Ridley Scott é famoso por sua sinceridade.
Diretor de filmes premiados como Gladiador, Alien, Thelma & Louise e Blade Runner, ele certamente fala o que pensa.
“Você pede conselhos? Perguntar aos outros o que eles acham é um desastre”, diz ele, em entrevista à BBC.
Ele diz que não se importa de nunca ter ganhado um Oscar de melhor diretor e que também não liga para as críticas ao seu último filme Napoleão - que foi bastante criticado por historiadores por não ser fiel aos fatos históricos conhecidos.
A entrevista acontece em um hotel elegante no centro de Londres. Scott acaba de retornar de Paris, onde seu filme - estrelado por Joaquin Phoenix como Napoleão e Vanessa Kirby como sua esposa Josephine - teve sua estreia mundial.
O filme é um espetáculo visual que contrasta a intimidade da relação do casal com as ações de um homem cuja sede de poder causou a morte de quase três milhões de soldados e civis.
“Ele é fascinante. Reverenciado, odiado, amado... mais famoso do que qualquer outro homem, líder ou político na história. Como não mexer com isso?”, diz ele.
O filme tem duração de duas horas e 38 minutos.
Scott diz que se um filme tiver mais de três horas, o fator “pé no saco” ocorre por volta da marca das duas horas, algo em que ele pensa constantemente quando está editando.
Apesar disso, os rumores são de que Scott está planejando uma versão final mais longa para o serviço de streaming Apple TV, mas ele não confirma.
Críticas
O filme recebeu críticas positivas no Reino Unido, mas os jornais franceses foram menos generosos.
O jornal Le Figaro diz que o filme poderia ser renomeado como “Barbie e Ken sob o Império”. A versão francesa da GQ afirma que há algo “profundamente desajeitado, antinatural e involuntariamente engraçado” em ver soldados franceses em 1793 gritarem “Vive la France” com sotaque americano.
E um biógrafo de Napoleão, Patrice Gueniffey, disse à revista Le Point que o filme é uma versão “muito anti-francesa e muito pró-britânica” da história.
“Os franceses não gostam nem si mesmos”, diz Scott em resposta às críticas.“O público para o qual exibi o filme em Paris adorou.”
No longa, a apropriação de terras por Napoleão para construir o império é condensada em seis vastas cenas de batalha.
Numa das grandes vitórias do imperador em Austerlitz, em 1805, o exército russo foi atraído para um lago congelado (a cena foi filmada num campo de aviação nos arredores de Londres), antes de canhões serem apontados para eles.
À medida que as balas de canhão disparam em direção ao gelo, soldados e cavalos ensanguentados começam a afundar nas águas geladas, tentando escapar desesperadamente.
A cena é dramática e assustadora.
“Tenho sorte de ter um bom olhar”, diz Scott, que nasceu numa cidade costeira de Inglaterra e estudou em uma escola de arte em Hartlepool e depois em Londres.
Criador de mundos
Nos anos 70, ele era um dos diretores publicitários mais renomados do Reino Unido - chegava a gravar dois comerciais por dia no auge do sucesso, diz.
Ele sempre quis dirigir filmes, mas “tinha muita vergonha de discutir isso com alguém” e não “sabia como entrar (naquele mundo)”.
Mas quando começou, cresceu muito rápido.
A arte visual de Scott faz dele um criador de mundos, seja o espaço em Alien e Perdido em Marte, a guerra civil na Somália em Falcão Negro em Perigo, a Inglaterra medieval em Robin Hood ou o Império Romano em Gladiador.
Ele faz seus próprios storyboards, ou seja, seus roteiros ilustrados.
“Eles poderiam ser publicados como quadrinhos”, diz ele. “Muitas pessoas não conseguem traduzir o que está no papel (no roteiro escrito) para o que vai ser visto, e esse é o meu trabalho.”
Ritmo frenético
Joaquin Phoenix diz à BBC que Scott é um diretor aberto e receptivo.
“Ele pensa em tudo, mas mesmo assim está aberto a mudar espontaneamente” quando surgem novas ideias.
Phoenix se empolgou com a ideia de trabalhar com Scott novamente, 23 anos depois de ele ter sido escalado como imperador em Gladiador.
“O estúdio não me queria em Gladiador. Ridley lutou por mim e foi uma experiência extraordinária.”
Scott chamou Phoenix de “provavelmente o ator mais especial e atencioso” com quem já trabalhou.
Os protagonistas tiveram liberdade para desenvolver a relação entre Napoleão e Josefina, uma mulher seis anos mais velha que ele, de quem se divorciou porque não lhe podia dar um herdeiro. Quando morreu no exílio em Santa Helena, no entanto, foi pensando nela.
“França, o exército, o chefe do exército, Josephine”, foram as últimas palavras do imperador.
Vanessa Kirby diz sobre sua experiência de ser dirigida por Scott que “nada foi imposto desde o início e achei isso realmente libertador”.
Mas acrescenta que teve que se adaptar ao ritmo de trabalho.
“Ele se move muito rápido. Você pode ter cinco grandes cenas em um dia, o que significa que você não consegue pensar”, afirma.
Napoleão foi filmado em apenas 61 dias.
“Se você entende alguma coisa sobre cinema, sabe que deveria ter sido 120”, diz Scott.
No início de sua carreira, além de dirigir, ele frequentemente operava a câmera em seus filmes. Scott diz que percebeu onde realmente estava o poder – com o operador de câmera e o primeiro assistente de direção – e não queria abrir mão disso.
Em Napoleão, ele trabalhou com até 11 câmeras ao mesmo tempo e as dirigiu de um caminhão com ar condicionado.
Usar todas aquelas câmeras filmando de ângulos diferentes “libera o ator para sair do roteiro e improvisar”, porque você não precisa repetir tomadas várias vezes.
Scott anunciou que estava trabalhando em Napoleão no dia em que terminou seu filme anterior O Último Duelo.
Agora que Napoleão chega aos cinemas, Scott está prestes a começar a filmar Gladiador 2, com Paul Mescal e Denzel Washington, projeto que foi interrompido pela greve dos roteiristas de Hollywood.
Ele também tem outro filme em andamento, cujo tema ainda não foi anunciado.
E no final do mês ele planeja comemorar seu 86º aniversário.
Muitos estariam ansiosos para desacelerar, mas Scott não. Ele fará filmes pelo resto da vida, diz.
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