Visão do Correio

De mãos dadas

Correio Braziliense
postado em 19/08/2020 23:15 / atualizado em 19/08/2020 23:15

Choque talvez seja a palavra adequada para nomear a reação à tragédia que veio a público há poucos dias. Menina de 10 anos sofria abusos sexuais desde os 6 anos. O caso só foi descoberto porque ela, com fortes dores abdominais, precisou ir ao médico. Exames revelaram a gravidez de 22 semanas. Mais: o autor da violência foi o próprio tio.

A sucessão de horrores não parou aí. Médicos do Espírito Santo, estado onde a vítima mora, julgaram-se incapazes de interromper a gestação. Ela teve de ir a Recife para realizar o procedimento. Lá, um bando de manifestantes antiaborto tentou impedir o processo, apesar da autorização judicial e do risco que a garota corria.

Casos como o da criança capixaba não constituem fenômeno raro. A barbárie repete-se de Norte a Sul do Brasil. Dados do Ministério da Saúde informam que, dos 1.024 abortos legais efetivados no primeiro semestre deste ano, 35 foram de meninas com até 14 anos de idade. Em 2019, somaram-se 72 — um a cada cinco dias.

Os números devem ser maiores se for levada em conta a subnotificação. Medo, ignorância, álcool, droga, indiferença, aceitação tácita são fatores que contribuem para a barbárie. Também conta o histórico da família. Não raro pai, mãe ou ambos sofreram abusos na infância e, assim, adultos, sentem-se frágeis para defender os filhos.

Especialistas afirmam que não basta pôr o agressor atrás das grades. A punição é importante, mas não suficiente. Há que montar uma cadeia de proteção para prevenir ocorrências. Governo e sociedade precisam dar as mãos. A escola em geral é o primeiro elo a tomar conhecimento dos abusos porque as crianças contam ou se comportam de tal forma que levantam suspeitas.

Mas, sozinha, pouco pode fazer. Professores devem ser treinados para adotar um protocolo: contatar a família, os conselhos titulares, o juizado de menores. As instituições de ensino fundamental e médio podem buscar recursos nas universidades, que contam com corpo técnico capaz de orientar os caminhos a seguir.

A educação sexual — sem ranço religioso — precisa ser encarada com seriedade. No Brasil, o quadro da gravidez na infância e na adolescência é dramático. Em 2018, 21.172 bebês nasceram de mães entre 10 e 14 anos e 434.956 de mães entre 15 e 19 anos. Além do risco à saúde, a mãe precoce abandona os estudos e contribui para a perpetuação da pobreza. É o jogo do perde-perde. Perde-se a infância e perde-se o futuro.

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Omissão do Estado

No Hospital de Base, entre tantas vítimas da selvageria no trânsito, há uma jovem em estado gravíssimo lutando bravamente pela vida. Aos 18 anos, ela teve a mama esquerda dilacerada e a mão amputada após ser arrastada em cima do capô de um carro por quatro quilômetros. Quatro quilômetros.

A brutalidade aconteceu na madrugada do último domingo, quando ela e o marido voltavam para casa. A moto em que estavam foi atingida na traseira por um veículo de passeio. O condutor, assessor parlamentar no Senado Federal, fugiu sem prestar socorro às vítimas e só se apresentou à delegacia na terça-feira, dois dias depois da batida.

A carteira de motorista dele está bloqueada e, por isso, ele não poderia estar dirigindo. O Correio procurou o Detran para ter informações sobre os motivos do bloqueio e desde quando ele está proibido de pegar o volante. Mas o Departamento de Trãnsito informou que não pode dar esse tipo de informação.

Os advogados declararam à imprensa que o cliente está com depressão, tomando medicamentos e sofreu um “apagão”. Acrescentaram que ele não ingeriu bebida alcoólica nem fez uso de outros tipos de substâncias que pudessem alterar seu estado de consciência naquela noite. O condutor prestou depoimento e foi para casa.

O assessor parlamentar já foi autuado duas vezes por dirigir embriagado. Uma delas, em 2008, cinco meses após a lei seca entrar em vigor no Brasil. Ele trafegava na contramão da via quando foi abordado. A outra atuação por alcoolemia foi em 2010.

O Correio apurou que, além dessas infrações, há outras registradas no prontuário de habilitação do assessor parlamentar. Entre 2008 e este ano, são ao menos 10 infrações por excesso de velocidade: três dos registros, por volta das 4h de uma única noite. Tem, ainda, autuações por avanço de sinal, estacionamento em local proibido e uso de celular ao volante.

Com os dados a que o Correio teve acesso, não é possível assegurar que ele tenha cometido todas as infrações de velocidade, avanço de sinal e estacionamento irregular. Mas, se foi outra pessoa, o assessor não procurou os órgão de trânsito para transferir a multa.

Uma jovem de 18 anos luta pela vida no hospital de Base porque um motorista, que devia estar longe do volante circula impunemente pelas ruas da cidade. Como ele, há centenas de outros. O caso de domingo é um pequeno retrato do que pode acontecer quando o Estado se omite ou demora a fazer cumprir o que manda a lei.

Sr. Redator

Cartas ao Sr. Redator devem ter no máximo 10 linhas e incluir nome e endereço completo, fotocópia de identidade e telefone para contato. E-mail: sredat.df@dabr.com.br

Monstruosidade

A garotinha capixaba, que foi estuprada por um tio desde os seis anos e e engravidou aos 10, está sendo vítima, desde domingo, de mais uma violência, pelas redes sociais e até fisicamente — como o cerco de pessoas ao hospital onde ela foi acolhida, em Recife. Pessoas agressivas, que se dizem religiosas, mas destituídas de sentimentos de amor e caridade cristã e que não medem as consequências de seus atos. É um segundo estupro, de natureza psicológica e moral. Essa sanha de ódio e falso puritanismo deveria se voltar contra os estupradores que violentam milhares de crianças neste país e contra as péssimas condições de vida, que deixam as crianças expostas à violência. Mas, é preciso registrar o papel de Sara Winter, que propiciou e incitou essa violência. Ela postou no Twiter informação com o nome da menina e o hospital onde seria atendida. Expor a garotinha dessa forma foi um ato monstruoso, repulsivo e criminoso sobre vários aspectos, que precisa ser objeto de julgamento e condenação. Sara Winter foi feminista e dirigente da Fêmen e, até pouco tempo, defensora e praticante de aborto. A condenação dessa oportunista irresponsável pode não resolver os problemas do país, mas vai tornar nosso mundo um pouco melhor.
» Ricardo Pires,
Asa Sul

» Será que é a quarentena, causada pela pandemia, que está deixando as pessoas insensíveis, desapiedadas, cruéis, impiedosas, frias, sei lá mais o quê? Não dá para entender aquela turba que se formou à porta do hospital lá em Recife, protestando contra a operação de aborto que seria realizada em uma menina de 10 anos, vítima de estupro desde os seis anos por um tio. Para completar, um bispo do Rio Grande do Sul, em artigo publicado pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), disse considerar “um crime hediondo” o aborto feito nessa criança de 10 anos. Dessa maneira, considera hediondo o que prescreve o Código Penal Brasileiro de 1940, que admite o aborto em caso de estupro. Será que é esse confinamento que está deixando as pessoas alienadas?
» Paulo Molina Prates,
Asa Norte


Sérgio Vieira de Mello

Ninguém lembrou do fatídico 19 de agosto de 2003, quando um dos brasileiros mais expressivos do século 20 faleceu em Bagdá, Iraque, no maior atentado da história contra a Organização das Nações Unidas (ONU), praticado pela Al Qaeda: Sérgio Vieira de Mello, cotado para ser o secretário-geral da ONU, após o mandato de Kofi Annan. Na ocasião, Sérgio Vieira era o alto comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos, maior cargo ocupado por um brasileiro na estrutura da organização. Entre 1991 e 1996, esteve no Camboja, país devastado pela guerra. Graças a sua atuação, ocorreu o repatriamento de quase 400 mil cambojanos expulsos de seu país, a maioria na Tailândia. De novembro de 1999 a maio de 2002 comandou oTimor-Leste, país também devastado pela guerra, como administrador de transição da ONU, ajudando a reconstruir o país e a restaurar a democracia. Como negociador da ONU, atuou em alguns dos principais conflitos mundiais: Bangladesh, Camboja, Líbano, Bósnia e Herzegovina, Kosovo e Ruanda. Com certeza, o mundo ficou pior com a sua ausência.
» Milton Córdova Junior,
Vicente Pires


Variedade

Absurdo rotineiro que humilha o Brasil: motorista irresponsável atropela e mutila a vítima. Paga multa. É solto e advogado alega, sem nenhum pudor, que o descarado usa remédio controlado e não recorda a estupidez que causou. As mudanças no Código Nacional do Trânsito precisam ser rigorosas e urgentes. A acareação entre Flávio Bolsonaro e Paulo Marinho, dentro da operação Furna da Onça, da Polícia Federal, mostrará por qual dos dois o felino tem mais apetite. Bolsonaro declarou no périplo pelo Nordeste, com abissal sinceridade, que não está preocupado com 2022. É comovente a euforia da cobertura da imprensa brasileira da campanha do democrata Joe Binden. Espera-se, nessa linha, semelhante ardor e isenção na cobertura também do candidato republicano, Donald Trump.
» Vicente Limongi Netto,
Lago Norte


Deus

O primeiro parágrafo do artigo O Deus histórico de Judá, de Sacha Calmon (16/8), diz tudo a propósito dos deuses criados pelos homens. Está na Bíblia, no capítulo I — “Deus criou o homem e a mulher a sua imagem e semelhança”. A limitada inteligência dos seres humanos pretendeu retribuir-lhe, criando deuses à própria imagem e semelhança, com todos os atributos positivos que pretende possuir, elevando-os à enésima potência. Do que dito no artigo, deuses incapazes de governar o universo. Pelo que se depreende da criação do mundo, narrada no Gênesis, o único atributo cabível a Deus seria o de Criador, ocultando outros atributos, impossíveis de serem deduzidos pela limitada inteligência do homo sapiens. Criador, não no sentido vulgar da palavra, mas no sentido de estar presente dando sustentabilidade ao Universo, garantindo-lhe a infinitude na eternidade, também, impossível de ser entendida por seres humanos.
» Elizio Nilo Caliman,
Lago Norte

Desabafo

Pode até não mudar a situação, mas altera sua disposição

Pandemia: aumenta o número
de mortes, e cultos e missas foram liberados. É o final dos templos.
Vital Ramos de Vasconcelos Júnior — Jardim Botânico


Não será surpresa se os fundamentalistas acusarem a menina de 10 anos de
ter seduzido o tio tarado e, depois,
se dizer vítima de abuso sexual.
Isadora Costa — Águas Claras


É paradoxal a pena imposta a alguns políticos corruptos. Prisão em regime aberto.
Ivan T. de Pinho e Silva — Águas Claras


Percebe-se que uma empresa pública
deve ser privatizada quando ela entra em greve e não se vê diferença alguma!
Ricardo Santoro — Lago Sul

Charge

 (crédito: Kleber )
crédito: Kleber

O estresse tóxico reforça a pandemia

 (crédito: Gomez)
crédito: Gomez

O medo, o pânico e a ansiedade são sintomas principais de um distúrbio que favorece o avanço da pandemia. São manifestações indicadoras de enfermidade que contribui com a propagação da covid-19. Trata-se do estresse crônico, denominado estresse tóxico, que está presente no organismo da maioria das pessoas. Pode ser mais intenso nas sociedades de países menos desenvolvidos, cujo desequilíbrio social e educativo agrava o preocupante quadro sintomático.

O estresse é, por definição, mecanismo fisiológico que, graças ao aumento da produção de cortisol, adrenalina e glicose, assegura ao indivíduo a energia para superar impactos desfavoráveis. São episódios passageiros, depois dos quais o organismo retoma a harmonia indispensável e tais substâncias voltam ao valor normal. Quando, porém, as ações estressantes se tornam crônicas, arrastando-se por tempo prolongado, o sistema protetor do organismo entra em exaustão.

Em várias observações formuladas de longa data, o estresse crônico é a doença considerada como o mal do século. Resulta de cenários ambientais adversos e persistentes, que desencadeiam as reações fisiológicas imediatas no organismo das pessoas expostas a fatores estressantes. Contudo, a ação persistente ou repetitiva dos agentes estressores mantém taxas sanguíneas elevadas de cortisol e adrenalina, que podem causar aumento da pressão arterial, acidente vascular cerebral e coagulação intravascular, entre outros distúrbios.

Com os níveis anormais do cortisol, são desencadeadas alterações múltiplas que produzem no organismo a maioria dos sintomas do mal do século, entre os quais a ansiedade, o pânico e o medo. Ademais, está comprovado que o estresse tóxico reduz a capacidade do sistema imunológico, diminuindo a resistência a infecções bacterianas e virais.

A abordagem dos conceitos fisiológicos mencionados fundamenta a argumentação de que grande número dos organismos infectados pelo coronavírus corresponde a vítimas do estresse tóxico, incapazes de resistir imunologicamente à contaminação viral em causa. Nesse contexto, as perspectivas de manutenção do organismo harmônico e equilibrado tornam-se paulatinamente obscuras. É desafio cada vez maior e, portanto, de difícil superação.

Um dos exemplos é o papel negativo, de incontestável evidência, desempenhado pelas modernas tecnologias de comunicação. As populações tornam-se reféns do verdadeiro bombardeio de mensagens que circulam diariamente, na maioria das vezes sem conteúdo construtivo em favor da sociedade.

Contradições prosperam a olhos vistos; posturas críticas e radicais tomam conta do espetáculo, imbuídas de intuitos demolidores; dados e números distorcidos são compartilhados sob o pretexto de justificar posições inconsistentes; notícias infundadas sobre os mais diversos assuntos convencem incalculável número de participantes das redes sociais; e verdadeiros dogmas são criados estrategicamente para dominar a opinião pública. Esse cenário desumano contagia a mídia tradicional, que perde terreno e abandona os princípios morais e éticos básicos a serem mantidos como referência indispensável para essa modalidade de comunicação pública.

No panorama atual, a atmosfera reinante é poluída por agentes estressores que desencadeiam efeitos os mais nocivos sobre a mente da população, tornando-a vítima do estresse tóxico que reduz a resistência imunitária e amplia largamente a vulnerabilidade nosológica. Notícias, vídeos, informações infundadas e imagens contundentes sobre os avanços da pandemia geram os sintomas de medo, pânico e ansiedade.

Vai sendo assim demolido o alicerce pacífico da cidadania, que requer respeito à verdade e iniciativas coerentes em favor de uma consciência coletiva capaz de contribuir para o bem-estar físico, mental e social de todos e de cada um dos cidadãos.

Outro desajuste que se opõe ao benefício populacional é a politização das medidas adotadas para a reversão da pandemia no país. Interesses político-partidários desprezam a lógica científico-sanitária, que deveria fundamentar as ações destinadas a evitar a propagação do vírus. Só assim seriam tomadas iniciativas para a redução do mal do século, que torna os brasileiros suscetíveis aos alarmantes agravos infecciosos.

O vírus tributário pode matar os hospitais

Historicamente, os hospitais surgiram como lugares para acolhida de doentes e peregrinos durante a Idade Média (de 476 a 1453 D.C). Assim, quando a primeira das grandes pandemias surgiu na Europa do século 14, os hospitais já cumpriam o papel de cuidar de pessoas. Foi assim com a peste bubônica, que reduziu a população da Europa de 450 milhões para 350 milhões de habitantes; com a pandemia de varíola, que atormentou a humanidade por 3 mil anos; da cólera, no início do século 19; da gripe espanhola, que, de 1918 a 1920, acometeu mais de 500 milhões de pessoas e causou cerca de 50 milhões de mortes; e com a primeira pandemia do século 21, a da gripe suína, causada pelo vírus H1N1. Hoje, o mundo luta contra a covid-19, que já registra mais de 18 milhões de casos e mais de 700 mil mortos. Em todos os momentos de tragédia sanitária, os hospitais sempre se fizeram presentes e imprescindíveis.

Hoje, infelizmente, os hospitais brasileiros se veem diante de ameaça mais desafiadora quando comparada a qualquer pandemia da história, risco que pode fechar muitas instituições: a proposta de reforma tributária apresentada pela equipe econômica do governo que tramita no Congresso Nacional. A unificação do PIS e Cofins, impostos federais que incidem diretamente sobre o faturamento das empresas, passariam a ser denominados Contribuição Social sobre Operações com Bens e Serviços (CBS), que teria uma alíquota única de 12%. Atualmente, os serviços de saúde recolhem pela alíquota de 3,65% (0,65 de PIS e 3% de Cofins).
Estudo realizado pelo SindHosp (Sindicato de Hospitais, Clínicas e Laboratórios do Estado de São Paulo) constata que a nova alíquota de 12% pode representar aumento de aproximadamente 70% da carga tributária para hospitais, clínicas e laboratórios. Além disso, ao propor a saída de um sistema cumulativo para um não cumulativo, insumos adquiridos pelas empresas nas fases de produção de um bem ou serviço gerariam créditos tributários que seriam descontados dessa alíquota majorada. Acontece que, nos serviços de saúde, o custo mais relevante é com recursos humanos, representando aproximadamente 45% das despesas totais, que, por não serem consideradas entradas tributadas, não geram créditos tributários.

Não há dúvida de que reduzir a incidência em cascata de tributos é importante. O Brasil precisa não só de redução de impostos, mas, também, de impostos melhores, que provoquem menos distorções às atividades econômicas e estimulem a criação de empregos e investimentos. Porém, a atual proposta caminha em sentido contrário. É inconcebível que, em um momento em que milhares de empresas encerram as atividades em razão dos impactos da pandemia de covid-19 e milhões de brasileiros perdem emprego e renda, o governo apresente proposta de reforma tributária que pune quem gera muitos postos de trabalho, como os hospitais.

A proposta traz outro agravante: aumenta a burocracia, pois exige que instituições montem internamente verdadeiras estruturas de gestão de créditos tributários, onerando custos. O acréscimo teria reflexo imediato nos custos dos serviços, que seriam inevitavelmente repassados aos consumidores, já impactados com reajustes anuais nos planos de saúde acima da inflação. A burocracia onera muito todas as atividades econômicas, mas parece não conhecer limites.

Gerir e manter um hospital no Brasil é desafio constante, que se inicia com a transposição de complexo emaranhado composto por autorizações, licenças, alvarás, comissões obrigatórias e muito mais. Para poder entrar em funcionamento, é necessário aproximadamente 50 certidões, concedidas por mais de 20 órgãos públicos diferentes. Além disso, a rigidez da legislação trabalhista continua a afetar fortemente a atividade hospitalar, que é dependente de mão de obra especializada.

O governo acena que, após a primeira fase da reforma, teríamos uma desoneração da folha de pagamento, que compensaria essas majorações para as atividades que mais empregam. Infelizmente, não há como acreditar em promessas de futuro próximo. O rei Salomão, quando posto à frente de um julgamento sobre a maternidade de determinada criança, decidiu parti-la ao meio e entregar metade para cada mulher. Uma delas aceitou a sentença enquanto a outra pediu que entregassem a criança inteira à primeira. Dessa forma, o sábio monarca identificou a mãe verdadeira e fez justiça, entregando-lhe o filho.

O Salomão nacional, porém, é menos sábio. Optou por distribuir pedaços aos poucos, como também punir os que, nos últimos meses, batalharam arduamente pela saúde dos brasileiros.

Visto, lido e ouvido

Correios, quem te viu, quem te vê

De todos os quesitos necessários para que uma empresa possa atender com bons serviços e com bons preços em um país continental e tão desigual como o nosso, nenhum é mais importante do que qualidade, absolutamente técnica de sua gestão, que deve ser administrada dentro dos princípios de eficiência, governança corporativa, gestão de risco, entre outros critérios básicos.

Por um período até longo, para nossos padrões, os Correios conseguiram atender, com presteza e bom nível de eficiência, à demanda por envio de documentos e de encomendas em todo o país, contando, para tanto, com uma estrutura física e humana de fazer inveja a qualquer empresa privada. Com aproximadamente 100 mil funcionários concursados, sendo 57 mil carteiros, trabalhando em mais de 11 mil agências espalhadas por todo o país, esta empresa de porte gigantesco, chega a fazer mais de um milhão de entregas por dia, conseguindo a façanha de distribuir mais de 25 milhões de objetos a cada dia, cobrindo cerca de 91% de todos os municípios brasileiros.

Trata-se de uma empresa que pelo seu porte e importância para nosso país, já que controla quase 100% de todas as distribuições postais que transitam pelo Brasil, não pode, simplesmente ser jogada na bacia das almas das privatizações a todo o custo. Até porque essa foi uma empresa construída como toda estatal, com os recursos minguados de cada cidadão ao longo de décadas, sendo que sua decadência e pretensa razão para sua venda não pode ser debitada à sociedade e, sim, ao governo. Somente ao governo, ou melhor, ao desgoverno é que cabem todas as culpas pelo descaminho desta que já foi a empresa orgulho da nação, patrocinadora de grandes eventos culturais e esportivos e uma prestadora de serviço da mais alta importância.

As desventuras dos Correios vieram, sobretudo, e todos sabem disso, justamente do governo que se dizia protetor dos trabalhadores e que subiu a rampa do Planalto em janeiro de 2003 e de lá foi apeado ou enxotado em 2016. Durante esse período, os Correios, assim como outras empresas, mormente a Petrobras, foram depauperadas ao extremo, para dizer o mínimo. Na verdade, assim como aconteceu com a Petrobras, os Correios foram friamente saqueados durante todo o período petista, restando o caminho da recuperação. Durante aquele governo, a corrupção sistemática empurrou os Correios ladeira abaixo obrigando a empresa a reduzir brutalmente seus investimentos, ao mesmo tempo em que era saqueada de cima a baixo, não poupando nem mesmo o fundo de pensão dos próprios trabalhadores, que se viram obrigados a reembolsar os prejuízos deixados a todos.

Com um assalto dessa magnitude, praticado impunemente por aquele governo, a empresa perdeu nada menos do que 90% de seu patrimônio líquido. Corrupção e má gestão quebraram as pernas dos Correios, e essa não é uma afirmação leviana e panfletária, mas, sim, uma constatação feita por relatórios técnicos da Controladoria-Geral da União (CGU) e do Tribunal de Contas da União (TCU) e outros órgãos de fiscalização. Infelizmente, estas constatações só vieram à tona depois que a empresa foi a pique.

Por um longo período, essas análises foram escondidas a sete chaves do grande público por razões políticas. Agora, sabe-se que nem a empresa nem tampouco o outrora bilionário fundo de pensão dos funcionários (Postalis) têm possibilidade de andar com os próprios pés. Incrível é constatar que o mesmo sindicato ( Fentect) que, no passado, fechou os olhos para a rapinagem, é o mesmo que, agora, lança os funcionários dessa empresa contra a população, incentivando uma greve extemporânea e com o final já sabido por todos.

Se é o caso de privatizar esta importante empresa, entregando-a a aventureiros endinheirados, então, pelo menos se estude a possibilidade de os Correios serem adquiridos pelos próprios empregados com os recursos que tinham em caixa e que foram surrupiados pelo Estado, sob a complacência da Justiça e de outros órgãos da administração federal.


Frieza

» Chamando a atenção do ministro Guedes para o comportamento do Banco de Brasil e da Caixa Econômica. Durante a crise, alívio zero para devedores. Mas, o pior, é manter os juros de cheque especial, ao mesmo tempo em que impõem o adiamento de pagamento a credores dos próprios bancos por mais de três meses. Sem juros!


Sem legislação

» Nova forma de moradia adotada por diversos países não encontra legislação no Brasil para atrair investidores. O Coliving nasceu na Dinamarca, quando proprietários resolveram compartilhar espaços de convivência e atividades, como refeições e limpeza de ambientes, com o objetivo de estimular o relacionamento entre vizinhos. São Paulo e Rio têm ótimos projetos, mas, por enquanto, a prática não é regulamentada.


Jusbrasil

» No Blog do Ari Cunha, uma coletânea de notícias sobre as fragilidades da urna eletrônica brasileira. E até o que acontece com quem fala sobre o assunto.



História de Brasília

O Banco de Brasília fez mais do que aderir simplesmente à campanha dos jardins. Vai financiar os jardins particulares para que Brasília fique mais alegre. (Publicado em 14/1/1962)


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