NATUREZA

A inesperada volta de baleias azuis ao "refúgio" onde foram exterminadas

Ameaçados de extinção, os maiores animais da Terra estão voltando a habitar uma parte do Oceano Índico que pode ser ao mesmo tempo um local de reprodução e viveiro da espécie, segundo novo estudo científico

Cientistas acreditam que baleias azuis podem se reproduzir nas águas ao redor das Seychelles -  (crédito: Oceanic films)
Cientistas acreditam que baleias azuis podem se reproduzir nas águas ao redor das Seychelles - (crédito: Oceanic films)
BBC
Victoria Gill e Kate Stephens - BBC News
postado em 23/11/2023 20:19 / atualizado em 24/11/2023 01:22

As baleias azuis – os maiores animais da Terra – estão voltando a habitar uma parte do Oceano Índico onde foram exterminadas pela caça há décadas.

Pesquisadores e cineastas nas Ilhas Seychelles registraram imagens das baleias no local em 2020 e 2021. Elas aparecem no filme Blue Whales 3D.

Mas gravações de áudio subaquáticas feitas ao longo de um ano revelaram que os animais passam meses na região.

Isso significa que elas podem estar se reproduzindo nesta região, dizem cientistas.

Os pesquisadores, incluindo cientistas da Universidade das Seicheles, descreveram a descoberta como uma “vitória para a conservação ambiental” depois de a frota baleeira soviética dizimar a população da espécie que havia ali na década de 1960.

“Se você para de matar animais em grande escala e lhes dá uma chance, eles podem se recuperar”, diz a cientista Kate Stafford à BBC News.

A caça comercial à baleia teve um impacto duradouro. O número de baleias azuis ainda é uma pequena parte do que era antes, e a espécie é considerada como ameaçada de extinção pela União Internacional para a Conservação da Natureza.

Mais de 300 mil baleias azuis foram mortas só no Hemisfério Sul, perseguidas por navios baleeiros modernos e rápidos.

“Este é o maior animal que já existiu no planeta”, diz Stafford.

“Queremos saber onde elas estão voltando a habitar, e descobrir que há uma população ao redor das Seychelles é emocionante.”

Os achados, publicados no periódico Journal of Endangered Species Research, foi o resultado do uso de uma “armadilha sonora” no fundo do mar perto da pequena nação insular.

Equipada com microfones subaquáticos, baterias e gravadores, a armadilha ficou no local por um ano, gravando 15 minutos a cada hora, todos os dias.

Durante uma expedição de um mês, Stafford também passou algumas horas por dia com um microfone subaquático na água.

“Ouvimos coisas notáveis – cachalotes a milhares de metros de profundidade e golfinhos se comunicando, mas infelizmente nenhuma baleia azul”, diz Chris Watson, responsável da equipe pela gravação de sons de vida selvagem, à BBC News.

No entanto, depois de os cientistas recuperarem a armadilha sonora, uma análise meticulosa da gravação revelou que as baleias azuis estavam lá e se comunicavam quando os investigadores não estavam presentes.

O canto característico dos mamíferos, de frequência muito baixa, pode ser ouvido principalmente durante março e abril.

“Isso significa que as Seychelles podem ser realmente importantes para as baleias azuis”, diz Stafford.

“Elas cantam durante a época de reprodução, e provavelmente são os machos que cantam, com base no que sabemos sobre outras baleias. Portanto, existe a possibilidade de que as Seychelles sejam uma área de reprodução ou viveiro."

Os cientistas conseguiram até identificar a qual população pertencem as baleias azuis da região.

"Você pode diferenciá-las pelos sons que fazem. Nas Seychelles, ouvimos uma população geralmente associada ao norte do Oceano Índico", diz Stafford.

O canto da baleia azul é tão profundo e de frequência tão baixa que está além do alcance da audição humana.

Mas Watson, que conseguiu registrar baleias azuis no Mar de Cortez, explica que podemos ouvir o que chamamos de harmônicos – sons de frequência mais alta que “soam” quando uma baleia azul canta.

“Quando gravei baleias azuis no México, era isso que ressoava nos meus fones de ouvido”, afirma.

Stafford acrescenta que esse é "o som sustentado mais alto do reino animal".

"[O chamado dura] de 15 a 20 segundos a cerca de 188 decibéis, o que equivale a um motor a jato no ar”, diz a cientista.

O som viaja muito mais rápido e mais longe na água, permitindo que as baleias azuis se comuniquem por distâncias de centenas e até milhares de quilômetros.

Um refúgio tranquilo

Os cientistas estão interessados em compreender exatamente a importância das Seicheles para as baleias azuis.

Uma área em torno das ilhas foi formalmente protegida em uma troca na qual o país teve quase 16,8 milhões de libras (R$ 103,3 milhões) da sua dívida nacional anulada em troca de proteger seus oceanos.

Cerca de 400 mil quilômetros quadrados dos seus mares estão agora protegidos.

Jeremy Kiszka, da Universidade Internacional da Florida, principal cientista do estudo, diz à BBC News que a diversidade e abundância de mamíferos marinhos na região são “excepcionais”.

“Registramos 23 espécies durante nossas pesquisas”, afirma.

“Algumas delas estão entre as espécies menos conhecidas de baleias e golfinhos em todo o mundo. Precisamos agora compreender o porquê e garantir que as atividades humanas não afetem as baleias azuis e outras espécies presentes ali.”

Uma grande preocupação é proteger áreas importantes para as baleias azuis da poluição sonora, que viaja de forma igualmente eficiente através da água.

“Não há um grande tráfego de navios nas Seychelles, então, talvez pudéssemos pensar nisso como um lugar agradável, tranquilo e seguro para as baleias azuis”, diz Stafford.

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