Conjuntura

Alerta contra alta de despesas

Ex-secretário do Tesouro Nacional diz que aumento de gastos públicos pode ampliar a carga tributária e aprofundar a recessão. Segundo ele, desequilíbrio das contas tem obrigado governo a pagar juros elevados para rolar a dívida

Rosana Hessel
postado em 25/08/2020 00:01
 (crédito: Wilson Dias/Agencia Brasil)
(crédito: Wilson Dias/Agencia Brasil)

O ex-secretário do Tesouro Nacional Mansueto Almeida fez um alerta para o ímpeto gastador de alguns integrantes do governo e de economistas que defendem o fim do teto de gastos. Segundo ele, é preciso evitar que o país afunde ainda mais em recessão no meio da pandemia da covid-19.

“A gente tem de ter muita calma em relação a novos gastos porque podem levar ao aumento da carga tributária. Isso é, por natureza, um debate político, e faz parte do jogo democrático”, afirmou Mansueto, durante videoconferência promovida pela Secretaria do Tesouro para divulgar dados sobre finanças estaduais.

Na avaliação de Mansueto, a carga tributária já é muito elevada, e os gastos precisam ser reavaliados para que o governo não repita erros do passado. Para o professor do Insper Marcos Mendes, aumentar os gastos públicos “cria expectativas ruins e desestimula os investimentos”. “O que se pode ganhar pelo lado do aumento dos gastos se perde no lado do financiamento”, afirmou.

As declarações ocorreram pouco antes de o Palácio do Planalto confirmar o adiamento do anúncio do Plano Pró-Brasil. O novo pacote prevê uma série de projetos de investimentos em infraestrutura, incluindo o programa Renda Brasil, que vai substituir o Bolsa Família e ampliar a base de beneficiários.

Mansueto lembrou que o Brasil tem endividamento muito alto, perto de 100% do Produto Interno Bruto (PIB), e que o governo não voltará a apresentar superavit primário até 2026. Ele observou que os grandes ajustes de 2003 e 2015 acabaram sendo feitos por meio de cortes dos investimentos de 40% e 50%, respectivamente. “O governo gastou muito e mal no passado — e isso não se traduziu em investimento. Eram governos de esquerda, mas cortaram fortemente o investimento público para ajustar as contas”, afirmou.

Mansueto afirmou que um país sem equilíbrio fiscal não tem condições de reagir a uma turbulência global, como ocorreu em 2009. “O país tinha superavit primário e pode gastar para combater a crise. Hoje, durante a pandemia, o governo está gastando como país rico, e o Tesouro já paga juro real de 4% para títulos curtos. E está com problema para se financiar com prazos mais longos, que pedem juros maiores. É bem diferente de países como os Estados Unidos que vendem títulos de 10 anos com juros negativos ou de 1% ao ano”, comparou.

Mansueto lembrou que, neste ano, o deficit nominal, que é a necessidade total de financiamento do país, deverá ficar entre 16% e 17% do PIB. No ano que vem, se o governo respeitar a regra do teto, o rombo deverá ficar em torno de 6% a 7% do PIB. Do contrário, a tendência é que aumente ainda mais.

Os participantes da videoconferência defenderam uma reforma administrativa nos estados para conter o forte crescimento das despesas com salários. De acordo com a subsecretária do Tesouro Pricilla Maria Santana, é preciso evitar “gatilhos automáticos de reajustes, como triênios e quinquênios, e penduricalhos que fazem a folha crescer, por inércia, de 3% a 4% ao ano”.

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Imóveis: queda de 2,2% no semestre

Apesar de terem desabado 23,5% no segundo trimestre, as vendas de imóveis terminaram o primeiro semestre com queda de apenas 2,2%, em todo o país, na comparação com o mesmo período de 2019. Porém as vendas cresceram nas regiões Sul (15,1%), Norte (10,3%) e Nordeste (6,2%). A maior queda foi observada na região Centro-Oeste (12,8%), seguida pelo Sudeste (9,6%). Os dados são de levantamento feito pela Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC) e pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai). A pesquisa abrangeu 132 municípios, sendo 19 capitais.

Redução salarial é prorrogada

O presidente Jair Bolsonaro prorrogou por mais dois meses o programa que permite que empresas e trabalhadores negociem acordos de suspensão dos contratos de trabalho ou de redução salarial. O decreto que estende a medida, que foi instituída pela Medida Provisória nº 936, foi publicado em edição extra do Diário Oficial da União (DOU). Além disso, o presidente anunciou a decisão por meio das redes sociais.

A prorrogação havia sido antecipada na última sexta-feira pelo ministro da Economia, Paulo Guedes. “O Brasil voltou a gerar empregos, mas alguns setores ainda estão com dificuldades para retomar 100% de suas atividades. Por isso, assinei o Decreto 10.470/2020 prorrogando o Benefício Emergencial por mais dois meses. Serão cerca de 10 milhões de empregos preservados”, disse o presidente, ao confirmar a decisão.

Bolsonaro divulgou a medida em gravação feita ao lado do ministro Paulo Guedes e do secretário especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia, Bruno Bianco. “A saúde não pode ficar dissociada do emprego”, afirmou o presidente.

Anunciado em abril, o programa permite a redução de salários em troca de preservação das vagas de trabalho por período equivalente ao da diminuição da renda dos empregados. A MP 936, no entanto, só foi sancionada e transformada em lei no início de julho. Inicialmente, ela previa a suspensão dos contratos de trabalho por até dois meses e a redução da jornada e de salários em até 70% por até três meses.

Em 14 de julho, o governo publicou a primeira prorrogação do programa, elevando para até quatro meses o período em que as empresas poderiam reduzir jornada e salário dos funcionários, e também fazer a suspensão dos contratos. Com o decreto publicado ontem, a restrição pode chegar a seis meses.

Durante a vigência dos acordos, a União entra com uma contrapartida para ajudar a complementar a renda dos trabalhadores até o limite do seguro-desemprego (R$ 1.813). O gasto estimado com o pagamento dos benefícios é de R$ 51,6 bilhões. Até agora, no entanto, foram desembolsados R$ 20,7 bilhões, o que permite ampliar o período em que as medidas podem ser tomadas com compensação pelo governo federal. Até agora, foram registrados 16 milhões de acordos, com impacto para 9,6 milhões de trabalhadores.

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