ARTIGO

Brexit e o comércio agrícola mundial - ganha quem chegar primeiro

''Não há nada de errado em exportar commodities. Somos líderes mundiais na venda de diversos produtos dessa natureza e queremos ampliar cada vez mais nossa participação''

Correio Braziliense
postado em 16/12/2020 06:00 / atualizado em 16/12/2020 08:43

LÍGIA DUTRA
Advogada e superintendente de Relações Internacionais da Confederação Nacional da Agricultura (CNA)

PEDRO RODRIGUES 
Economista e assessor de Relações Internacionais da CNA

SUEME MORI
Engenheira mecânica e coordenadora de Inteligência Comercial da CNA


Após quatro anos da decisão dos cidadãos britânicos de deixar a União Europeia(UE), o Reino Unido finalmente estará fora do Bloco, a partir de 1º de janeiro de 2021. Os efeitos do Brexit impactam não somente a UE e o Reino Unido, mas todos os países com os quais esses dois gigantes se relacionam.

Os membros da União Europeia formam um mercado comum, sem tarifas aduaneiras internas. Para países de fora do Bloco, é aplicada uma alíquota comum aos produtos importados, garantindo preferências apenas aos países com os quais haja acordo de comércio. Na prática, o Reino Unido perderá o acesso privilegiado de suas exportações ao mercado europeu e vice-versa.

Para o agro brasileiro, isso significa uma oportunidade de aumentar suas vendas para um dos maiores importadores de alimentos do mundo. No ano passado, 64% de tudo que o Reino Unido comprou em termos de produtos do agronegócio tiveram origem nos países da UE.

As importações agropecuárias totais britânicas somaram US$ 106 bilhões em 2019. Do Brasil, foram somente US$ 1,4 bilhão. Esse resultado nos coloca na 16º posição na lista de fornecedores para o enorme mercado britânico. Com o Brexit, o Reino Unido retoma sua autonomia em termos de política comercial, o que inclui a definição de tarifas de importação próprias.

O novo regime britânico tarifário, UK Global Tariffs, foi lançado em maio de 2020 e prevê a liberalização ou simplificação das alíquotas de importação aplicadas sobre 563 produtos do agronegócio, quase metade (47,3%) de tudo que o Reino Unido comprou em 2019.

Para o Brasil, a boa notícia é que muitos produtos em que somos competitivos serão beneficiados. Esse é o caso das frutas; limões tiveram reduções tarifárias de até 14 pontos percentuais, em relação às adotadas pela UE; as taxas sobre uvas e maçãs também foram reduzidas. Vinhos, cacau em pó e o setor de óleos essenciais, como o de laranja, serão amplamente liberalizados. Outros produtos tradicionais também serão beneficiados, como são os casos do suco de laranja e do algodão.

Apesar das reduções tarifárias, ainda existem outros entraves ao comércio com o Brasil em relação aos competidores europeus, sendo a distância o primeiro deles. O segundo, é a capacidade portuária do Reino Unido. O controle de fronteiras entre o Reino Unido e a UE deve impactar nos prazos para a circulação dos bens, seja aqueles que continuarão utilizando os portos da UE como primeira entrada na Europa antes de entrarem em solo britânico, ou pelo aumento do movimento nos portos do UK, que operarão em nível superior ao observado atualmente.

Contudo, há um grande esforço do governo britânico em solucionar tais dificuldades, visto a importância das importações de alimentos e de outros produtos. A autonomia adquirida com o Brexit possibilitará a adoção de políticas comerciais menos protecionistas do que as europeias. Por anos, o Brasil ficou sem negociar acordos comerciais. Temos acesso limitado aos principais mercados. Esse é um dos motivos pelo qual nossas exportações se concentram majoritariamente em produtos menos complexos.

O Brasil tem uma produção agropecuária diversa, mas a pauta exportadora é muito concentrada. De janeiro a novembro de 2020, três produtos foram responsáveis por 45% de tudo que o setor exportou. Felizmente, somos extremamente competitivos em alguns produtos, que nos especializamos e soubemos agregar valor na produção primária para conquistar mercados. Mas, contentar-nos com isso seria pouco perto da grandeza do setor agropecuário nacional.

Não há nada de errado em exportar commodities. Somos líderes mundiais na venda de diversos produtos dessa natureza e queremos ampliar cada vez mais nossa participação. O que não pode ser negligenciado é a necessidade de incluir no rol de exportadores outras cadeias, especialmente de pequenos e médios produtores rurais.

Nesse sentido, a oportunidade que se abre com o Brexit é única para o Brasil. No começo de 2020, Boris Johnson afirmou que pretende ter 80% do comércio exterior britânico coberto por acordos de livre comércio, nos próximos três anos. Quem chegar primeiro terá vantagens, por isso, é tão importante que o Brasil não se demore.

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