Com a antecipação da aposentadoria do decano Celso de Mello, começou um pouco mais cedo a corrida por uma vaga no Supremo Tribunal Federal. Aliás, outras virão. Assim, inicio respondendo à pergunta do título. Sim, a escolha para membro da Suprema Corte não pode ser como a de Sofia — retratada em romance de William Styron de 1979 cujo tema central é a escolha de uma mãe por um dos filhos após ser flagrada em crime de contrabando durante a Segunda Guerra.
O longa-metragem e o tema levitam sobre o que se tornou expressão idiomática: fazer uma escolha de Sofia significa ver-se forçado a optar entre duas alternativas igualmente insuportáveis. Pois bem, o presidente da República, na forma do art. 101 da Constituição, indicou o piauiense desembargador do TRF da 1ª Região, Kassio Marques, novo membro para compor o STF.
Somente para pontuar, o citado artigo ensina que os requisitos para membro da Corte são: ser maior de 35 anos, possuir reputação ilibada e notável saber jurídico. É, é isso mesmo. A Constituição de 88, assim como as anteriores, nem sequer exige que o indicado seja advogado, bacharel em direito, desembargador, juiz de 1ª instância, conselheiro, promotor de justiça, defensor público, ministro.
Outra curiosidade do sistema e, para provável surpresa do leitor, é que a Carta não determina que o presidente da República indique o ministro, mas o nomeie, sendo possível, em tese, que qualquer pessoa, Poder ou instituição o faça, ficando, claro, ao alvedrio do mandatário nomear ou não.
Se consentâneo ou não com o sistema, o fato é que a nossa Constituição não exclui. Ao contrário, ela é agregadora ao incluir a experiência do homem e não do cargo, emprego ou função que exerça ou tenha exercido durante a vida profissional. Optou o legislador, assim, pela experiência e o arejamento do Judiciário por pessoas que podem levar para o hermético Poder, além da experiência, sua reputação e vivência, além dos legítimos anseios dos Poderes, instituições e dos cidadãos do estado natal do indicado. Desejou pessoas ilibadas e de notório saber jurídico, não seus últimos cargos, empregos ou funções.
A escolha do novo ministro, ao contrário daquela do romance de William Styron, não mirou extirpar, mas incluir, exerceu o mandatário a sua alternativa dentre aquele que melhor inclua e exerça a jurisdição a seu sentir. Aliás, lembro que há exemplos de médicos ou parlamentares que já ocuparam cadeiras do STF e se saíram muito bem. De qualquer forma, ter escolhido um magistrado nascido em um pequeno estado do Nordeste, desembargador, mostra, sem dúvida, respeito ao Poder Judiciário e à Federação.
Há, portanto, sem motivo, certa inquietação quando é chegada a hora de escolher um cidadão para uma das 11 cadeiras do STF, notadamente em virtude do protagonismo demonstrado nos últimos anos, com a sempre antiga discussão sobre o exagero ou não do que se batizou como ativismo judicial, que tanto vem intrigando juristas e operadores do direito, no Brasil ou no exterior, em virtude da almejada segurança jurídica.
Não se pode esquecer, ainda, que a indicação passa pelo Senado Federal, que, na verdade, dá a palavra final, aceitando ou não o nome apontado pelo presidente da República, sendo, portanto, responsável solidário e representativo dos seus, somados, milhões de votos democraticamente sufragados pelo povo brasileiro.
O aspecto plural da Constituição cria atmosfera de abrangência, conversando com os princípios republicanos de notável inclusão a expurgar a exclusão estampada no romance mencionado e a produzir novo e mais desejado roteiro, qual seja, a de escolha de Sofia às avessas. Nesse contexto de inclusão e probidade ostentadas por Kassio Marques, a Andes parabeniza o novo indicado e aguarda que o Senado o referende.
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