Somos tão ricos e tão pobres
Uma nova economia tropical é possível para o pleno desenvolvimento do país. Para tanto, basta que o Brasil invista fundo no conhecimento de sua rica biodiversidade. Pouco foi feito nesse sentido. Um novo modelo de economia tropical deve ser baseado na ciência, na tecnologia e na inovação aplicada ao que os cientistas chamam de “ativos biológicos” naturais de nossas florestas. E não é só na Amazônia, que é a principal depositária dessa biodiversidade, mas em outros biomas também, como a Mata Atlântica e o cerrado, onde essa diversidade biológica é enorme e, em boa parte, ainda desconhecida dos brasileiros.
Plantas e animais, toda essa diversidade é resultado de centenas de milhões de anos de evolução da nossa natureza, e deve ser, por isso mesmo, considerada a nossa maior riqueza, nosso maior potencial. À medida que avançarmos nas pesquisas sobre essa biologia complexa, descobriremos um potencial jamais imaginado que está ali, há séculos, bem debaixo de nosso nariz.
Sinal mais claro de que seria bom um programa nacional para conhecimento da diversidade biológica é o interesse estrangeiro. Não podemos proteger o que não é do nosso conhecimento. Somos o único país com essa biodiversidade, e isso vale muito mais do que qualquer gado, soja ou exploração de minérios. Durante o período militar, houve uma certa preocupação em tornar o Brasil um país economicamente independente não apenas na área energética, mas em outros setores. Naquela ocasião, foram construídas algumas hidrelétricas importantes, investiu-se no biodiesel, no etanol, com destaque, também, para a geração de energia elétrica em usinas nucleares.
Para o pesquisador Carlos Nobre, se, naquela mesma época, tivéssemos criado, também, a Embrabio, empresa brasileira de aproveitamento econômico da biodiversidade, o Brasil teria uma outra economia. “Neste século 21, o maior valor econômico não está mais centrado em bens materiais, nem energia nem minerais, hoje, o referencial de riqueza de uma nação é o conhecimento”, afirma o cientista.
Ao insistir na importância do estudo de nossa biodiversidade, como ela interage e como a natureza resolveu alguns problemas, o cientista acredita que poderemos encontrar uma via que nos conduzirá à nova economia ou, mais precisamente, ao que se chama de bioeconomia. Ele alerta que os países desenvolvidos já sabem que a bioeconomia será muito poderosa num futuro próximo.
A partir de 2030, a Alemanha projeta que 25% de toda a sua economia estarão centrados na bioeconomia, retirando da biologia mais profunda novas e inusitadas riquezas. Infelizmente, nós, que temos a maior biodiversidade do mundo, ainda não percebemos, de forma clara, todo esse potencial à nossa disposição.
Numa análise simples, é possível verificar que o potencial da biodiversidade da Região Amazônica é infinitamente maior do que a criação de gado, a mineração e outros. Para se ter uma ideia, o guaraná, a castanha-do-pará, a andiroba, a copaíba e outros produtos, antes com baixo valor econômico, hoje, são bem cotados dentro e, principalmente, fora do país. O caso do açaí é exemplar. Essa fruta tem uma produção de 250 milhões de toneladas e é consumida em todo o mundo, gerando riqueza e, o mais importante, mantendo a floresta em pé.
Apenas com relação a esse único produto, sabe-se, agora, que a semente e o palmito do açaí têm ,também, múltiplos e fantásticos usos, o que pode aumentar ainda mais o valor desse produto nos mercados internos e externos. Essa fruta, até pouco tempo atrás desconhecida da maioria dos brasileiros de outras regiões, gera em divisa para a Amazônia US$ 1,8 bilhão ao ano. Na indústria mundial, esse valor é 10 vezes maior. E esse é apenas um produto. Portanto, é preciso entender a diversidade biológica a partir do biomimetismo, ou seja, entendendo como a natureza resolveu certos problemas.
Nesse ponto, Carlos Nobre cita o exemplo de uma cientista da Amazônia que, por meio da observação da garra da formiga cortadeira daquela região, desenvolveu uma pinça cirúrgica muito mais eficiente e que, hoje, está sendo muito usada em outras partes do mundo. A Amazônia será o grande celeiro de conhecimento da bioeconomia. Para este respeitado pesquisador, temos que ter um certo orgulho nacional de criar um modelo de desenvolvimento e sermos o primeiro país tropical a vir a ser desenvolvido, graças à nossa própria biotecnologia.
Devemos, ainda, que aprender e respeitar o valor, com repartição de benefício, do conhecimento tradicional, sobretudo, das comunidades indígenas, que têm grande conhecimento da riqueza dessa nossa biodiversidade. Temos de ser descobridores da nossa biodiversidade e não copiar outros países. Para tanto, teremos de fortalecer muito, a nossa capacidade científica. O caminho é longo. Precisamos dessa autonomia, essa vontade de preparar o país, reforçando nossas pesquisas científicas interna. Para Carlos Nobre, a pesquisa em nosso país, nos últimos anos, tem ido totalmente na contramão do que vem sendo feito em outros países. Nossas pesquisas, diz, estão sendo abaladas, desprestigiadas e mesmo massacradas, o que prova que a ciência brasileira continua a não ser vista estrategicamente por aqueles que estão no comando do país.
Para ele, à medida que as pesquisas científicas em nosso país não são vistas como elemento central de desenvolvimento, o que teremos pela frente é o caminho do retrocesso muito mais perigoso, a longo prazo, do que as próprias crises políticas que, agora, experimentamos com a descoberta dessa avalanche de casos de corrupção.
Desprestigiar a nossa ciência, avalia Carlos Nobre, amputa a capacidade de o Brasil crescer a longo prazo. É preciso, ainda, deixar claro que a biotecnologia e a bioeconomia são ciências interdisciplinares, até mesmo transdisciplinar, e envolvem não apenas biólogos, mas bioquímicos, engenheiros de biotecnologia, físicos, químicos e todo o amplo conjunto de técnicos, que vão transformar toda essa riqueza biológica em bem-estar social para os brasileiros.
Temos, portanto, como missão, daqui para frente, pensar um modelo brasileiro e tropical de desenvolvimento com base em nosso principal ativo, que é a nossa riquíssima biodiversidade que teremos que proteger contra as investidas cegas de outros setores da economia, como vem sendo feita, por exemplo, pelo agronegócio.
História de Brasília
A Novacap está disposta a reaver as granjas distribuídas a pessoas que não residem em Brasília, nem nunca tomaram posse da terra que lhes foi cedida. Há muita gente importante na primeira relação. (Publicado em 15/12/1961)
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