Em julgamento concluído na última quinta-feira, o Supremo Tribunal Federal decidiu que o direito ao esquecimento não é compatível com a Constituição do país. Dos 11 ministros da corte, nove entenderam que a prerrogativa de “não ser lembrado” em função de determinado acontecimento fere a liberdade de expressão e pode até interferir na história; um votou pelo reconhecimento do direito (Edson Fachin) e outro declarou-se impedido (Luís Roberto Barroso). É amplo e conflitante o debate envolvendo a liberdade de expressão e a recorrente tentativa de barrar a divulgação de determinados fatos. Por isso, o recurso extraordinário julgado pelo STF é tão emblemático e, de agora em diante, terá repercussão sobre todos os processos semelhantes.
Na raiz da questão desse caso específico, está um tipo de crime que estarreceu o país em 1958 e que até hoje se repete, para vergonha de toda a sociedade: o assassinato de mulheres cometido, geralmente, por ex ou atual companheiro. No Brasil, todos os dias, são registrados pelo menos três feminicídios, nomenclatura que não existia na época em que Aída Cury foi morta. Vítima de uma tentativa de estupro, a jovem de 18 anos foi jogada de um terraço em Copacabana, no Rio de Janeiro, numa trama para tentar levar as pessoas a acreditarem que a jovem de 18 anos teria cometido suicídio.
O caso foi parar no Supremo porque familiares de Aída Curi entraram na Justiça, pleiteando o direito ao esquecimento e indenização, em decorrência de reportagem em que a TV Globo reconstituiu o crime. A família tinha pedido para que o trabalho não fosse ao ar. A emissora o considerou de interesse público e o exibiu. O processo foi parar no STF depois de passar por diversas instâncias do Judiciário. Na mais alta corte de Justiça do país, a maioria dos ministros entendeu que o direito de não ser lembrado configura censura prévia, implica cerceamento à liberdade de expressão e pode até interferir na história do país.
“É incompatível com a Constituição a ideia de um direito ao esquecimento, assim entendido como o poder de obstar, em razão da passagem do tempo, a divulgação de fatos ou dados verídicos e licitamente obtidos e publicados em meios de comunicação social, analógicos ou digitais”, destaca a tese aprovada pelo plenário do Supremo. Apesar da repercussão geral, advogados criminalistas e juristas dizem que o direito ao esquecimento não está pacificado. Ainda vem muita discussão pela frente.
De fato, o próprio texto da decisão do STF faz essa ressalva. “Eventuais excessos ou abusos no exercício da liberdade de expressão e de informação devem ser analisados caso a caso, a partir de parâmetros constitucionais – especialmente relativos à proteção da honra, da imagem, da privacidade e da personalidade em geral – e as expressas e específicas previsões legais nos âmbitos penal e cível”, entenderam os ministros. O mais importante, até aqui, é que o direito de informar, com responsabilidade e precisão, está preservado no Brasil. Sem restrições.
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