Para um país que conviveu com taxas de inflação que chegaram a 80% ao mês — com preços sendo remarcados diariamente —, e que ao fim de duas décadas marcadas pela hiperinflação, quatro planos econômicos, duas mudanças de moeda e ainda não havia conseguido debelar o descontrole de preços, é inimaginável pensar em índices como a inflação de 6.821% ao ano em abril de 1990. Há quase 27 anos o Brasil não sabe mais o que é hiperinflação e mesmo que o ministro da Economia, Paulo Guedes, tenha dito no fim do ano passado que há risco de o país voltar a viver esse processo, a chance de que isso ocorra hoje é zero. E ele, com o cargo que ocupa, deveria ser o primeiro a dizer com que armas se pode evitar a escalada dos preços, que hoje, embora longe do descontrole dos tempos recentes, está se tornando um problema para cidadãos e empresas. O IPCA, inflação oficial, fechou fevereiro com alta de 0,86%, mais de três vezes superior à taxa de janeiro e a mais alta para o mês desde 2016.
Em 12 meses, o indicador encosta no teto da meta inflacionária para o ano, que é de 3,75% com margem de 1,5 ponto para menos (2,25%) ou para mais (5,25%). Ficou em 5,20%. E mais, na primeira prévia de março, o IGP-M, que mede a inflação no atacado, teve alta de 1,95% e, com isso, o acumulado em 12 meses passou de 28,17% para 29,83%. Esses índices devem acender a luz amarela no governo.
Os preços se aceleram no embalo dos sucessivos reajustes da gasolina e do óleo diesel nas refinarias. Apenas neste ano, registram altas acumuladas de 53% e 40%, respectivamente. Alta do dólar ante o real e a valorização das commodities agrícolas no mercado internacional completam a pressão sobre os preços hoje no Brasil. Longe de reivindicar intervenções esdrúxulas, como tabelamento, é preciso que o governo esteja atento para equilibrar as relações entre os agentes econômicos com medidas que equacionem distorções, como o fato de a Petrobras ter assegurada sua recomposição de custos enquanto a maior parte da iniciativa privada tem que sacrificar margens diante da impossibilidade de reajustar preços.
É louvável a iniciativa de se discutir a constituição de um fundo para amortizar a necessidade de reajustes nos preços nas refinarias. Esse fundo, a princípio constituído por recursos dos royalties e participações pagas ao governo provenientes de petróleo e gás, seria usado para eliminar a necessidade de reajustes em curto espaço de tempo em caso de alta do óleo no mercado internacional e do dólar. Além disso, parece urgente que o governo reveja sua política de estoques reguladores de alimentos, esvaziados nos últimos anos. Não é uma solução sem custo, mas evitaria aumentos expressivos do arroz e do feijão, presentes na refeição diária da maioria dos brasileiros. É mais do que pedir para produtores deixarem um pouco da produção no Brasil, como fez o presidente Jair Bolsonaro.
Outro problema que distorce a economia é o valor do dólar acima de R$ 5. Exportadores, em tese, lucram, mas importadores sofrem elevação expressiva de custos sem poder repassar para os preços. Afeta também os próprios exportadores, que trazem de fora máquinas e equipamentos e insumos para a produção. Entre quarta-feira e ontem, o Banco Central fez leilões de contratos de câmbio e colocou cerca de US$ 2 bilhões no mercado. A ação derrubou o dólar para R$ 5,543 na tarde de ontem. São medidas como essas que se espera do governo para tirar a pressão inflacionária dos ombros da sociedade. Sem intervenção, mas sem omissão.
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