No início do século 19, a Europa respirava os ares renovadores da Revolução Francesa. Outro mundo, impossível de imaginar-se, começava a ser edificado. Liberdade, igualdade e fraternidade tornou-se dístico que mudaria as relações de poder e as relações sociais. Napoleão Bonaparte, o grande general francês, dominava a política do continente e se qualificava como um dos maiores estrategistas militares de todos os tempos. Nada poderia obstar-lhe as conquistas territoriais. Nada?
A imprensa ele a vigiava de perto. “Tenho mais medo de três jornais do que de 100 baionetas.” Essa frase, atribuída ao corso, demonstra a importância que ele devotava à opinião pública, conformada pelos ativos jornais franceses da época. Na Segunda Guerra Mundial, embora a difusão da informação estivesse sob o controle da censura militar, o próprio comandante supremo das forças aliadas, general Eisenhower, chegou a declarar: “Correspondentes têm na guerra um trabalho tão essencial quanto o pessoal militar; fundamentalmente, a opinião pública ganha guerras”.
Durante as operações militares do Afeganistão, a edição americana da revista Rolling Stones divulgou entrevista com o general Stanley McChrystal em que ele criticava veementemente os “molengas da Casa Branca”. Resultado: demissão imediata do comando mais importante das forças americanas naquele período. O irascível general, famoso pela liderança pelo exemplo, foi traído pelo mensageiro. Ou ele mesmo se traiu? Três exemplos de envolvimento da imprensa com situações de interesse do público em geral e seu papel no iluminar. Contestando-a.
No primeiro, com a censura aos principais periódicos, estabelecendo como única voz jornalística o órgão controlado pelo governo: o Moniteur. Acolhendo-a. No segundo caso, ao valer-se da capacidade da imprensa por meio dos correspondentes, para adentrar à sala de jantar das famílias aliadas. Desconsiderando-a. No terceiro, o arroubo impensado ou infantil daquele chefe militar, na crença de que os mensageiros — a imprensa — não podiam agir para desconstruir a sua imagem de autoridade. Salto no tempo.
Trago a discussão do papel do jornalismo para o Brasil de hoje. Deixando claro que é necessário reconhecer, com idoneidade moral e equilíbrio emocional, acertos e erros cometidos. Exerci, até pouco tempo atrás, o papel de algodão entre cristais quando me encontrei cumprindo a missão de porta-voz do presidente da República e de seu governo. Árida missão. Rezar o terço para dois santos...
Nesse contexto, reforcei minha convicção de que a notícia nada mais é que a tradução de um evento, uma frase ou um comportamento que chocam, pouco ou muito, não importa, mas que podem ser de interesse da população conhecer para posicionar-se. Logo, se você, cidadão comum ou autoridade, encontra-se à disposição do escrutínio da opinião pública por seus atos e omissões, gestos e palavras, encontre equilíbrio para enfrentar a má notícia e, se possível, contrapor a sua versão à versão jornalística.
As suas razões de defesa só serão mensuradas se você as expuser. Abdicar de iluminá-las, incluir fatos que não se sustentam na verdade ou agir grotescamente para impedir o assunto – contrariando o profeta, gentileza gera gentileza – não vai colaborar para amenizar a situação, tampouco deletar o assunto da discussão na mídia. Não tema a imprensa. Acostume-se a com ela lidar. Construa pontes. Seja humilde se estiver em dívida. Seja sereno se há coerência na matéria. Seja leão se a imprensa não promover a verdade. Paz e bem!
* General, foi porta-voz do presidente Jair Bolsonaro
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