de Tel Aviv a Jerusalém realizada por familiares de reféns do Hamas (foto: Yahav Trudler)
 

Ao ser questionado sobre a possível libertação de 70 sequestrados — crianças, mulheres e idosos —, Yuval disse nada saber sobre as negociações com o Hamas. "Negociar com terroristas não é uma tarefa fácil", admitiu. "Nós, familiares dos reféns, precisamos nos mexer, precisamos fazer algo e ter a certeza de que o mundo escuta o nosso grito. Temos de trazer de volta os nossos familiares agora. Não sabemos como estão sendo tratados, se têm comida e água. Não sabemos nada. São 240 cidadãos. Pais, mães, avós e pessoas muito idosas. Precisamos que todo o país se una a nós e grite conosco", pediu. 

Eyal Mor, 61, chefe de informações de uma companhia internacional na cidade de Rosh Haayin, a 28km de Tel Aviv, pretende se juntar à marcha nesta quinta-feira (15). Os tios Abraham Munder (78) e Ruth Munder (78); a prima Karen Munder e o filho dela, Ohad (9), foram levados para Gaza, pelo Hamas, do kibbutz de Nir Oz, a 2km da fronteira  com Gaza. "É claro que eu saúdo qualquer acordo que seja capaz de trazer meus familiares para casa. Meu tio não está bem de saúde, ele não anda bem, quase não enxerga e precisa de medicamentos diariamente. É desumano manter idosos,  crianças e bebês no cativeiro, sem permitir que a Cruz Vermelha os visite", desabafou ao Correio, por meio do WhatsApp.

Acordo

O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, afirmou acreditar que chegará a um acordo com o Hamas para libertar os reféns. "Tenho falado diariamente com as pessoas envolvidas. Acredito que vai ocorrer, mas não quero entrar em detalhes", disse o democrata aos jornalistas na Casa Branca quando foi perguntado sobre um possível acordo. Questionado se tinha uma mensagem para as famílias dos reféns, respondeu: "Resistam. Já vamos". Ao ser perguntado pelo Correio sobre uma tratativa para libertar 70 reféns , Basem Naim — chefe do Departamento Político do Hamas em Gaza — explicou que todo o processo é confidencial. "As negociações envolvem diferentes atores para a libertação segura de alguns reféns civis, sob a condição de um cessar-fogo com alguns dias de duração e da entrada de ajuda humanitária em Gaza."

O ministro das Relações Exteriores de Israel reconheceu que o país carece de "provas de vida" dos sequestrados. A afirmação foi feita depois de uma reunião com a presidente do Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV), Mirjana Spoljaric, em Genebra. "Até hoje, nenhum dos nossos reféns se encontrou com a Cruz Vermelha (…) não temos nenhuma prova de vida", disse. 

EU ACHO...

Yuval Haran, 36 anos, morador do kibbutz Be'eri, a 6km da Faixa de Gaza
Yuval Haran, 36 anos, morador do kibbutz Be'eri, a 6km da Faixa de Gaza (foto: Arquivo pessoal )

"Têm sido 40 dias desoladores. Minha mãe, minha irmã, meus tios, meu cunhado e meus sobrinhos são pessoas simples e gentis. Minha mãe é uma pessoa simples, que apenas quer ajudar o mundo, sentar-se à mesa, ler um livro e beber café. Têm sido 40 dias sem sabermos de nada. Meu pai foi assassinado. Nem tive tempo de viver o luto. Minha comunidade foi despedaçada. Cerca de 80 pessoas de meu kibbutz foram assassinadas. Eu acordo e estou com dor. Tenho feito de tudo para salvá-los. Em algum ponto à noite, meus olhos se fecham e torno a reviver aquele 7 de outubro."

Yuval Haran, 36 anos, morador do kibbutz Be'eri, a 6km da Faixa de Gaza

Eyal Mor, 61, executivo em Rosh Haayin, a 28km de Tel Aviv. Teve quatro familiares sequestrados pelo Hamas
Eyal Mor, 61, executivo em Rosh Haayin, a 28km de Tel Aviv. Teve quatro familiares sequestrados pelo Hamas (foto: Arquivo pessoal )
 

"Durante as últimas seis semanas, não recebemos nenhuma informação sobre nossos familiares. O Exército nos diz que há 'algumas indicações' de que nossos entes queridos estão vivos, mas nada concreto. Para a família, é uma montanha-russa de sentimentos. Cada pequeno pedaço de notícia afeta nossos sentimentos — medo, esperança, raiva, decepção, frustração. Um pesadelo real!"

Eyal Mor, 61, executivo em Rosh Haayin, a 28km de Tel Aviv. Teve quatro familiares sequestrados

 

Exército de Israel invade o amior hospital do enclave

O maior hospital de Gaza, o Al Shifa, foi invadido na noite desta terça-feira (14/11) pelas Forças de Defesa de Israel (FDI), o Exército. Em nota, a ação foi confirmada.  "As forças das FDI estão operando contra a organização terrorista Hamas, em uma determinada parte do Hospital Al Shifa. A operação é baseada em informações de inteligência e necessidades operacionais”, diz o texto.

O comunicado reitera que pacientes e desabrigados serão preservados, mas especialistas afirmam que tal possibilidade não se concretiza. “A ação não tem como objetivo prejudicar os pacientes, a equipe médica e os funcionários do hospital. A operação foi precedida por um esforço para evacuar o hospital dos doentes e desabrigados e até abriu uma passagem especial para eles. Incubadoras, equipamentos médicos e alimentos para bebês serão transferidos para outro hospital."

A Casa Branca afirmou que grupos palestinos islamistas mantêm um centro de comando no subsolo do Al-Shifa, o maior hospital da Faixa de Gaza, cercado por tanques israelenses e alvo de ataques nos últimos dias. "O Hamas e a Jihad Islâmica operam um núcleo de comando e controle de Al-Shifa na Cidade de Gaza. Armazenaram armas ali e estão preparados para responder a uma operação militar israelense contra essa instalação", declarou John Kirby, porta-voz do Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca. A denúncia coincide com a notícia de que dezenas de mortos foram sepultados em uma vala comum, no pátio do Hospital Al-Shifa.

Vista aérea do complexo hospitalar Al-Shifa, no centro da Cidade de Gaza, onde milhares de pessoas estão sitiadas: prédio abrigaria extremistas no subsolo
Complexo hospitalar Al-Shifa, no centro da Cidade de Gaza: sitiado (foto: Bashar Taleb/AFP)

"É uma acusação sem sentido", reagiu Basem Naim, ex-ministro da Saúde palestino e chefe do Departamento Político do Hamas em Gaza, ao ser consultado pelo Correio. "Nós denunciamos todas essas mentiras e essa propaganda israelense. Também os desafiamos a enviarem até a Faixa de Gaza um comitê de investigação neutro." Pouco depois, o Hamas divulgou um comunicado em que adverte que declarações do tipo soam como "um sinal verde para que a ocupação israelense cometa mais massacres brutais, alvejando hospitais, com a meta de destruir o sistema de saúde de Gaza". "Os Estados Unidos são diretamente responsáveis por permitir a guerra genocida de Israel contra Gaza", acrescentou o grupo, no comunicado redigido em inglês.

A cirurgiã Sara Wael AlSaqqa, médica do Hospital Al-Shifa, atualmente refugiada no sul do enclave, qualificou a acusação de Kirby de "besteira". "Eles (israelenses) têm dito isso tentando justificar o genocídio que estão fazendo. Não tem como isso ser verdade, somos médicos e enfermeiros que trabalham em Al-Shifa há anos. Nunca vimos nenhuma ação militar dentro do hospital", assegurou à reportagem. "Se isso fosse verdade, o Hamas não pediria ao mundo que viesse até o complexo do Al-Shifa. Eles pediram isso diversas vezes, para que viessem procurar e ver com seus próprios olhos. Não existe nada lá. Eles mentiram sobre o túnel existente sob vários hospitais e mostraram fotos que, depois de verificação, pareciam ser poços de elevador."

A Organização Mundial da Saúde (OMS) advertiu que a remoção de pacientes do Al-Shifa é uma "tarefa impossível", pois as pessoas — pacientes e desabrigados pelos bombardeios — são muito vulneráveis e não têm para onde ir. (RC)
 

DUAS PERGUNTAS PARA...

BASEM NAIM, ex-ministro da Saúde palestino e chefe do Departamento Político do Hamas

Israel alega que o Hamas perdeu o controle da Faixa de Gaza. O que tem a dizer sobre isso?

Isso é parte da propaganda israelense para criar uma vitória ilusória. Se tivéssemos perdido o controle de Gaza, por que Israel não pode mostrar evidências de seus tanques destruídos, dos soldados mortos pelos combatentes? Por que as forças israelenses têm dificuldades em avançar dentro da Cidade de Gaza? O lançamento de foguetes de Gaza para Tel Aviv significa que a resistência tem total controle. Sabemos que Israel é uma potência regional, capaz de entrar na Cidade de Gaza. A questão é: e depois? Como defenderão seus tanques dos ataques dos combatentes?

Bassem Naim, chefe do Departamento Político e de Relações Exteriores do Hamas na Faixa de Gaza
Basem Naim, chefe do Departamento Político e de Relações Exteriores do Hamas na Faixa de Gaza (foto: Arquivo pessoal )

De que modo analisa a resistência imposta pelo Hamas às Forças de Defesa de Israel?

Até o momento, falamos de uma resistência muito forte. Você pode imaginar que uma potência, como Israel, com instalações sofisticadas, depois de 40 dias, tenha conseguido avançar apenas alguns quilômetros no noroeste e no sudoeste da Cidade de Gaza e perderam vários de seus tanques e escavadeiras? Pelo menos 108 desses veículos militares foram parcial ou totalmente destruídos. Eles citam mais de 50 soldados mortos e 300 feridos dentro de Gaza. Depois de quase 40 dias, não puderam controlar a área, de poucos quilômetros quadrados. Isso se deve à forte resistência e ao compromisso do povo com a própria terra. Os israelenses não têm fé suficiente nessa batalha em Gaza. (RC)

Protesto em apoio a Israel reúne multidão em Washington

Protesto pró-Israel reúne multidão em Washington
Protesto pró-Israel reúne multidão em Washington (foto: Stefani Reynolds/AFP)

Dezenas de milhares de pessoas se aglomeraram em Washington em apoio a Israel e para condenar o antissemitismo, após semanas de manifestações majoritariamente pró-palestinas nos Estados Unidos, um país profundamente dividido. Vários congressistas participaram do protesto na esplanada do National Mall, perto do Capitólio. Algumas pessoas vestiam azul e branco, as cores da bandeira de Israel, e seguravam cartazes nos quais pediam ao movimento islamista palestino Hamas a libertação dos reféns. Em uma intervenção virtual de Jerusalém, o presidente israelense, Isaac Herzog, pediu à multidão que se manifeste "pelo direito de todo judeu de viver com orgulho e em segurança em Israel, nos Estados Unidos e no mundo". "Ninguém nos dobrará", afirmou. O líder da maioria no Senado dos EUA, o democrata Chuck Schumer, e o presidente da Câmara dos Representantes, o republicano Mike Johnson, também discursaram, bem como parentes de reféns. 

  • Marcha de Tel Aviv a Jerusalém realizada por familiares de reféns do Hamas
    Marcha de Tel Aviv a Jerusalém realizada por familiares de reféns do Hamas Foto: Yahav Trudler
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