Trabalho

Visto especial para Portugal

Parlamento lusitano aprova projeto de lei que autoriza brasileiros a procurar emprego por 120 dias no país europeu. Regras ainda precisam de regulamentação. Interessados devem encaminhar pedido às representações portuguesas no Brasil

Vicente Nunes Correspondente
postado em 22/07/2022 00:01
 (crédito: CARLOS COSTA)
(crédito: CARLOS COSTA)

Lisboa, Portugal — A Assembleia da República de Portugal aprovou, ontem, projeto de lei que facilita a entrada e a permanência de estrangeiros no país. Com isso, cidadãos que fazem parte da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), entre eles, o Brasil, poderão obter vistos especiais para trabalhar em terras lusitanas. A autorização valerá por 120 dias, podendo ser renovada por mais 60. Os chamados nômades digitais poderão requerer residência por até três anos em Portugal, benefício que será estendido aos familiares. As novas regras só dependem de regulamentação do governo português para entrar em vigor.

Com as alterações na lei, os interessados em trabalhar em Portugal poderão requerer os vistos especiais diretamente nas embaixadas ou nos consulados portugueses. Hoje, esse processo é extremamente burocrático e demorado, pois é feito por meio do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), órgão que perdeu mais de 300 funcionários nos últimos anos e tem mais de 160 mil processos em análise. Mais: pelas regras atuais, os estrangeiros que pretendem trabalhar em Portugal precisam apresentar contrato com empresa local. Com as mudanças, os interessados poderão entrar no país e, então, procurar um emprego.

A aposta do governo de Portugal é de atrair mão de obra para dinamizar a economia, que cresce de forma lenta e sofre o rápido processo de envelhecimento da população. Mas que fique claro: não será uma farra de vistos, como é vendido por meio de redes sociais e por aqueles que oferecem facilidades. As pessoas que se candidatarem a vagas de trabalho em Portugal terão de apresentar passagens de ida e volta e comprovar que têm condições de se manterem no país caso não consigam emprego no tempo de vigência da autorização especial. Os estrangeiros que se beneficiarem das novas regras serão inscritos na Receita Federal local, na Seguridade Social e no Sistema de Saúde.

Vale ressaltar ainda que Portugal sofre com uma inflação altíssima, próxima de 9% ao ano, com aluguéis e valores de imóveis em disparada. Os juros também apontam para cima. Hoje, é possível encontrar milhares de trabalhadores estrangeiros, especialmente brasileiros, vivendo em condições sub-humanas. Como não ganham o suficiente para ter moradias dignas, alugam espaço em camas para dormir. Ou seja, quem trabalha de dia, paga para dormir à noite. E vice-versa. São constantes também ver estrangeiros mendigando pelas ruas, sem condições de retornar aos países de origem.

Fiscalização intensa

Segundo Ana Catarina Mendonça Mendes, ministra-adjunta e de Assuntos Parlamentares, a nova lei dará mais dignidade aos estrangeiros que trabalharem em Portugal, pois todos ficarão em condição regular. Hoje, muita gente entra no país como turista e aproveita para procurar emprego, ficando no limbo após 90 dias. A partir da regulamentação da nova lei, os interessados em viver e trabalhar no país europeu poderão contar com proteção legal. Mas todos passarão por intensa fiscalização, garantiu ela.

Aqueles que conseguirem passar os 180 dias empregados poderão pedir a prorrogação do visto temporário por dois anos e mesmo a residência definitiva no país, desde que cumpridas todas as exigências. As facilidades se estenderão a estudantes de nível superior que desejarem se inscrever em universidades portuguesas. Também poderão pedir os vistos junto aos consulados e embaixadas nos seus países, sem passar pela burocracia do SEF. Porém, será preciso comprovar matrículas nas instituições de Portugal. "A nova lei passa por três fundamentos: acolher e cuidar bem dos que chegam em Portugal, garantir mais agilidade na concessão de vistos e incentivar a dinamização da economia portuguesa", disse a ministra.

Portugal, apesar dos avanços dos últimos anos, continua um país de renda média. O salário mínimo, de 705 euros (cerca de R$ 4 mil), é um dos menores da Europa, não paga um aluguel de um apartamento de um quarto em Lisboa. A promessa do governo é de elevar esse piso salarial para 900 euros nos próximos anos. O sistema de saúde, que já foi exemplar, está sobrecarregado, a ponto de cirurgias e partos serem suspensos. Na Seguridade Social, as filas e as confusões são constantes. Os portugueses mais velhos são, em parte, contra estrangeiros.

Na avaliação do advogado Thiago Huver, sócio da Martins Castro, a lei que cria o visto temporário de trabalho veio em um contexto de diversas políticas públicas do Estado português voltadas para diminuir o "inverno demográfico" (envelhecimento da população) e atrair mais pessoas ao país. "Hoje, Portugal tem a menor natalidade da Europa, 24% dos habitantes têm mais de 65 anos e os pensionistas são quase 4 milhões", afirmou. Para ele, esta nova modalidade de visto garantirá maior controle às autoridades sobre a imigração ilegal.

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