A pandemia do novo coronavírus deixa não só um rastro de luto, mas de agravamento das desigualdades sociais e econômica do país. Nos últimos nove meses, desde a eclosão da crise sanitária, a vida de crianças e adolescentes piorou ainda mais, principalmente, daqueles de famílias mais pobres (classes C, D e E). As causas foram a redução de renda, o aumento da insegurança alimentar e as escolas fechadas. É o que revela a segunda rodada da Pesquisa Impactos Primários e Secundários da Covid-19 em Crianças e Adolescentes, divulgada ontem, pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef). Entre as 1.516 entrevistas (igual número ao da primeira rodada), realizadas pela equipe do Ibope Inteligência, a proporção de pessoas trabalhando em novembro foi superior à observada em julho último, quando ocorreu a primeira rodada do estudo. Nos últimos nove meses, 55% informaram que o rendimento diminuiu desde o início da pandemia.
Para o Unicef, essa mostra deve representar 88 milhões de brasileiros. Nos domicílios com crianças e adolescentes, em 64% a redução da renda foi maior devido à diminuição do salário de alguém da família. O reflexo da situação chegou à mesa. Mais da metade dos consultados (54%) teve menos alimentos para consumir — um aumento de 0,6 ponto percentual em relação à primeira sondagem realizada em julho último. Em torno de 20,7 milhões de brasileiros (13%) deixaram de comer por falta de dinheiro. O impacto foi maior entre as classes D e E, nas quais essa proporção chega a 21%. Entre as famílias que sobrevivem com um salário mínimo, 42% das crianças e adolescentes não tiveram acesso à merenda escolar, indispensável à segurança alimentar dos que vivem em situação de vulnerabilidade socioeconômica.
“É extremamente preocupante o cenário de insegurança alimentar que a pandemia traz para crianças e adolescentes. Uma família que não consegue alimentar adequadamente suas crianças está vivendo na mais absoluta privação de direitos. É urgente o desenvolvimento de políticas públicas direcionadas à parcela mais pobre. Elas, muitas vezes, vivem em situações de tamanha exclusão, que não conseguem ter acesso aos programas sociais de distribuição de renda”, afirma Florence Bauer, representante do Unicef no Brasil.
O fechamento das escolas, medida imposta pelo isolamento social para conter a proliferação do vírus, afetou a aprendizagem de crianças e adolescentes. Para o Unicef, os estabelecimentos de ensino devem reabrir, com segurança, o quanto antes. Além das perdas do conteúdo escolar, a pandemia afetou, também, a saúde mental dos menores de 18 anos. A sondagem mostrou que 27% dos entrevistados constataram que os adolescentes tiveram insônia ou excesso de sono. Outros 29% apresentaram alteração no apetite e 8%, menos interesse por atividades rotineiras. No total, 54% das famílias identificaram algum sintoma relacionado à saúde mental dos adolescentes.
As políticas públicas, até agora desenvolvidas pelos sucessivos governos, não têm sido exitosas. A pandemia do novo coronavírus só agravou a dramática situação enfrentada por 51,7 milhões de pessoas, ou 24,7% da população, que estavam abaixo da linha da pobreza, com renda mensal de R$ 436 por pessoa do domicílio. Nesse grupo, há os extremamente pobres, com renda mensal de até R$ 151, que somam 13,7 milhões, ou 6,5% da sociedade. Impõe-se ao poder público o desenvolvimento de políticas que resgatem esse contingente populacional de miséria, dando-lhe condições dignas de vida e de exercício pleno da cidadania.
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