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Bem-vindos à selva

Circe Cunha (interina) // circecunha.df@dabr.com.br
postado em 20/08/2020 22:28

Se tomarmos como pilar do desenvolvimento humano a relação da sociedade com crianças e idosos, especificamente, estamos mal na fotografia, aquém, inclusive, do que seria o mínimo possível para que sejamos classificados como civilização moderna. E não se trata aqui de uma constatação retórica, sem embasamento. As estatísticas e todos os dados disponíveis no momento presente apontam, afirmativamente, para uma situação absolutamente caótica e, pior, sem perspectiva à vista.
Nesse caso, infelizmente, o futuro, tão almejado por muitos, é tanto para crianças quanto, principalmente, para os idosos nesse país, uma expectativa, para o dizer o mínimo, sombria e cheia de maus presságios. Diariamente, uma média de seis internações emergenciais para abortos legais é feita apenas para o atendimento de meninas numa faixa etária entre 10 e 14 anos. Em outras faixas de idade, até inferiores, esses casos se repetem a cada dia. Pelos registros Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2019, ou seja, dados oficiais, a cada hora, quatro meninas de até 13 anos são estupradas ou violentadas em nosso país.
As autoridades chegam a falar numa espécie de “naturalização” desse tipo de crime. Nossa sociedade, principalmente em lugares perdidos nesse imenso território, como é caso da Amazonas, do Pará, do Acre e de outras regiões tradicionalmente esquecidas no tempo e na distância, a população já nem presta muita atenção em meninas, na faixa de 14 anos, com a barriga de gravidez. Neste ano, de janeiro para cá, mais de 640 internações para aborto foram feitas para acudir meninas recém-entradas na adolescência, interrompendo qualquer possibilidade de futuro minimamente digno para essas pequenas brasileiras.
Trata-se de uma calamidade. Nem o tão comemorado Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) tem conseguido minorar. Além dessas interrupções abruptas de gestações, o nosso país registra, ainda, a cada ano, mais de 26 mil partos de mães com idade oscilando entre 10 a 14 anos.
Bem-vindos à selva, dirá o resto do mundo civilizado sobre nós. Em 2018, nada menos do que 32 mil abortos foram realizados em meninas entre 10 e 14 anos. O mais triste é que essa realidade cruel no trato humano começa em tenra idade, prolonga-se ao longo da vida adulta e culmina na velhice de forma também absolutamente trágica.
Para um Estado que não consegue, minimamente, cuidar da população infantil e adolescente, não chega a ser surpresa o que também acontece com seus cidadãos idosos. No Brasil, aproximadamente 15% da população é compostos por pessoas com mais de 60 anos. O problema que nos lança à barbárie é outro, mas, igualmente, brutal. Nossos idosos são maltratados, espoliados e, em muitos casos, simplesmente abandonados à própria sorte, mesmo aqueles que têm algum tipo de renda.
Pensar que, em 2030, segundo dados do Ministério da Saúde, o Brasil terá a quinta população mais idosa do planeta, assusta. Essa mudança no perfil demográfico, a exemplo do que ocorre no ECA, com relação às crianças, também não é abrandado pelo Estatuto do Idoso. Tanto um documento quanto o outro, fundamentais para um mínimo de garantias à dignidade humana, são, em parte, letra morta pela incapacidade e vontade do Estado e das autoridades em lidar com esses problemas sociais dessa magnitude.
Em 2019, o número de emergência, Disque 100, que é o canal de denúncias do governo federal específico, também, para maus tratos aos idosos, computou alarmantes 37.500 registros de violações contra pessoas idosas em todo o país. Esses números vêm crescendo a cada ano, seguindo a tendência de envelhecimento rápido da população.
Em média, isso representou mais de 100 casos de violência contra idosos a cada dia. É um dado alarmante, que nos remete ao fim da fila quando o assunto é cuidado com os pequenos e os cidadãos mais vividos e experientes. Não adianta, nesses dois extremos da faixa etária dos brasileiros, lançar números e estatísticas vergonhosas. Carecemos de políticas públicas. Os números depõem contra nós. Somos o que somos, quer por nossas atitudes, quer por nossa passividade, o que vem a dar no mesmo.

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A frase que foi pronunciada

“A vida humana é uma trama
tecida de bons e maus fios.”

Saga 1

» Até o fim de dezembro, poderá chegar a mil o total de lojas fechadas no Plano Piloto em razão da pandemia. Hoje, há 540 empresas sem funcionar na Asa Sul e perto de 360 na Asa Norte, avalia o Sindicato do Comércio Varejista. O presidente do Sindivarejista, Edson de Castro, diz que os lojistas enfrentam excessiva burocracia na hora de buscar crédito em bancos oficiais, e desistem. Há mais de 4 mil desempregados no comércio do DF.


Primeira pista

» Ari Cunha nunca explicou como previa a chuva depois de longa estiagem em Brasília. Impressionava os amigos quando afirmava que ia chover. Só ele acertava. Nenhum instituto de meteorologia anunciava a previsão que ele garantia. O que registro aqui é que o sabiá cantou pela primeira vez em17 de agosto.

História de Brasília

Já que o assunto é jardim, um dos grandes entusiastas
é o almirante Ângelo Nolasco, ministro da Marinha.
Mandou fazer em sua casa, à beira do lago,
um dos mais belos jardins do Distrito Federal.
(Publicado em 14/1/1962)

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