Pessoa desavisada que leia o noticiário político e econômico terá uma certeza: o Brasil não tem com o que se preocupar. O PIB bate recordes, os salários e a renda aumentam, a desigualdade social é chaga passada, a educação disputa o topo do ranking com os campeões do Pisa, os serviços públicos rivalizam com os dos países nórdicos, a recuperação pós-pandemia faz inveja à Alemanha.
A conclusão procede. Só a falta de desafios justifica os embates protagonizados por figuras de proa do cenário nacional. Longe de apresentar propostas e contornar arestas, o ministro da Economia, Paulo Guedes, o do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, e o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, exibem desentendimentos pueris, que roubam tempo, energia e os escassos recursos de que o país dispõe.
No momento, o pomo da discórdia é a fonte de financiamento do Renda Cidadã. Apresentado na semana passada, o programa seria bancado com parte dos recursos do Fundeb e do adiamento de precatórios (pagamentos impostos por decisão judicial). A reação negativa do mercado obrigou a volta atrás.
Marinho defende a tese de tirar o programa do teto de gastos — a regra constitucional que proíbe o crescimento da despesa além da inflação. Guedes opõe-se à proposta. Em reunião com banqueiros na semana passada, o ministro de Desenvolvimento Regional teria falado mal do colega, que, diante de câmeras e microfones, o classificou de “despreparado, desleal e fura-teto”.
Também se observam atritos entre o presidente da Câmara e o ministro da Economia. Há poucos dias, a relação azedou um pouco mais. Guedes acusou Maia de ter feito acordo com a esquerda para frear projetos de privatizações do governo. Em resposta, Maia o chamou de “desequilibrado”.
Enquanto isso, o auxílio emergencial, cuja vigência acaba em dezembro, aguarda solução. Ontem, após café da manhã com o presidente Bolsonaro, Rodrigo Maia e Rogério Marinho, o relator do Orçamento, senador Márcio Bittar, reuniu-se com o ministro Paulo Guedes e afirmou que as definições seriam divulgadas amanhã, respeitado o teto de gastos.
Com recursos escassos e projetos opostos, confirma-se o provérbio: "Em casa onde falta pão, todos gritam e ninguém tem razão". O ideal é que Guedes e Marinho sentem-se à mesa e busquem saídas para o impasse. Marinho é bom articulador; Guedes, bom economista. A união dos dois poderia devolver aos trilhos a política econômica e incluir na pauta as medidas por que o país anseia. Sem entendimento, a conta recairá nas costas de quem não pode arcar com ela — a população pobre.
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