SAÚDE

Prêmio Nobel de Medicina

''Alguém já se perguntou por que não temos um único brasileiro ou instituição nacional medalhados com o Prêmio Nobel?''

Correio Braziliense
postado em 13/01/2021 06:00 / atualizado em 13/01/2021 08:28
 (crédito: Gomez)
(crédito: Gomez)

ALMIR PAZZIANOTTO PINTO
Advogado. Foi ministro do Trabalho e presidente do Tribunal Superior do Trabalho 

Alguém já se perguntou por que não temos um único brasileiro ou instituição nacional medalhados com o Prêmio Nobel? A explicação talvez esteja na frase de Nelson Rodrigues, para quem o brasileiro sofre do “complexo de vira-latas”, sentimento “de inferioridade que se coloca, voluntariamente, em face do resto do mundo”.

O Prêmio Nobel resultou do desejo manifestado pelo cientista sueco, inventor da dinamite, Alfred Nobel (1833-1896), em testamento. Determinou aos herdeiros que organizassem fundação destinada a premiar pessoas ou instituições que mais houvessem contribuído, no ano imediatamente anterior ao da premiação, para o desenvolvimento da humanidade nas áreas da Química, Literatura, Paz, Física, Fisiologia e Medicina. O prêmio foi concedido pela primeira vez em 1901. Em 1968, foi instituído o Prêmio de Ciências Econômicas, conhecido como Prêmio Nobel de Economia.

O primeiro e talvez único cientista brasileiro lembrado para o Prêmio Nobel foi o pernambucano Josué de Castro, médico, nutrólogo, cientista social, escritor. Entre os livros que nos deixou se destaca Geografia da Fome, publicado em 1946. Em 1960, Peter Brian Medawar, nascido brasileiro, mas criado na Inglaterra, recebeu o Prêmio Nobel de Fisiologia e Medicina. O Brasil, todavia, não figura na relação dos países merecedores da distinção porque o premiado teve a nacionalidade brasileira cassada ao se negar à prestação do serviço militar.

Desde a instituição, o Prêmio Nobel foi concedido 603 vezes a 902 pessoas e organizações, alguns mais de uma vez. O nosso jejum se torna mais constrangedor ao examinarmos a relação dos países que tiveram filhos ou instituições premiadas. Argentina o recebeu cinco vezes: Carlos Saavedra Lamas e Adolfo Perez Esquivel foram distinguidos com o Prêmio Nobel da Paz em 1936 e 1980. Bernardo Alberto Houssay, Luis Frederico Leloir e Cesar Milstein com o Prêmio Nobel de Fisiologia e Medicina em 1947, 1970 e 1984, respectivamente. Os chilenos Pablo Neruda e Gabriela Mistral foram premiados pela obra literária em 1945 e 1971. Países menores, menos conhecidos e economicamente pobres foram galardoados, como são os caso de Bangladesh, Azerbaijão, Albânia, Birmânia.

Com a imagem comprometida pela miséria de grande parcela da população, elevado índice de desemprego e, sobretudo, pela acelerada devastação da Amazônia, as pesquisas da vacina para o combate à covid-19 abrem a oportunidade para melhorar a imagem do país no exterior e reivindicar o Prêmio Nobel de Fisiologia e Medicina para o Instituto Butantan, sediado em São Paulo e a Fundação Oswaldo Cruz — Fiocruz, no Rio de Janeiro.

Aos céticos, afoitos e atacados pelo “complexo de vira-latas”, registro que o Instituto Butantã e a Fundação Oswaldo Cruz são instituições além de centenárias. O primeiro nasceu como modesto laboratório em 1898, dedicado ao combate do surto de peste bubônica que se propagava a partir do porto de Santos. Em 1901, foi reconhecido como instituição autônoma sob a denominação de Instituto Serumtherápico, dirigido pelo cientista Vital Brazil (1865-1950). Com Adolfo Lutz e Emílio Ribas, foi ele um dos responsáveis pelo desenvolvimento de soros antipestosos e antiofídicos, o que lhe valeu renome internacional.

Oswaldo Cruz (1872-1917), médico sanitarista, bacteriologista, epidemiologista, dedicou a vida ao conhecimento das moléstias tropicais e da medicina experimental. A Fundação Oswaldo Cruz tem origem no início do século passado com a criação do Instituto Soroterápico Federal em 25/5/1900, voltado à produção de soros e vacinas contra a peste. Em dezembro de 1907, passou a se denominar Instituto de Patologia Experimental de Manguinhos e, em março de 1918, Instituto Oswaldo Cruz, em homenagem ao criador falecido no ano anterior.

A campanha para o reconhecimento do relevante papel desempenhado por ambas as instituições, há mais de 100 anos, está lançada nas páginas do Correio Braziliense. Compete ao governo federal, aos governos dos estados de São Paulo e do Rio de Janeiro, às instituições científicas e culturais, à imprensa de maneira geral, levarem-na adiante.

Ao tomar conhecimento da história do Instituto Butantã e da Fundação Oswaldo Cruz, como instituições científicas sem fins lucrativos, a Academia Real de Ciências da Suécia deverá levar em conta o relevante papel desenvolvido em 2020 no combate à pandemia do novo coronavírus. Como, aliás, já o faziam no século passado combatendo moléstias epidêmicas. 

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