Alysson Paolinelli e a esperança do Nobel Brasileiro

O Prêmio Nobel é uma das condecorações de maior prestígio em todo o mundo, fruto de decisão do sueco Alfred Nobel, de que a maior parte da sua fortuna deveria ser destinada a reconhecer, anualmente, pessoas e organizações com contribuições destacadas à humanidade. A primeira premiação aconteceu em dezembro de 1901, cinco anos após sua morte, reconhecendo progressos na física, química, fisiologia ou medicina, literatura e paz. Em 1969, um outro prêmio na área de Ciências Econômicas foi estabelecido e passou a ser apresentado na cerimônia anual do prêmio.

Vários brasileiros foram lembrados através dos anos no concorrido processo de escolha dos agraciados. Apesar de o país ter estado constantemente na lista dos favoritos pela sua rica literatura, com gigantes como Carlos Drummond de Andrade e Jorge Amado, foi na física que um brasileiro esteve muito próximo de arrebatar o prêmio. O físico César Lattes participou, aos 23 anos de idade, da descoberta de uma partícula do núcleo dos átomos — o méson pi —, feito que rendeu a Cecil Powell, o autor principal do artigo que descreveu o feito, o Prêmio Nobel de Física, em 1950. Infelizmente, até 1960, o Comitê do Nobel só concedia o prêmio ao líder do grupo de pesquisa.

Além da literatura e da física, o Brasil foi também lembrado através da agricultura, com a agrônoma de origem tcheca, naturalizada brasileira, Johanna Dobereiner, indicada ao Prêmio Nobel de Química, em 1997, pelas suas contribuições ao desenvolvimento da agricultura tropical e à segurança alimentar global. Como pesquisadora da Embrapa, ela se dedicou ao estudo de bactérias capazes de captar o nitrogênio do ar e transformá-lo em compostos assimiláveis pelas plantas. Seus estudos permitiram a substituição de adubos químicos nitrogenados nas lavouras, com enormes impactos econômicos e ambientais.

E é por meio da agricultura que vemos reacender a esperança de um Prêmio Nobel ser finalmente concedido a um brasileiro. O agrônomo mineiro Alysson Paolinelli, nosso ministro da Agricultura entre 1974 e 1979, considerado o pai da moderna agricultura brasileira, foi indicado ao Prêmio Nobel da Paz em 2021. Caso esse sonho se concretize, Paolinelli terá seguido trajetória semelhante à de outro agrônomo ilustre, Norman Borlaug — Prêmio Nobel da Paz em 1970, principal responsável pela Revolução Verde, que na segunda metade do século 20 impulsionou a produção de alimentos pela introdução de variedades e práticas agrícolas modernas, que eliminaram o espectro da fome para milhões de pessoas em todo o mundo.

Borlaug, falecido em 2009, visitou o Brasil diversas vezes e se maravilhou com a revolução agrícola iniciada, aqui, por Paolinelli, nos anos 1970. Em suas andanças pelo mundo, ele não se cansava de dizer que via o Brasil como o palco da segunda Revolução Verde da humanidade, em especial, pela transformação dos cerrados, com seus solos improdutivos, pobres e ácidos, em uma das mais pujantes áreas agrícolas mundo. Alysson Paolinelli foi um dos principais arquitetos dessa transformação, promovendo, enquanto ministro da Agricultura, a expansão e o fortalecimento da pesquisa agropecuária e a disseminação de conhecimento e tecnologias adaptados aos trópicos, por meio da Embrapa, da Embrater e das universidades agrárias.

Um visionário, Paolinelli percebeu que um país continental como o Brasil demandava arrojados investimentos em expansão e modernização agrícola e que a superação dos nossos desafios se daria mais rapidamente com instituições fortalecidas, formação de recursos humanos, políticas públicas ousadas e cooperação internacional. A Revolução Agrícola lançada e liderada por ele produziu frutos extraordinários em pouco mais de quatro décadas. O Brasil dos anos 1970, marcado pela insegurança alimentar, obrigado a comprar lá fora um terço dos alimentos de que precisava, tornou-se um grande provedor de alimentos para o mundo, exportando para mais de 150 países e reduzindo quase à metade o custo da alimentação no orçamento dos brasileiros.

Aos 84 anos, Paolinelli segue mais ativo que nunca, colocando toda a sua experiência a serviço de mais uma grande revolução, centrada na ampliação do conhecimento dos biomas tropicais e no desenvolvimento de soluções tecnológicas que nos permitam usar os recursos naturais de forma inteligente e durável. Durável a ponto de alcançarmos 2050 capazes de atender sem apertos às projeções de crescimento na demanda global de alimentos. Uma revolução que já rende frutos e promete ampliar o protagonismo e a visibilidade do Brasil como promotor da segurança alimentar global, contribuindo ainda para a mitigação dos males ambientais que ameaçam o nosso futuro.

Ao lembrar sua extraordinária trajetória, Paolinelli costuma dizer que “o interior do Brasil já foi conhecido como ‘terras-de-fazer-longe’, ou terras que mais serviam para aumentar distâncias que para produzir progresso”. É seu jeito de lembrar o Brasil de pouco mais de quatro décadas atrás, país continental, onde colocar comida na mesa custava perto de 45% da renda das famílias. Faz, portanto, todo sentido que o nosso agrônomo mais ilustre, unanimemente reconhecido pelas extraordinárias contribuições à segurança alimentar global, seja um forte concorrente ao Prêmio Nobel da Paz. Como sabiamente confirma um dos líderes da sua indicação, o ex-ministro Roberto Rodrigues: “Paolinelli é o visionário da maior revolução agrícola tropical sustentável, um grande construtor da paz, pois alimento é paz, sustentabilidade é paz”.