ARTIGO

Aprendizados e desafios para a educação

''A sociedade brasileira já está convencida de que, sem ciência, tecnologia e educação, não podemos superar as dificuldades e promover a tão necessária transformação social''

Correio Braziliense
postado em 25/12/2020 06:00

Márcia Abrahão Moura
Reitora da Universidade de Brasília (UnB) 


O ano de 2020 se encerra como um dos mais atípicos de nossos tempos. As instituições buscaram novas formas de cumprir seu papel na sociedade, em meio a tantas incertezas e notícias tristes. As universidades reafirmaram a importância da educação, da ciência e do pensamento crítico — cruciais para o enfrentamento de uma doença ainda tão misteriosa. Na Universidade de Brasília (UnB), somamos aprendizados e conquistas valiosas.

Posso afirmar, com orgulho, que nos tornamos peça fundamental no combate à pandemia. Nossos especialistas se dedicaram a fazer análises, explicar para a população expressões como “transmissão comunitária” e “fase de incubação”, além de detalhar, a todo momento e com a ajuda da imprensa, as medidas preventivas e as características do vírus. Dentro da UnB, ajudaram a estabelecer protocolos de cuidado e uma rede de vigilância ativa da saúde dos que permaneceram em atividades presenciais essenciais.

Também estivemos na linha de frente com o atendimento no Hospital Universitário (HUB), que integra a rede de saúde pública do Distrito Federal desde 2017. Disponibilizamos 20 leitos de UTI e 20 de enfermaria para atendimento exclusivo de pacientes com covid-19 e oferecemos leitos de retaguarda, para receber pacientes com outras doenças.

Mesmo com a interrupção das atividades de ensino presenciais em março, dezenas de iniciativas surgiram no âmbito da pesquisa, da inovação e da extensão. Hoje, nosso portfólio conta com quase 200 projetos de combate à covid-19, que envolvem desde o estudo de medicamentos até a criação de respiradores de baixo custo, além de aspectos sociais, econômicos e ambientais da pandemia. Participamos, ainda, do estudo da eficácia da vacina CoronaVac, em parceria com o Instituto Butantan.

Em agosto, retomamos o calendário acadêmico, lançando mão do ensino 100% remoto pela primeira vez em nossa história, apesar de já ofertarmos cursos de graduação a distância para todo o Brasil há mais de 10 anos. Mesmo sem as condições ideais, o saldo foi positivo. Conseguimos fazer o semestre de maneira integral. As adaptações de regras acadêmicas garantiram que todos passassem por este momento da melhor maneira possível, com o mínimo de perdas pedagógicas.

Levando em consideração uma comunidade de mais de 50 mil pessoas, preparamos a retomada. Fizemos raio X inédito. Além de apontar quantos e quem eram os estudantes que precisariam de apoio tecnológico, outros dados interessantes surgiram. Por exemplo: 30% dos professores tinham conhecimento péssimo ou ruim do Moodle, a principal ferramenta virtual de ensino e aprendizagem da UnB. A pesquisa revelou, ainda, que mais de 70% dos estudantes vêm à universidade em transporte público — aspecto importante para as próximas fases do nosso plano de retomada.

Na volta das atividades letivas, a comunidade se irmanou de maneira comovente. Recebi relatos emocionantes de apoio mútuo entre professores, estudantes e técnicos. As oficinas de Moodle atraíram 1,3 mil docentes. Cada estudante fez uma média de 4,5 disciplinas neste período. Em semestres anteriores (sem pandemia), a média era de 4,9. Na pós-graduação, mais de 700 defesas de mestrado e doutorado foram realizadas on-line. Atividades administrativas também ocorreram de forma remota. O próximo semestre (2º/2020) também será assim, com empenho e dedicação.

Entretanto, as incertezas não se restringem ao cenário epidemiológico. Temos à frente a questão orçamentária, que aflige todas as universidades federais. Em 2014, o orçamento discricionário das universidades somava R$ 11,4 bilhões. Para 2021, a Proposta da Lei de Diretrizes Orçamentárias, ainda não votada pelo Congresso, traz menos de R$ 7 bilhões. E esses são recursos para custeio e investimentos. Incluem contas de água, luz, internet, segurança, limpeza, compra de livros e melhorias e adaptações de infraestrutura.

O andamento das atividades letivas é outro desafio. Será preciso buscar formas de garantir a assistência estudantil, com inclusão digital, e a realização de atividades práticas e de campo, para dar andamento ao fluxo curricular de muitos cursos. A evolução do cenário epidemiológico e o andamento de um plano de vacinação são importantes para que possamos dar início a algum tipo de presencialidade, quando for possível.

Por fim, cabe mencionar a necessária estabilidade institucional, com o pleno exercício da autonomia universitária, prevista na Constituição. A sociedade brasileira já está convencida de que, sem ciência, tecnologia e educação, não podemos superar as dificuldades e promover a tão necessária transformação social. Uma coisa é certa: teremos cada vez mais convergência entre o ensino presencial e a distância nas instituições de ensino, de forma a incorporar o aprendizado de 2020, com ganho de qualidade. Na UnB, seja como for, seguiremos comprometidos com a busca e a disseminação do conhecimento, ao lado da população do DF e do Brasil.

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