O presidente Jair Bolsonaro prestou um desserviço à luta para garantir os direitos de crianças e adolescentes. Durante evento, na semana passada, voltou a defender o trabalho infantil. Contou que teve um emprego num bar, aos 10 anos, por ordem do pai, e tascou um “bons tempos, né, onde o menor podia trabalhar”. É uma declaração grave — para dizer o mínimo —, ainda mais tendo sido proferida pela autoridade máxima do Brasil.
A Constituição — que deve ser zelada, primeiramente, pelo presidente da República — é enfática ao vetar o trabalho infantil. O art. 7º, XXXIII, diz: “Proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezoito e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos”. Mais claro, impossível.
E, na declaração infeliz, Bolsonaro ainda tratou o assunto como se tivesse sido erradicado por aqui. Nada mais falso. Apesar de todas as leis que versam sobre a proteção de crianças e adolescentes, estamos a anos-luz de eliminar essa chaga. As estatísticas sobre trabalho infantil nem têm sido mais divulgadas.
As mais recentes foram liberadas em 2017, pelo IBGE, com dados de 2016, e apontavam que o Brasil tinha 2,4 milhões de meninos e meninas nessa condição. Com a miséria e a fome aumentando, especialmente na pandemia, esse número deve ser mais elevado. E olha que o Brasil é signatário da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas, que prevê a erradicação do trabalho infantil, em todas as suas formas, até 2025.
A penúria, que empurra crianças e adolescentes para a exploração em comércio, construção, agricultura, carvoarias, olarias, oficinas, cortes de cana, lixões, quebra de pedras, serviços domésticos, é a mesma que os fazem trabalhar diretamente com a família, em feiras, como ambulantes, vendendo produtos de porta em porta, nos semáforos.
Trabalho impacta o desenvolvimento físico e mental de meninos e meninas. A depender da atividade que exercem, estão sujeitos a toda sorte de acidentes, mutilações, doenças, abusos e até à morte. Há comprometimento, também, do futuro deles. O cansaço os faz abandonar a escola ou pouco aproveitar as aulas. Na vida adulta, sem qualificação necessária para competir no mercado de trabalho, acabam relegados a subempregos, renovando o ciclo de miséria.
É urgente que Estado e sociedade parem de encarar um flagelo desse com naturalidade, como fez Bolsonaro. Crianças e adolescentes têm de estudar, divertir-se, alimentar-se bem, morar em local digno, receber amor e carinho, menos trabalhar. Sem políticas públicas eficientes para auxiliar de imediato as famílias carentes e, numa outra vertente, combater a desigualdade social, meninos e meninas continuarão a ter os direitos violados, a ter a infância roubada.
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