Visão do Correio

Reação inoportuna

Correio Braziliense
postado em 28/02/2021 20:54

No afã de dar uma resposta rápida ao Supremo Tribunal Federal, que enviou para a cadeia o deputado bolsonarista Daniel Silveira (PSL-RJ), em 16 de fevereiro, a Câmara dos Deputados atropelou ritos constitucionais e regimentais, para tentar aprovar a proposta de emenda constitucional, batizada de PEC da imunidade. O texto blinda os parlamentares da prisão, exceto quando flagrados em crimes inafiançáveis previstos na Constituição, e sublima o corporativismo. Em live, veiculada nas redes sociais, Silveira atacou ministros da corte, com ameaças e expressões chulas, fez apologia da reedição do AI-5, ato institucional mais cruel da ditadura militar, e defendeu o fim do estado democrático de direito, além de instigar conflito entre Judiciário e Forças Armadas.

O líder do governo na Câmara, deputado Ricardo Barros, admitiu que a PEC era uma reação à decisão do Supremo de determinar a prisão do aliado do Planalto. Se aprovada, a proposta limitará o alcance da Justiça às infrações penais inafiançáveis estabelecidas pela Constituição Federal. Por enquanto, a iniciativa não prosperou. O presidente da Câmara, Arthur Lira, se viu obrigado, por críticas de deputados, senadores e repercussão no meio jurídico e na opinião pública, a suspender a votação, a toque de caixa, da emenda, rotulada por deputados como “PEC da Impunidade”, que blinda parlamentares de ações judiciais, por crimes descritos pelo Código Penal e em outros marcos legais. Uma regalia descabida e repulsiva, seja pelo motivo, seja pelo momento caótico vivenciado pelo país, em decorrência do agravamento da crise sanitária, causada pelo novo coronavírus.

Os parlamentares formam uma casta privilegiada da sociedade brasileira, a começar pelos rendimentos mensais e benefícios incompatíveis com a realidade socioeconômica da maioria dos brasileiros. O Brasil tem o segundo congresso mais caro do planeta, com gastos anuais de R$ 10,4 bilhões, atrás apenas dos Estados Unidos, a maior potência econômica do mundo. Na reforma administrativa, apenas o Executivo deverá ter gastos reduzidos. Judiciário e Legislativo serão poupados.

Inquestionável a dissonância entre o Congresso Nacional e os anseios da população. Em dezembro de 2019 — uma das últimas pesquisas do Datafolha sobre o desempenho do parlamento — 45% da população reprovava a atuação de deputados e senadores, sinalizando que a renovação ocorrida nas eleições de 2018 frustrou os eleitores. Em meio à pandemia, que eclodiu no início do ano passado, o trabalho do Legislativo seguiu insatisfatório para grande parte dos brasileiros, exceto quanto à aprovação de um conjunto de medidas que viabilizaram a criação do auxílio emergencial. O dinheiro beneficiou cerca de 60 milhões de brasileiros em situação de vulnerabilidade e fortemente afetados pela disseminação do coronavírus.

Impõem-se aos parlamentares, como representantes da sociedade, ações voltadas aos interesses coletivos, sobretudo diante da dramática situação vivenciada pelo país, açoitado pela tragédia sanitária, sem que haja imunizantes para conter a alta mortalidade pela covid-19. Impõe-se, igualmente, a aprovação de projetos que retirem do limbo os quase 14 milhões de desempregados, os milhões de indigentes sociais, entre outras iniciativas necessárias para o país superar a adversidade do momento e voltar a ter crescimento econômico.

É inadequada a discussão e aprovação de medidas protetivas aos que desonram as prerrogativas parlamentares, seja por cometimento de crimes, seja por total desconexão com os princípios da harmonia entre os poderes republicanos, os preceitos constitucionais e a democracia.

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Eu tive covid

Como acontece sempre, eu entro em férias no começo de um novo ano. 2021 não foi diferente. Escolhi o litoral catarinense, onde tenho parentes que me acolhem bem. Como gosto de andar em bando, chamei dois sobrinhos-netos, Felipe e José Francisco. Eu viajei sozinha, eles apareceram cada um num dia. Por precaução, pedi a um médico amigo orientações de prevenção contra a peste.

Dois voos foram necessários para chegar à Floripa. O Aeroporto Viracopos (que já foi muito famoso na crônica política) em tempos de pandemia é uma zorra! Muita, muita gente. Não havia lugar nas lanchonetes. Caminhei bastante até encontrar uma mesa. Comi meu lanche (a empresa aérea oferece apenas um minienvelope de álcool) e corri até achar a outra asa do próximo embarque.

Imenso e confortável é o novo aeroporto de Florianópolis. Numa bela tarde de sol (depois se viu que foi talvez a única do mês), fui recebida pelos primos Waldez e Alicia, que há sete meses trocaram o endereço de Canoas (RS) por Garopaba (SC), antiga vila de pescadores, que deu origem a uma charmosa cidade de praia, hoje com quase 25 mil habitantes.

Nossa primeira investida foi numa cantina, comandada por um jovem chef italiano que acabara de inaugurar a casa, ainda sem vinho. Éramos três comensais e cada um escolheu um molho, o meu gorgonzola sobre fettuccinne.

Durante a noite, uma explosão de dor no abdômen entrecortada com diarreia. Nunca tinha tido aquilo e quando passou, já ao amanhecer, atribuí a alguma bactéria que tivesse se alojado no queijo. Algumas noites seguintes, tive uma crise de dor na coluna, daquelas que analgésico não resolve. Até que chegou Felipe e quatro dias mais tarde se queixou de indisposição. Conseguimos agendar um teste na Farmácia São João, no caminho do Rosa, e deu positivo! Na mesma segunda-feira, 25 de janeiro, nos submetemos todos à averiguação pela narina da presença do antígeno de covid-19 e, com exceção do festeiro José Francisco (merece um estudo à parte) testamos positivo. Pra mim, foi um choque, não tinha o que dizer, nem fazer.

Imediatamente informado, o pai de Felipe, que é coordenador da força-tarefa do MPDFT de fiscalização do protocolo de segurança contra covid-19, nos colocou em contato com a médica de Brasília Silvia Marchant Gomes, que nos orientou por áudio como proceder e tomar um monte de medicação. Nós quatro nos mantivemos isolados em casa. Felipe recebeu a visita dos pais, que se alojaram numa pousada próxima e acompanharam a evolução da doença até resgatar o filho.

Quando a doutora sentenciou “vocês não infectam mais ninguém; podem fazer o teste que acusará doença passada”, corremos outra vez à Panvel. E dito e feito: estávamos livre. No dia 3 de fevereiro, eu me despedia da bela e Santa Catarina, sem ter usufruído de suas praias, mas salvos, graças a Deus, todos nós quatro, no aguardo da vacina que, um dia virá para todos.

Desabafo

>> Pode até não mudar a situação, mas altera sua disposição

Quando você ouvir o ministro falar que está cortando “gastos”, chore; ele está tirando dinheiro do SUS, da educação básica, da proteção ao meio ambiente, da assistência às pessoas com deficiência, dos idosos, das crianças.
Joaquim Antunes de Carvalho — Asa Norte


O presidente diz que fechar o comércio significa desemprego em massa. Se ignorarmos a pandemia, vem a morte. O que é pior?
Fernando Moreira — Águas Claras


O arranjo parlamentar da impunidade é tão convincente quanto a logística do general do Ministério da Saúde.
Eduardo Pereira — Jardim Botânico


O lockdown em Brasília causou um racha entre Bolsonaro e Ibaneis. Melhor não convidá-los para a mesma reunião.
Ricardo Amâncio — Guará


Os cientistas deveriam estudar também os efeitos da covid-19 no cérebro das pessoas curadas. Há fortes evidências de que os neurônios do nosso presidente foram todos destruídos pela doença.
Fábio Venturoli — Goiânia (GO)

 

 

>> Sr. Redator

Vacina, já

A maioria dos brasileiros tem acesso ao noticiário de tevê, rádio e jornais. Tem conhecimento sobre os danos da covid-19. Quem consegue escapar da doença, guardará uma sequela para não a esquecer jamais. Assisto aos movimentos de empresários revoltados com o lockdown, o que representa perda de faturamento e lucro. A epidemia trouxe perdas para todo o mundo, principalmente de vidas, que o dinheiro não ressuscita. Será que é impossível passar por momentos de dificuldades, vencer o vírus e depois recuperar as perdas? A vida vale menos que os lucros? Por que não fazer um grande sacrifício para impedir que esse vírus avassalador siga produzindo desgraças na vida de todos? Hoje, paga-se o alto preço pela falta de compromisso do governo federal e asseclas com a saúde. Quem cumpriu e cumpre a quarentena, o isolamento social, as regras de higiene e de proteção (uso de máscaras, lavagem constante das mãos ou uso de álcool 70ºC) foi chamado de “maricas” e “frouxos”. Muitos valentões que comungaram do pensamento negacionista e próprio de sociopatas encontram-se mortos ou com danos físicos e mentais irrecuperáveis. Vale a pena arriscar a própria vida e colocar a do próximo em risco? Em vez de cobrar a suspensão do lockdown, por que não exigir dos governantes as vacinas? É obrigação do poder público garantir a saúde da população. A lógica e o bom senso recomendam que cuidemos da vida, para se ter força para reconquistar emprego, dinheiro e lucro. E para isso, vamos gritar: Vacina, já!
» Arthur de Castro, Asa Sul


» A fim de evitar a variação com decretos do “abre e fecha”, basta que o povo atenda às orientações dos médicos. O comércio pode funcionar como querem os comerciantes, que reclamam do governador. A população deve evitar ir às compras que podem esperar. Indispensáveis por ora, só comida e remédio. Sem consumidor, de que adianta o comércio aberto?
» Josuelina Carneiro, Asa Sul


» De norte a sul, no dia (26/2), em que completou-se um ano do primeiro caso de covid-19 no Brasil, o país registrou o pior número de mortos em 24 horas de toda a pandemia, foram 1.582 óbitos registrados em apenas um dia, com recorde também na média de mortes, que ficou em 1.150. Diferentemente da primeira onda, quando foi cada estado num tempo, surgiram efeitos sincronizados como eleição, festas de fim de ano e carnaval. Agora, tudo está explodindo ao mesmo tempo. Isso significa que não tem medicação, não tem como entubar, não vai dar para transferir de uma cidade para outra, não vai ter como transferir para lugar nenhum. A consequência do colapso da saúde é o colapso funerário. Se eliminar o genocídio indígena e a escravidão, é a maior tragédia do Brasil. A ausência de comando do governo federal é vergonhosa, incompetente e danosa. Eu tenho me perguntado muito: qual o valor da vida no Brasil? Que valor os políticos dão para a vida do cidadão? Ter de preservar a economia é não só uma falsidade econômica,como demonstra completa falta de empatia com a vida das pessoas. Os políticos são o primeiro componente, mas a sociedade também. Porque, quando alguém vai a uma festa clandestina, se aglomera numa balada, não compromete só sua saúde, mas a vida dos seus familiares, seus vizinhos e das pessoas que nem conhece. Nossa sociedade em algum momento perdeu a conexão com o quão irreparável é a vida. O Brasil precisa de um lockdown nacional, com uma campanha de comunicação, porque precisamos da colaboração maciça da população, que precisa acordar para a dimensão da nossa tragédia. Sem povo não tem economia, ninguém produz, ninguém consome. É inconcebível. Estamos diante de um prejuízo épico, incalculável, bíblico.
» Renato Mendes Prestes, Águas Claras


» Entre todas as medidas que estão sendo tomadas contra a proliferação do coronavírus, como evitar aglomerações, o uso obrigatório de máscara e reduzir horários de funcionamento de bares e restaurantes, a mais importante delas é a vacinação o mais rápido possível da população brasileira. Por isso não é admissível perder dois dias nessa importantíssima operação. Governador Ibaneis Rocha, por que suspender a vacinação aos sábados e domingos? Mais importante, nestes tempos de verdadeira guerra, é tomar medidas que ajudem a minorar esse verdadeiro morticínio, e não por acima disso dias de folga de funcionário público. Não dá para entender esse desperdício de dois dias de vacinação, deixando de beneficiar centenas ou milhares de pessoas. Lamentável!
» Paulo Molina Prates, Asa Norte

Charge

 (crédito: Kleber Sales/CB/D.A Press)
crédito: Kleber Sales/CB/D.A Press

Luta por medicação

Vivemos hoje uma situação sem precedentes no Brasil. Sim, estamos vivendo uma pandemia. Mas a ineficiência do sistema de saúde do país para receber uma sobrecarga na demanda é algo que muitos portadores de doenças raras vivem diariamente. A angústia, a falta de resposta e, por vezes, a desinformação e falta de conhecimento. Se, por um lado, a ciência avançou muito para possibilitar a chegada de novos medicamentos para tratar algumas doenças raras; por outro, ainda temos um entrave no âmbito regulatório que está impedindo que esses importantes avanços cheguem a quem mais precisa. É importante reconhecer o bom trabalho feito pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), sob o marco da Resolução 205/2017, que tem priorizado a aprovação de medicamentos para o tratamento de doenças raras. Porém, por outro lado, temos o entrave da aprovação do preço dos medicamentos, que passa por uma legislação de 2004, época que precede as inovações tecnológicas na proporção atual.

Veja, por exemplo, o caso da amiloidose, doença que acomete cerca de 5 mil pessoas no Brasil. O primeiro tratamento para essa doença chegou ao Brasil em 2012, após um importante trabalho de conscientização sobre a doença realizado pela Associação Brasileira de Paramiloidose (ABPar), com o apoio do Instituto Vidas Raras. Ter um medicamento para amiloidose no Sistema Único de Saúde (SUS) é muito bom, mas está longe de ser uma solução definitiva. Estamos passando hoje por um boom de tecnologia que trouxe muitos benefícios para os pacientes. Temos que ampliar o arsenal medicamentoso disponível ao paciente. No caso da amiloidose, vivemos hoje uma situação que exemplifica bem esse cenário.

O medicamento disponível hoje no SUS para o paciente com amiloidose atende apenas aqueles com grau 1, que é caracterizado por um paciente que ainda tem autonomia, ainda consegue cuidar de si mesmo sem ajuda. Consegue andar, se locomover. O tratamento disponível hoje é um estabilizador da doença. A partir do momento que a doença evolui, o tratamento para de fazer efeito. A entrada desse medicamento no SUS aconteceu, para muitas pessoas, quando elas estavam em estado mais avançado da doença. Ou seja, o medicamento nunca chegou a ser uma opção para elas. E essa falta de opção terapêutica faz com o paciente apresente declínio do quadro clínico, podendo chegar a óbito em poucos anos.

Quando só existe uma opção terapêutica, o governo gasta muito com um tratamento que não terá o benefício desejado. Pois muitos pacientes podem recorrer a esse medicamento como única opção, mas o tratamento não surtirá efeito. Ou, outro cenário, é ter um paciente que se recusa a interromper um tratamento que não funciona mais por medo de não ter outra opção. Em ambos os casos, do ponto de vista de saúde pública, há um gasto de verba que não traz o benefício esperado. Além de comprometer o orçamento público, isso acaba trazendo uma falsa esperança para o paciente e sua família, que ainda acredita que mesmo que não esteja tendo o benefício desejado, pelo menos está recebendo tratamento. Por vezes, até o médico recomenda a interrupção. Mas a família, por uma falta de opção, acaba insistindo em continuar o tratamento. Isso não é justo.

Existem outros dois novos tratamentos que foram aprovados pela Anvisa, no entanto, o processo de precificação deles está travado. Eles usam tecnologias distintas e atuam em etapas diferentes do mecanismo de ação da amiloidose, além de estarem aprovados para estágios mais avançados da doença.

Quando uma doença tem diversas opções terapêuticas, você terá todo o arsenal ao seu favor. Se esses novos medicamentos tivessem sido regularizados, nós poderíamos estar cada vez mais próximos de ter esse arsenal disponível para todos os pacientes que precisam.

Nosso apelo é que o governo apresse e entenda que é fundamental que essa regularização aconteça de forma mais célere. Hoje, esse processo está parado na Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED). Segundo a CMED, a partir do momento que já existe um medicamento para uma doença, os demais medicamentos passam a ser considerados concorrentes. No entanto, são tecnologias completamente diferentes. Com custos diferentes. Sem o entendimento da CMED das diferenças entre os tratamentos, a terapia não será acessível aos pacientes que mais precisam. Para esse paciente, caberá apenas um último recurso disponível: judicialização.

Isso é um retrocesso para o Brasil, para a saúde dos brasileiros e para todos que dependem do tratamento. Nosso pedido é que a CMED comece a olhar de forma diferenciada os diferentes. A legislação precisa acompanhar as inovações tecnológicas. Não se trata de uma crítica ao passado, mas um pedido para que o Ministério da Saúde se atualize no mesmo ritmo em que avançam a ciência e a tecnologia.

Shalom e até logo

Após quatro anos de serviços prestados como chefe de missão diplomática do Estado de Israel, estou deixando este apaixonante e importante país chamado Brasil. Após quatro anos de trabalho intenso, posso dizer que me sinto, de coração, parte deste imenso e lindo país. Em março de 2017, dei início as minhas funções junto à Embaixada de Israel em Brasília. Durante todo esse período, trabalhei incansavelmente para o fortalecimento e aprofundamento das relações bilaterais em diversas áreas. É difícil traduzir em palavras tudo o que vi, senti e aprendi percorrendo praticamente todo o país.

Durante minha trajetória, tive a grande honra de acompanhar a primeira visita ao Brasil do primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, e também acompanhar o presidente da República Federativa do Brasil, Jair Messias Bolsonaro, em sua primeira visita oficial a Israel, onde assinamos seis acordos nas áreas de defesa, serviços aéreos, prevenção e combate ao crime organizado, ciência e tecnologia. Também tivemos a abertura de um escritório de assuntos econômicos brasileiro na capital de Israel, Jerusalém. Esta mudança está contribuindo para aprimorar o comércio bilateral entre os países.

Com a reabertura do voo direto Brasil–Israel, facilitamos ainda mais o fluxo empresarial e a possibilidade de expandir parcerias. O voo também impulsionou o turismo de brasileiros para a Terra Santa. Recentemente, acompanhamos com entusiasmo os acordos históricos de paz e restabelecimento das relações diplomáticas com os Emirados Árabes Unidos, Bahrein, Sudão e o Marrocos, esta é uma prova de que com respeito e diálogo podemos escrever juntos um promissor capítulo da nossa história.

Foram quatros anos na realização de esforços para estreitar as relações entre Israel e o Brasil, principalmente por meio de importantes acordos de cooperação econômica e tecnológica, o último sendo o memorando de entendimento entre o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações do Brasil e o Parque de Ciências Carasso, localizado em Be’er Sheva. Uma parceria entre o governo brasileiro e a direção do parque para um projeto educativo de ciência e tecnologia que será implementado no estado do Ceará e que beneficiará muitas crianças e adolescentes da região.

Israel se orgulha de ter ajudado o Brasil em missões humanitárias, como no desastre de Brumadinho e no combate de incêndios na Amazônia. Durante esses quatro anos, enfrentamos também tempos de dificuldades com uma pandemia global que matou milhares de pessoas. Diante das graves necessidades que o povo do estado do Amazonas enfrentou, realizamos uma força-tarefa em parceria com a primeira-dama Michelle Bolsonaro e conseguimos reunir amigos das embaixadas do Reino do Bahrein e dos Emirados Árabes Unidos para a entrega de mais de 30 toneladas de alimentos para o povo amazonense.

A comunidade judaica brasileira tem um papel muito importante de apoio à Embaixada de Israel. Uma comunidade forte e muito atuante, que sempre se dispõe a participar e colaborar com nossas ações. Seria difícil nomear os muitos que nos ajudaram ao longo desses quatro anos. No campo diplomático, gostaria de fazer um agradecimento especial ao nosso cônsul geral de São Paulo Alon Lavi, que com dinamismo e entusiasmo atua como um grande parceiro do meu trabalho.

Há poucos dias, tive a honra de ser agraciado pelas mãos do chanceler Ernesto Araújo com a comenda da Ordem Nacional do Cruzeiro do Sul, no grau de Grã-Cruz, em razão do trabalho que fielmente me dediquei como embaixador de Israel no país. Estar à frente da Embaixada de Israel no Brasil foi certamente o meu maior desafio, mas também a maior satisfação da minha trajetória profissional.

Se eu pudesse definir em um único sentimento esses quatro anos seria gratidão! Gratidão pela oportunidade e confiança em mim depositada pelo meu país, a minha família pelo apoio e compreensão e, especialmente, gratidão por ter sido tão bem recebido pelo povo brasileiro e pela amizade e parceria com o presidente Jair Messias Bolsonaro, sua família e a todos que estiveram ao meu lado durante esta incrível jornada.

Juntos, Israel e Brasil construíram nos últimos anos uma relação sólida de amizade e que vem rendendo frutos. Agradeço ao Eterno, nosso Deus, por ter guiado e iluminado meu caminho durante toda a minha jornada.
Com amor e paz, shalom!

SIX e o choro em Brasília

 (crédito: Caio Gomez/CB/D.A Press)
crédito: Caio Gomez/CB/D.A Press

Quatro dedos. Seis nas mãos e nos pés. O fenômeno se chama polidactilia. Advogado por profissão, hedonista por opção. Tinha dois propósitos: trabalho e gandaia, na ordem. O trabalho garantia a esbórnia. O conheci em rodas de choro. Bem antes do Clube do Choro. Nas tocatas dos bares. Exímio instrumentista. Seu cavaco tocava diferente. Era o sexto dedo.

Setembro de 1977. Um grupo de chorões, em reunião no apartamento da professora Odette Ernest Dias, fundou o Clube do Choro de Brasília. Primeiro Presidente, Avena de Castro. Citarista de fama nacional. Six estava nesta histórica reunião. O choro toma vulto. Por intervenção de Paulo Romano, assessor, o governador do DF, Elmo Serejo, doa o vestiário do Centro de Convenções. Primeira sede. O choro decola.

Pelas tantas, Six se elege presidente do Clube. E segue seis anos consecutivos. Foi a Era de Ouro do choro. Fui seu vice. As tardes dos sábados mudaram. O must da boemia: Clube do Choro. Ouvir ou tocar. Brasília tinha um acervo de grandes artistas. Funcionários públicos viviam na Capital do Brasil. O regime militar consolidou Brasília. Se firmou como capital federal. E do Choro.

Jacob do Bandolim tinha dois fãs em Brasília: Six e Arnoldo Velloso. Médico neurologista e bandolinista. O Neuro-Bandolim, recém-chegado da Alemanha. Souberam da doença do ídolo e foram para o Rio de Janeiro. Dona Adília, sua esposa, estranhou a visita de dois médicos de Brasília: um neurologista, o outro ginecologista (Six). A panaceia do Velloso funcionou. Em dois dias, os três saíram para uma tocata nas Noites Cariocas. Jacob viveu seis meses em Brasília, morando na Chácara Estrela Dalva, de Velloso. Volta ao Rio e morre, dois meses depois. Infarto fulminante.

A gestão do Six, primeiro, a Velha Guarda: Pernambuco do Pandeiro, Luizinho e Nilo, Sax; Tio João, Trombone de Vara; Bide, Flauta; Odette, Flauta; Walcy, Pandeiro; Aquino, Clarinete. Bambas, mais novos: Evandro Barcellos e Marcelo Picolé, Cavaco; Valério, Violão de 6; Alencar e Carlinhos do 7 Cordas, Violão de 7; Kunka e Ismar Barreto, Surdo; Lício e Dolores, Flauta; Reco do Bandolim, Bandolim (atual Presidente do Clube), Dois de Ouro – José Américo, Violão 6 e seus filhos (com 5 e 7 anos): Hamilton, Cavaco e César, Violão de 6.

O Governo Federal criou um Programa Cultural. Grandes artistas percorriam o País. Six fez do Clube a segunda opção para quem subiu em Brasília. Sem atentar à cronologia: Família Rabello (Rafael, Violão 7; Luciana, Voz e Cavaco; Maria, Voz); Moraes Moreira, Acordeon; Armandinho, Guitarra Baiana; Daniela Spelman, Clarinete; Guinga, Violão 6; Renato Borghetti, Fole Gaúcho; Rogerinho, Violão 7; Henrique Cazé, Cavaco; Nilze, Cavaco; Paulo Moura, Clarinete; Altamiro Carrilho, Flauta e Flautim; Rossini Ferreira, Bandolim; Waldyr Azevedo, Cavaco; Copinha, Flauta; Klecius Caldas, Voz; Mario Lago, Voz; Yamandú Costa, Violão 7; Abel Ferreira, Sax; Zé da Velha e Silvério Pontes, Trombone de Vara e Trompete. Que me perdoem os não citados.

Lutou por uma causa por 20 anos. Quase U$ 1 milhão de dólares. Sua vida mudou. Aloprou. Testemunhei. Vinte para ganhar, três para gastar. Fez peripécias. Fretou um Navio Gaiola e desceu o Rio Amazonas de Manaus a Belém. Chorões animavam a viagem. Nos seus sessenta anos, um palco profissional de 120 m2, completo: som e luz. Em sua casa. Às suas expensas, como na viagem de Manaus, os principais chorões do Brasil. Passagem aérea, hospedagem para as famílias. E cachê. Três dias de festa. César Farias, violão de 6, pai de Paulinho da Viola, Klecius Caldas, Zé da Velha e Silvério Pontes, entre as celebridades. Marcos Melo testemunhou e participou deste e de outro evento com Yamandú Costa. Uma tocata, numa tarde comum. Six alugou o andar com palco de um bar. Levou ele e mais dois músicos. Na plateia, Marcos Melo, eu e uma das suas amigas. Um sinal e a moça subiu ao palco. Levantou a manga de camisa e aplicou uma injeção de insulina. A música não parou. As titulares sabiam aplicar injeção de insulina. Era mandatório.

Quando adoeceu, hiperferritinemia. Proibido de beber. Um martírio. Cumpriu sua sina. Sua doença nos aproximou ainda mais. Fins de tarde me convocava à sua casa para conversas. Servia-me uísque. Eu bebia, ele olhava. Morreu como viveu. Na farra. Seu velório foi uma festa. Colossal tocata. Até o corpo baixar na sepultura. Os chorões prestaram-lhe sua última homenagem. Era choro, com choro.

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