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CZT: o incrível material que está gerando uma revolução tecnológica (e por que é tão difícil de obter)

Apenas poucas empresas conseguem produzir telureto de cádmio e zinco (CZT), um material com propriedades poderosas que pode transformar áreas como o diagnóstico médico por imagens

Deitar-se de costas dentro de um grande scanner de tomografia, o mais quieto possível, com os braços acima da cabeça e durante 45 minutos, não é das coisas mais divertidas.

Era isso que os pacientes do Royal Brompton Hospital, em Londres, precisavam fazer durante certos exames pulmonares. Mas, com a instalação de um novo equipamento no ano passado, o tempo diminuiu para apenas 15 minutos.

Isso se deve, em parte, à tecnologia de processamento de imagens do aparelho, mas também a um material especial conhecido como CZT (sigla em inglês para telureto de cádmio e zinco), que permite à máquina produzir imagens tridimensionais muito detalhadas dos pulmões dos pacientes.

"Com este scanner, obtêm-se imagens maravilhosas", afirma a médica Kshama Wechalekar, chefe de medicina nuclear e PET (Tomografia por Emissão de Pósitrons) do hospital.

"É uma verdadeira façanha de engenharia e física."

O CZT da máquina foi fabricado pela empresa britânia Kromek, uma das poucas do mundo capazes de produzi-lo.

Talvez você nunca tenha ouvido falar dele, mas — nas palavras de Wechalekar — ele está provocando uma "revolução" na imagiologia médica.

Esse material incrível ainda tem muitos outros usos, como em telescópios de raios-x, detectores de radiação e scanners de segurança em aeroportos.

E sua demanda só cresce.

Guy's and St Thomas' NHS Foundation Trust
Kshama Wechaleka com o novo equipamento no Royal Brompton Hospital de Londres.

As pesquisas sobre os pulmões dos pacientes realizadas por Wechalekar e seus colegas envolvem a detecção de numerosos coágulos de sangue minúsculos em pessoas com covid prolongada, ou de um coágulo maior conhecido como embolia pulmonar, por exemplo.

O scanner, que custa um milhão de libras esterlinas (cerca de R$ 7,4 milhões), funciona detectando os raios gama emitidos por uma substância radioativa injetada no corpo dos pacientes.

Mas a sensibilidade do scanner também significa que é necessária uma quantidade menor dessa substância do que antes.

"Podemos reduzir as doses em cerca de 30%", afirma a médica.

Grande demanda, pouca oferta

Embora os scanners baseados em CZT não sejam novos, equipamentos de corpo inteiro e de grande porte como este são uma inovação relativamente recente.

O CZT existe há décadas, mas sua fabricação é notoriamente difícil.

"Levou muito tempo desenvolvê-lo para que se tornasse um processo de produção em escala industrial", afirma Arnab Basu, diretor-executivo e fundador da Kromek.

Nas instalações da empresa em Sedgefield, na Inglaterra, há 170 pequenos fornos em uma sala que Basu descreve como "semelhante a uma fazenda de servidores".

Nesses fornos, um pó especial é aquecido, fundido e depois solidificado, formando uma estrutura monocristalina.

Todo o processo leva semanas.

"Átomo por átomo, os cristais se reorganizam […] até ficarem completamente alinhados", explica Basu.

O CZT recém-formado, um semicondutor, pode detectar partículas minúsculas de fótons em raios-x e raios gama com precisão incrível, funcionando como uma versão altamente especializada do sensor de imagem baseado em silício sensível à luz que existe na câmera do seu smartphone.

Cada vez que um fóton de alta energia incide no CZT, como o raio-x, ele mobiliza um elétron, e esse sinal elétrico pode ser usado para gerar uma imagem. A tecnologia de scanners anterior utilizava um processo em dois passos, que não era tão preciso.

"É digital", detalha Basu.

"É um único passo de conversão. Preserva toda a informação importante, como o tempo e a energia dos raios-x que atingem o detector de CZT; é possível criar imagens coloridas ou espectroscópicas (que permite diferenciar materiais, tecidos ou substâncias)."

Ele acrescenta que scanners baseados em CZT já são usados atualmente para detecção de explosivos em aeroportos do Reino Unido e para escanear bagagens despachadas em alguns aeroportos dos EUA.

"Esperamos que o CZT seja incorporado ao segmento de bagagem de mão nos próximos anos."

O material escolhido

Mas nem sempre é fácil conseguir CZT.

Henric Krawczynski, pesquisador da Universidade de Washington em St. Louis, nos EUA, já utilizou o material anteriormente em telescópios espaciais suspensos em balões de grande altitude.

Esses detectores podem captar raios-x emitidos tanto por estrelas de nêutrons quanto pelo plasma ao redor de buracos negros.

Kromek
Fornos especiais são usados para fabricar CZT.

O professor Krawczynski precisa de peças muito finas de CZT, de 0,8 mm, para seus telescópios, pois isso ajuda a reduzir a quantidade de radiação de fundo captada, permitindo um sinal mais claro.

"Gostaríamos de comprar 17 detectores novos", afirma. "É realmente difícil encontrá-los tão finos."

A Kromek não pôde ajudá-lo porque, segundo Basu, a empresa enfrenta uma grande demanda atualmente.

"Apoiamos inúmeras organizações de pesquisa", acrescenta. "É muito difícil fazer cem coisas diferentes. Cada projeto de pesquisa requer um tipo muito específico de estrutura de detector."

Muitos outros cientistas também utilizam CZT.

No Reino Unido, uma grande modernização do centro de pesquisa Diamond Light Source, em Oxfordshire, melhorará suas capacidades graças à instalação de detectores baseados em CZT.

O Diamond Light Source é um sincrotron - que acelera elétrons ao redor de um anel gigante, a uma velocidade próxima à da luz.

Os ímãs fazem com que esses elétrons, ao passarem, percam energia na forma de raios-x, direcionados em linhas de luz para, por exemplo, analisar materiais.

Alguns experimentos recentes envolveram a análise de impurezas no alumínio durante sua fusão. Compreender melhor essas impurezas pode ajudar a melhorar as formas recicladas do metal.

Com a atualização do Diamond Light Source, cuja conclusão está prevista para 2030, os raios-x produzidos serão significativamente mais brilhantes, o que significa que os sensores existentes não conseguirão detectá-los corretamente.

"Não faz sentido gastar todo esse dinheiro em melhorar essas instalações se não for possível detectar a luz que elas produzem", diz Matt Veale, líder do grupo de desenvolvimento de detectores no Conselho de Instalações Científicas e Tecnológicas, uma das partes interessadas no Diamond Light Source.

Por isso, mais uma vez, o CZT foi o material escolhido

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