ARTIGO

Brasil 2021: perspectivas do mercado de trabalho

''Apesar da necessidade de investimento, para garantir a qualidade da prestação dos serviços remotos e impedir prejuízos físicos e mentais aos trabalhadores, em regra, os benefícios para as empresas são grandes''

» FABÍOLA MARQUES Advogada
sócia do escritório Abud e Marques Sociedade de Advogadas
doutora e mestre em direito do trabalho pela PUC-SP. Professora da graduação e pós-graduação da PUC
postado em 23/12/2020 06:00 / atualizado em 23/12/2020 08:17

Tanto o mercado de trabalho quanto a economia das famílias mais pobres receberam, em 2020, uma espécie de “óleo protetor” a fim de que o motor não apodrecesse e fosse completamente corroído neste ano tão insólito de pandemia. Não nos cabe aqui expressar juízo político de valor sobre o conteúdo ou a extensão dessas medidas emergenciais. O que nos compete é lançar luz ao panorama que se desenha no horizonte a partir das cartas que estão sobre a mesa neste momento: o término, em dezembro, da flexibilização das leis trabalhistas garantidas pela lei nº 14.020/20 e o fim do auxílio emergencial.

Apesar da leve reação da economia no terceiro trimestre, com recuperação de parte das perdas da fase mais aguda da pandemia, a taxa de desemprego deve continuar em trajetória de alta nos próximos meses, considerando as preocupações com a gravidade da segunda onda do coronavírus e o fim do programa de proteção ao emprego.

Desde a adoção da Medida Provisória 936 em abril (convertida posteriormente na Lei nº 14.020/20), mais de 20 milhões de contratos de trabalho foram redefinidos, segundo o próprio Ministério da Economia. Essa legislação instituiu a possibilidade de as empresas reduzirem proporcionalmente a jornada de trabalho e salário; e suspenderem os contratos de trabalho, com garantia de emprego para quem participou do BEm. Essa garantia provisória de emprego impediu a dispensa sem justa causa dos empregados, salvo nas hipóteses de pedido de demissão ou da prática de falta grave pelo funcionário.

A estabilidade provisória é garantida enquanto durar a redução proporcional de jornada e salário e/ou a suspensão do contrato de trabalho e, após o restabelecimento da jornada de trabalho e do salário ou do encerramento da suspensão temporária do contrato de trabalho, será garantida por período equivalente ao acordado para a redução ou a suspensão. Com o fim da estabilidade, porém, é bem provável que algumas empresas, prejudicadas pela crise econômica, efetuem a dispensa desses trabalhadores.

Assim, em 31 de dezembro de 2020, se não houver prorrogação do estado de calamidade pública, a possibilidade de redução proporcional de jornada e salário e a suspensão do contrato de trabalho dependerão de negociação direta entre as empresas e os sindicatos representantes das categorias profissionais (sindicato de empregados), que poderão negociar novos prazos e percentuais de redução de salário e suspensão de contrato.

Mais de 14 mil brasileiros recorreram à Justiça do Trabalho em ações relacionadas à pandemia do novo coronavírus. Segundo levantamento preliminar do Tribunal Superior do Trabalho (TST), somente até julho, haviam sido registradas 14.286 ações trabalhistas nas Varas do Trabalho com o assunto covid-19. O número, no entanto, representou menos de 2% do total de ações lançadas nas Varas de Trabalho até o mesmo mês, de 851.302.

Com a possível chegada de uma vacina e o fim da fase mais avassaladora da pandemia, é provável que o número de ações trabalhistas cresça. A curto e médio prazos, deve haver um aumento significativo na judicialização decorrente da crise causada pela covid, seja pelo grande número de dispensas, seja pelas dificuldades financeiras e pela inadimplência daqueles que fecharam suas portas.

Um dos fenômenos mais sentidos com a pandemia foi a ampliação do trabalho em home office, que, embora já fosse utilizado por algumas empresas, tornou-se comum para muitos profissionais, em todo o mundo.
A rápida e necessária alteração do trabalho presencial para o home office, embora tenha ocorrido, em alguns casos, de maneira impositiva e desordenada, deverá permanecer e ser adotado com mais frequência e intensidade no futuro. O artigo 6º da CLT, desde o início de sua vigência, já estabelecia que não havia distinção entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador e o executado no domicílio do empregado. Em 2011, a Lei nº 12.551 alterou a redação original do referido artigo e incluiu a hipótese do trabalho exercido por meios telemáticos e informatizados.

A Lei n. 13.467/17, conhecida como Reforma Trabalhista, incluiu o Capítulo II-A à CLT, para definir as regras relativas à prestação de serviços pelo empregado em regime de teletrabalho.

O trabalho remoto foi então definido como a prestação de serviços preponderantemente realizada fora das dependências do empregador, com a utilização de tecnologias de informação e de comunicação. A lei previu a necessidade de contrato escrito e a possibilidade de alteração do regime presencial para o virtual, mediante acordo firmado entre as partes.

Apesar da necessidade de investimento, para garantir a qualidade da prestação dos serviços remotos e impedir prejuízos físicos e mentais aos trabalhadores, em regra, os benefícios para as empresas são grandes. Já, as vantagens para os trabalhadores não estão tão claras assim. Só o tempo irá dizer.

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