A pandemia da covid-19 pode ser considerada como o maior desafio que a humanidade já enfrentou, desde os desastres da peste negra, no final do século 14 (um surto bacteriano transmitido por pulgas e ratos que levou a óbito entre 75 a 200 milhões na Eurásia, incluindo um terço da população europeia) e, das diversas pandemias virais de gripe que a humanidade testemunhou, com ênfase na chamada espanhola, entre 1918-20, que infectou 500 milhões de pessoas (mais de 25% da população mundial) e matou entre 50 e 100 milhões de pessoas.
É de amplo conhecimento que baixar a febre do paciente, não cura a doença. De igual modo, cuidados paliativos são importantes, mas não eliminam a enfermidade. Neste momento crítico, reconhecermos que pouco sabemos sobre como superar esse incrível desafio, é fato também que o pouco saber não significa nada saber.
Portanto, a questão central do problema reside em como usar (com racionalidade) o pouco do que sabemos em prol do combate ao (novo) vírus que ameaça a saúde pública mundial.
Como já anunciado por alguns economistas menos atentos à realidade —, a eventual falência do sistema econômico neoliberal que apregoa a menor interferência do Estado na economia (o tradicional ideário do Estado mínimo), mas, ao reverso, uma extraordinária oportunidade de “repensar”, a médio e longo prazos, uma (nova) concepção de Estado inteligente, permitindo um novo “salto qualitativo” no contexto da própria dinâmica do sistema econômico capitalista.
Nesse sentido, cabe ao Estado brasileiro analisar e direcionar a atividade industrial para as urgentes demandas do povo. Uma espécie de economia de “guerra”, que poderá (em parte) compensar a acentuada queda observada em outros setores da economia.
Com a quarentena imposta, milhões de brasileiros passaram a trabalhar remotamente para evitar a disseminação do vírus e cumprir as regras sanitárias defendidas pela ciência. O novo formato obrigou o Judiciário a criar novas formas de dar acesso aos advogados e às partes, às sessões de julgamento.
Desde o início do surto, os órgãos colegiados da Corte incorporando à rotina de recursos da tecnologia. Com a realização de sessões por videoconferência, tornou-se possível a advogados de outros estados fazer sustentação oral sem ter de se deslocar. A pandemia gerou a oportunidade para o cidadão de se fazer representar nas sessões de julgamento, sem ter de arcar com os custos de viagem e estadia.
Prova disso, aconteceu no último 4 de agosto, na sessão de julgamento da Terceira Turma Especializada, que julga matéria tributária, foi por videoconferência e se estendeu por oito horas. O órgão abriu os microfones para 21 sustentações orais, das quais 12 foram realizadas por advogados de outros estados da federação, sendo oito de São Paulo, dois do Espírito Santo, um de Minas Gerais e um do Paraná. O exemplo mostra como se efetivou o princípio da ampla defesa em uma extensão inédita. Um modelo que permitiu aos patronos das ações um acesso ao Judiciário que seria impossível caso eles ou seus clientes não tivessem como arcar com os custos de deslocamento para o Rio de Janeiro.
Não foi proposital, mas o surto da doença no país acabou mudando para sempre a maneira como o Judiciário funciona. No caso do Tribunal Regional Federal (TRF2), o trabalho tornou-se mais eficiente: foram mais de seis milhões de atos jurisdicionais realizados desde que entrou em regime de trabalho remoto. A marca, atingida no começo de agosto, inclui o total de sentenças, despachos, decisões interlocutórias e atos cumpridos por servidores do Tribunal e das Seções Judiciárias do Rio e do Espírito Santo.
Outro ponto importante é que o tribunal e, portanto, a sociedade, estão economizando muito dinheiro com o trabalho remoto, com a diminuição de gastos com o funcionamento dos prédios públicos.
A produção tem sido expressiva também na área administrativa, sobretudo na publicação de atos e de notícias relacionadas à pandemia. Segundo dados do portal do Observatório Nacional sobre Questões Ambientais, Econômicas e Sociais de Alta Complexidade e Grande Impacto e Repercussão, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o TRF2 é o primeiro colocado no quantitativo de medidas e informativos expedidos.
A informação compartilhada — e não, como apregoam alguns, o isolamento comunitário global —, o fator primordial que permitiu à “expertise” humana (reunida) vencer os inúmeros desafios que lhe foram impostos ao longo de sua milenar existência.
* Professor, desembargador Federal e presidente do TRF 2
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