A agenda econômica pré e pós-pandemia

LUIZ GUILHERME SCHYMURA
postado em 27/09/2020 21:23

O Boletim Macro do FGV/Ibre divulgado em 20 de fevereiro, ou seja, há cerca de sete meses, sugeria para 2020 crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) em torno de 2%, mercado de trabalho melhorando ao longo do ano e deficit primário do governo central rodando em 1% do PIB. Diante do quadro descrito à época, a dívida bruta encerraria 2020 abaixo de 80% do PIB. Com a aprovação da abrangente reforma da Previdência em 2019, o país entrava em 2020 com a perspectiva de que a situação fiscal perderia o protagonismo.

Embora as contas públicas ainda merecessem atenção, o medo da insolvência já não assombrava tanto os analistas. A dívida bruta parecia ter se estabilizado no patamar de 80% do PIB. Com isso, o debate poderia avançar para a construção de uma agenda mais ambiciosa para o país. Era hora de impulsionar a produtividade e o crescimento sustentável.

Enfrentando as restrições impostas pela configuração brasileira — carga tributária bastante elevada para padrões internacionais e renda distribuída de forma extremamente desigual —, alguns dos principais atores políticos e lideranças nacionais partiram na busca de caminhos para deslanchar a economia. Grande número das proposições ganhou fôlego e começou a tramitar nas Casas Legislativas, sendo a de maior impacto a reforma tributária.

De forma sucinta, esse era o panorama econômico quando a covid-19 aterrissou no país, no fim de fevereiro. A pandemia teve de ser combatida com isolamento social e quarentenas, impondo um freio brutal à atividade econômica. A parada forçada, com impacto imenso no mercado de trabalho e no caixa das empresas, levou o governo a formular às pressas pacotes enormes de apoio a famílias e negócios.

As cifras fiscais desses programas são astronômicas. Como não podia deixar de ser, as contas públicas foram fortemente pressionadas. Agora, o deficit consolidado do setor público em 2020 marcha para 13% do PIB, e a dívida bruta do governo geral dirige-se para 100% do PIB. Com isso, o risco de insolvência voltou a preocupar. A covid-19 faz que a política fiscal retome o protagonismo da pauta econômica.

Nesse contexto, é vital que haja um sistema institucional que desacredite cenário de calote da dívida pública. Há a percepção de que a PEC 95, emenda do teto dos gastos, tem cumprido esse papel. No entanto, devido ao excessivo comprometimento com gastos públicos obrigatórios, o dispositivo do teto apresenta sérias dificuldades em ser respeitado.

Em função desse quadro, é fundamental criar um arranjo institucional que possa substituir o teto de gastos como garantidor da solidez das contas públicas. Afinal, não parece sensato imaginar que o país consiga administrar as expectativas quanto à solvência sem uma âncora fiscal politicamente estabelecida e ambiciosa.

A epidemia também colocou em foco dezenas de milhões de brasileiros “invisíveis” para a política social, que não faziam parte do cadastro único dos programas de transferência de renda do governo nem do mercado de trabalho formal. Ficou clara a necessidade de respostas do poder público, ainda mais em um momento no qual não há postos de trabalho suficientes disponíveis para a população. Enquanto o crescimento mais vigoroso da economia não vier, os empregos não aparecerão. Por isso, política mais robusta de inclusão tornou-se premente.

Diante de tantas fragilidades e urgências trazidas pela covid-19, respostas são aguardadas dos Poderes da República. Não é razoável, portanto, imaginar que a agenda nacional pós-pandemia retomará aquele momento de fevereiro deste ano, de política fiscal sob controle e foco concentrado numa pauta de produtividade e de crescimento de longo prazo mais vigoroso.

É claro que esses temas não devem sair da pauta, mas o momento é outro, e o Brasil terá de priorizar novamente o desafio de ancorar a solvência pública, sem perder de vista a situação dos mais vulneráveis e dos desempregados, ao mesmo tempo que cria as condições para a retomada rápida da economia.

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