Visão do Correio

Um ano de erros em série

Correio Braziliense
postado em 26/02/2021 06:00

Quem poderia imaginar que um ano depois do primeiro caso de covid-19 o Brasil estaria na situação lamentável em que se encontra: chorando 250 mil vidas perdidas numa pandemia que parece não ter fim? A luz no fim do túnel até pode ser vista, mas está tão distante de nós, brasileiros, que não sabemos quanto tempo ainda temos de percorrer para acordar deste pesadelo.

E por que vivemos esta tragédia? Por uma sucessão de erros que começou nos primeiros momentos da pandemia e foi se multiplicando, tal e qual um vírus. Erros daqueles que deveriam estar à frente na luta contra a doença, que deveriam guiar a população para um porto seguro, mas que acabaram por abandoná-la num mar aberto, sem boias ou coletes salva-vidas.

O primeiro erro — e talvez a mãe de todos os outros que vieram em seguida — foi a politização do enfrentamento à covid-19. O combate à doença deveria ter sido estritamente técnico, baseado na ciência, mas não foi o que aconteceu. O presidente Jair Bolsonaro preferiu transformar a saúde num campo de batalha política, em que importava mais derrotar um potencial futuro adversário nas urnas do que o inimigo invisível.

Foram muitas decisões e posições equivocadas. Bolsonaro minimizou a gravidade da covid-19, chamou-a de “gripezinha”, fez pouco caso das mortes — “E daí?” —, deu péssimos exemplos que acabaram por incentivar aglomerações pelo país e o não uso de máscaras, derrubou ministros que não rezavam pela sua cartilha ou que lhe faziam sombra, deixou de comprar vacinas de laboratórios no momento adequado e, como se não bastasse, zombou da eficácia da vacina CoronaVac, desenvolvida pela farmacêutica chinesa Sinovac em parceria com o Instituto Butantan, de São Paulo, do governador João Doria.

O cenário resultante de tantos desacertos é o que vemos hoje, um ano depois do primeiro caso: vamos entrar no terceiro mês do ano e o Brasil não conseguiu vacinar nem 3% da sua população. Até agora estão imunizados apenas 6 milhões de brasileiros, de uma população de 210 milhões. Estamos há mais de um mês com média móvel diária acima de 1 mil mortes, com dezenas de milhares de casos todos os dias, passando de 10 milhões desde o início da pandemia. Enquanto subimos o morro dos gráficos de casos e óbitos, olhamos pela janela e assistimos a muitos países conseguindo reduzir o número de infectados e mortos pela doença.

Sem saúde, a economia também definha: empresas fecharam, desemprego aumentou, governo deixou de arrecadar e também se viu obrigado a lançar mão de auxílio emergencial à população mais pobre. Auxílio que deve ser estendido por apenas mais dois meses. E aí vem a pergunta: como vai ser depois? Sem vacina suficiente para imunizar a população nesse período, dificilmente a economia vai se recuperar e os empregos vão ser retomados.

Mas nada é tão ruim que não possa piorar na área da saúde neste Brasil. E para não piorar, veio na hora certa a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de permitir que estados e municípios importem vacinas sem depender do Ministério da Saúde. Resta saber se prefeituras e governos estaduais terão dinheiro para essa empreitada e — o principal — se laboratórios terão doses suficientes para entregar, diante de uma demanda mundial pelo medicamento.

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