“Outrora, a velhice era uma dignidade; hoje ela é um peso”, escreveu o François-René de Chateaubriand, escritor e ensaísta do século 19. Chegar à velhice pode ser o encontro com pesadelos diários para muitos brasileiros com 60 anos ou mais, considerados idosos pelos padrões etários da Organização Mundial da Saúde (OMS). Entre janeiro e setembro deste ano, o Disque 100, canal de reclamações do governo federal, recebeu 60.109 denúncias de violência e maus-tratos contra idosos ante 36.181 registradas em igual período de 2019.
Os dados alarmantes levaram o Ministério da Justiça e Segurança Pública a deflagrar a Operação Vetus (velho, em latim), que mobilizou 7.940 policiais civis em todas as unidades da Federação, na última sexta-feira. Foram apuradas 10.802 denúncias, 11.755 vítimas atendidas, cumpridos 147 mandados, 765 medidas protetivas, 12.852 diligências, instaurados 3.088 inquéritos e a prisão de 449 pessoas, segundo balanço divulgado pelo ministério.
A quarentena imposta pela pandemia do novo coronavírus, como recurso para evitar a proliferação da doença, tornou os idosos mais vulneráveis às diversas expressões de violência dentro do ambiente doméstico — agressões físicas e psicológicos, como ofensas e insultos, negligência, abandono, abuso financeiro e patrimonial. Entre março e junho, foram mais de 25 mil denúncias pelo Disque 100.
Ter um canal para o recebimento de denúncias, como o Disque 100, é um avanço. Mas é iniciativa insuficiente para que o ancião tenha condições adequadas de vida e o respeito que lhe é devido, seja dentro da família, seja fora dela e pelo Poder público. No ano passado, o governo vetou a lei de regulamentação da profissão de cuidador e a de criação do cadastro nacional de pessoas idosas.
Em contrapartida, não há abrigos, equivalentes a creches públicas, para acolher os idosos durante o dia, quando os integrantes da família estão no trabalho ou no exercício de outras atividades. Desconsideram-se as fragilidades naturais com o avanço da idade, as doenças e os cuidados necessários que essa parcela da sociedade demanda. A situação torna-se mais dramática entre aqueles das famílias de baixa renda, que são mais dependentes dos serviços públicos.
Ações, como a Operação Vetus, têm grande relevância. Mas para onde levar os idosos que são vítimas de agressões dentro lar? O que fazer com aqueles que têm doenças crônicas, mobilidade comprometida, capacidade de discernimento afetada e sem compreensão da realidade que enfrentam? Essas e tantas outras questões precisam de respostas do poder público.
O Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741) prevê punição aos agressores. Mas falhou ao não fixar medidas urgentes de proteção. O aumento da violência impõe aos legisladores uma correção urgente da lei. Pouco ou nada adianta deter o agressor quando o idoso não tem um local de proteção e seguro mantido pelo Estado.
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