ARTIGO

Um presidente para chamar de seu

2021 é o ano de mostrar a que veio. 2022 será o ano eleitoral do "vale-tudo". Dois anos se passaram e não vimos nada de novo, a não ser brigas, desentendimentos, nenhuma reforma

Sacha Calmon*
postado em 03/01/2021 07:19 / atualizado em 03/01/2021 07:20

Diga-me, mídia minha, se haverá presidente pior do que o meu? É inacreditável o que se passa neste país. O carroção não anda, o país não cresce, mas, dentro da carroça, é uma brigalhada sem fim. É só ver o que se deu com Álvaro Antônio demitido após briga de foice com a Secretaria de Governo. Ele é lá do Barreiro, Belo Horizonte, era o único mineiro no desgoverno do circense Bolsonaro. Eram velhos amigos do “baixo clero”.

Segundo Rodrigo Maia, “o governo está desesperado para tomar conta da Presidência da Câmara e desorganizar a agenda ambiental, flexibilizar a venda de armas e tocar a pauta de costumes”. É dizer: limitar as hipóteses de aborto e ir contra os gays, lésbicas e simpatizantes. Bem, as pessoas nascem assim, não se tornam! Bolsonaro quer ser Deus e distinguir as pessoas, segundo seus critérios do bem e do mal. Além disso, tudo tem uma ideia de Deus de curso primário de escolas religiosas, um Deus de meter medo.

O cronista Luiz Carlos Azedo, do Correio, discorre bem: “A pauta da Câmara é o ponto de partida para a agenda de Bolsonaro, cujo eixo é o desmonte da legislação relativa aos direitos humanos e ao meio ambiente, e dos instrumentos de controle institucional da sociedade sobre o Executivo. Para levar adiante muitas de suas propostas, o presidente da República precisa do apoio do presidente da Câmara. Quando Maia diz que o Palácio do Planalto está jogando pesado, isso significa que não está economizando cargos e verbas para obter apoio parlamentar, o tradicional toma lá dá cá”, priorizando o Centrão, no qual estão alguns corruptos bem conhecidos.

Bolsonaro é igual aos antigos políticos. No seu caso, é um falso messias e o é literalmente, pois a falsidade e o fingimento começam já no nome que lhe deram. É Jair (profeta) e Messias (redentor hebraico) em que pese seu eleitorado evangélico. Os católicos que se cuidem. Onde está a CNBB?

Para um que chegou a presidente bradando contra a política, depois de mamar nas tetas do Poder Legislativo — em companhia de Álvaro Antônio — do “baixo clero”, ora demitido, por 27 anos, é ser muito “cara de pau” dizer-se um “renovador”. (Resta saber do quê, pois não inova, mas repete todos os defeitos do nosso mundo político).

É ver o que significa em termos de cargos e ilustração a sua base de sustentação na Câmara dos Deputados, o chamado Centrão a receber cargos e sinecuras, como sempre ocorreu nas “repúblicas” de Lula a Bolsonaro, supostos renovadores da política nacional (duas grandes decepções). Mas, Bolsonaro é pior. Grita franqueza e respira hipocrisia e ainda exerce a violência por fora, segundo se comenta, o que reluto em acreditar, pois não vi nenhum ato dessa natureza. Vamos deixar isso de lado, por ora.

O demitido, Marcelo Álvaro Antônio, foi eleito deputado federal pelo PSL. Esteve, antes mesmo de ser ministro, indiciado pela Polícia Federal e foi denunciado pelo Ministério Público Eleitoral de Minas Gerais por crimes relacionados ao lançamento de candidaturas de “fachada” do PSL que o elegeu juntamente com Bolsonaro em 2018. A “meta optata” desses crimes era lançar na cota das mulheres candidatas (laranjas) com o fito de se apossar de cotas do fundo público de campanha. Álvaro Antônio era o presidente estadual do partido (lé com lé, cré com cré). O PSL fez isso de caso pensado no Brasil inteiro (corrupção eleitoral).

A afinidade do deputado do PSL e ministro de Bolsonaro, amigo íntimo do mesmo, desde o Congresso e durante a campanha além do convívio, nesses dois anos de governo, fez com que o mesmo, fiado nos atos e segredos em comum, atacasse duramente o general incumbido da articulação política do governo, o que lhe rendeu a demissão. Foi uma briga de cachorro grande e terá desdobramentos dentro do Congresso Nacional, que, até o presente momento, não se deixou ainda enredar pelo Centrão, oportunista, com um bom número de parlamentares venais. Vamos ver na era pós-Maia o que vai ocorrer.

Seja lá como for, os focos políticos estarão voltados para os nomes que conduzirão o Senado e a Câmara dos Deputados na segunda metade da administração de Bolsonaro. Conheceremos a cara definitiva do governo. Na Câmara, Bolsonaro quer Arthur Lira, de Alagoas, com um balaio nas costas de denúncias por crimes e desvios de verbas.

2021 é o ano de mostrar a que veio. 2022 será o ano eleitoral do “vale-tudo”. Dois anos se passaram e não vimos nada de novo, a não ser brigas, desentendimentos, nenhuma reforma. Merecemos um tempo claro e solar, neste gigante eternamente adormecido em berço esplendido. O som aqui ora é de escola de samba, ora de paródia militar. Depois, continuará tudo como era antes no quartel de Abrantes? Duvido!

*Advogado

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