Opinião

Deixe o sol sair

Ana Dubeux
postado em 11/10/2020 08:28

Venci. E poderia ser esse o maior triunfo de uma pessoa que sobrevive à covid-19. Mas garanto a você que não é. Porque não posso chamar de vitória o que ainda é desconhecido. Porque não posso ignorar as chances de sequelas. Porque não estamos livres do porvir de um vírus com capacidade de mutação e muito letal — a ponto de mutilar famílias inteiras e jogar o mundo num abismo colossal, ainda sem chão, nem teto. Embora com algumas frestas de luz, permanecemos no escuro.

Mas posso dizer que venci o meu próprio medo, venci uma crise de ansiedade ao sair do meu confinamento, venci o primeiro dia ao ar livre, respirando para o universo e agradecendo as chances de aprendizado. Como sou uma pessoa que anda de mãos dadas com o otimismo e a esperança, acredito numa cura próxima, pela ciência, com a vacina. Acredito, também, que podemos ser maiores e melhores do que fomos até aqui e não ignorar os sinais da natureza. São esses sentimentos que me trazem leveza.

Além das orações, o humor permaneceu comigo durante as duas semanas em que convivi mais intimamente com a covid-19. Achei muita graça nos amigos doidinhos — tanto aquele que queria me visitar para pegar logo o vírus e ficar imunizado quanto a amiga que marcou nosso próximo encontro para fevereiro de 2021. Permaneci aberta ao riso, apesar da angústia contida no passar dos dias em regime fechado.

Lembrei da música de Taiguara Que as crianças cantem livres, que tanto ouvi na infância. Tem um trecho que diz assim: “Vê como um fogo brando funde um ferro duro/Vê como o asfalto é teu jardim se você crê/Que há sol nascente avermelhando o céu escuro/Chamando os homens pro seu tempo de viver”. E continua: “E que as crianças cantem livres sobre os muros/E ensinem sonho ao que não pode amar sem dor/E que o passado abra os presentes pro futuro/Que não dormiu e preparou o amanhecer...”

Sim, é bonito. Estamos na véspera do Dia das Crianças. Olhando para elas, que trazem a esperança infinita e a possibilidade viva do sonho dentro de si, renovo também meu otimismo no que virá. Se ainda está escuro lá fora, precisamos lembrar que a lanterna que clareia tudo é nossa própria luz. Não se afaste do seu clarão e deixe que ele saia por aí, passeando pelas trevas e iluminando o caminho por onde passa. Seja qual for.

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