Na proposta de reforma tributária do governo enviada ao Congresso, consta nova taxação. Trata-se da contribuição sobre bens e serviços que se pretende incidir sobre a indústria do livro e dos e-books. A Câmara Brasileira do Livro (CBL), entre outras entidades, já se manifestou contra o acréscimo de custo na cadeia produtiva do livro, de impacto mínimo na receita federal, porém de consequências danosas para a cultura.
A ideia é inoportuna. Somos um dos países que menos leem. Mas o livro continua sendo o mais eficaz caminho para mover uma população da falta de cultura e da ignorância para os saberes mais variados que o futuro demandará. Assim, são essenciais e merecem mais facilidade de acesso tanto os livros técnicos e escolares quanto os romances e obras de literatura em geral, com sua riqueza de situações, tramas e tipos humanos que estimulam a imaginação e a criatividade.
Um dos desafios pós-covid-19 será a necessidade de reciclagem quase total das competências de várias profissões e o surgimento de novas profissões e novas técnicas. Os conhecimentos chegarão às pessoas por meio de livros ou apresentações a distância (de algo que foi texto escrito ou impresso em algum momento).
Curso de mestrado em Harvard demanda, além de comparecimento às aulas, cerca de 100 páginas impressas de estudo por dia. É razoável supor que em qualquer instituição de ponta, se dê algo semelhante. Parece impraticável que tal carga de leitura ocorra só por meio de monitores de computadores, notebooks e assemelhados.
Estaremos sendo injustos do ponto de vista tributário? Alguém pode julgar que uns leem mais e outros menos, e quem lê mais tem mais dinheiro. Por isso, ao não tributar o livro, estaríamos concorrendo para agravar o problema da má distribuição de renda. Na verdade, ocorre o contrário: quanto mais um povo ler, mais culto será. Da mesma forma, menor tenderá ser a concentração de renda porque conhecimento é também poder, saber e dinheiro.
Nossa população é predominantemente de pobres e remediados. Embora não vá pesar na meia dúzia de ricos que leem, a taxa vai impactar fortemente os milhões de pobres que poderiam ler mais e disso ficarão privados.
Dificultar o acesso ao aprendizado e ao conhecimento só piora a injustiça social e impede o aumento do capital humano, que se mede a partir da idade média da população, dos seus anos de escolaridade e de sua expectativa de vida. Quantos mais anos de escolaridade, mais se lê.
Na situação pós-covid, tudo indica que haverá no mercado de trabalho a necessidade de uma segunda competência, agora na área digital. O grau maior de sofisticação no treinamento do pessoal para as novas profissões e para os novos empregos será traduzido na maior necessidade de leitura.
Por fim, vale comentar que as iniciativas recentes no campo da educação e cultura têm sido desastrosas. Reconhecendo o fato, o governo fez uma série de alterações em nomes e cargos, ainda não atingindo o que dele se espera em termos de excelência. Enquanto apregoa as qualidades do ministro da Economia Ph.D pela universidade de Chicago, esbanja nomeações de gente pouco qualificada para as áreas de educação e cultura.
Nossos índices de aprendizado evoluem lentamente e o impasse entre as posições de professores, governo e rede escolar privada parecem se agravar. Há falta de liderança neste momento em que a educação é a esperança de um futuro melhor para todos. O livro é, ainda, o mais barato instrumento para modificar esse estado de coisas. Que não sejam agravados os problemas que já fazem padecer a sua indústria. O preço a pagar será mais uma punhalada no desenvolvimento social.
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