O amigo que não veio

Marcos Paulo Lima
postado em 13/11/2020 23:20 / atualizado em 13/11/2020 23:21

Jair Bolsonaro adora posar do lado vencedor da história. Se necessário, até vira a casaca. Estava dentro do campo, no Allianz Parque, na festa do título do Palmeiras no Brasileirão 2018. No ano passado, aproximou-se da diretoria do Flamengo a fim de surfar na série de seis títulos do clube na era Jorge Jesus. Vestiu a camisa rubro-negra, no Mané Garrincha, e até atraiu o português ao Palácio do Planalto após o clube carioca conquistar, em Brasília, a Supercopa do Brasil.

O presidente fatura com vitórias alheias e joga os fracassos pessoais para baixo do tapete. Um deles, nas eleições dos Estados Unidos. O atual inquilino da Casa Branca, Donald Trump, perdeu nas urnas, há uma semana, para o eleito Joe Biden. Bolsonaro não reconhece o triunfo do democrata. Finge que nada aconteceu em nome da amizade com o republicano derrotado.

Mas que aliado é esse que deve encerrar o mandato de quatro anos sem colocar os pés no Brasil? Trump está prestes a quebrar tradição de 43 anos. A contar de 1977, os EUA tiveram sete presidentes. Seis vieram ao país em viagem oficial: Jimmy Carter, Ronald Reagan, George Bush (pai), Bill Clinton, George Bush (filho) e Barack Obama. Antes, Herbert Hoover, Franklin Roosevelt, Harry Truman e Dwight Einsenhower usaram o passaporte em solo verde-amarelo.

Portanto, se não pintar no Brasil até 20 de janeiro, o amigo de Bolsonaro será a primeira exceção em 43 anos. Não faltaram oportunidades. Trump fez 19 viagens internacionais no mandato. Visitou 24 países. A única nação contemplada na América do Sul foi a Argentina, no Encontro do G-20, em novembro de 2018. Não quis nem escala no Brasil. Em 2019, quando o pai assumiu, o deputado Eduardo Bolsonaro articulou visita de Trump à Amazônia. Jair foi aos EUA quatro vezes em dois anos de mandato. Jantou com Trump na Casa Branca. Mas gostaria, mesmo, de recebê-lo no Brasil.

O atual vice-presidente Mike Pence esteve no país no governo de Michel Temer. Joe Biden era frequentador assíduo no papel de suplente de Barack Obama. Esteve no Rio, em Natal e em Brasília, em 2013, 2014 e 2015. Prestigiou a posse de Dilma Rousseff no segundo mandato da petista.

Bolsonaro não reconhece a derrota de Trump de forma protocolar. No entanto, os discursos dos últimos sete dias admitem o sucesso de Biden. O presidente brasileiro passou a alfinetar o democrata sobre a soberania nacional, a necessidade de blindar a Amazônia e falou até em usar a pólvora caso a diplomacia não seja suficiente para evitar que o Brasil sofra sanções comerciais.

Meu avô Deco dizia assim: “cão que muito late não morde”. Não fique surpreso se Bolsonaro bandear para o lado de Biden. É o que se espera de quem troca o Palmeiras pelo Flamengo, une-se do Centrão e diz que Trump “não é a pessoa mais importante do mundo”. Agora, não, né?

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