Atualmente, a visibilidade dada às pessoas negras é pela sua cor de pele e pelos estigmas a ela agregados por uma sociedade que faz questão de reforçar tais discursos. É muito difícil ser ofertada visibilidade para essa população por conta de sua formação, competência e sua capacidade de contribuir profissionalmente no mercado das grandes indústrias e empresas de nosso país. Os números oficiais de algumas instituições de pesquisa são reveladores.
Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em novembro de 2019, apontam que negros e negras ainda estão longe de serem vistos em funções executivas. Existe um enorme abismo entre cargos de gerente, supervisor, coordenador, analistas e trainees, estes últimos, bases das carreiras executivas, a formação acadêmica e as funções de formação secundarista ou primaria que algumas pessoas negras acabam exercendo, para não ficarem fora do mercado de trabalho.
Mesmo com um percentual de 50,3% da população negra e parda com nível superior — é importante ressaltarmos que a qualificação, hoje é maior do que no passado — são as negras e os negros os que mais permanecem sem acesso ao mercado formal brasileiro. Estamos entre 66,1% e 64,2% de pessoas pretas e pardas, forçadas à desocupação e subutilização nos postos de trabalho. Tal realidade fica ainda mais gritante quando verificamos o setor informal: enquanto na população branca o índice de presença é de 34,6%, na negra, são 47,3%; uma amarga estatística.
Outro balizador, o da qualidade de vida, versa sobre a renda básica da população preta. Podemos dizer que há um reforço nessa desigualdade, evidenciando o racismo estrutural. Essa força maior se reflete na média salarial entre trabalhadores brancos e negros, com a mesma formação. Consta ao trabalhador branco, uma média salarial de R$ 2.795, em contraste com a média salarial do trabalhador de pele negra ou parda, que é de R$ 1.608. Entre os espaços de promoção, que são abertos nessas empresas, apenas 29,9% das pessoas negras e pardas ocupam tais espaços.
Para não ficar apenas em dados estatísticos, narro um episódio em que, mesmo com expertise em diversas áreas, e com um perfil de liderança que as empresas exigem, coordenando tanto nas esferas públicas quanto privadas diversos projetos, em muitas empresas, no processo de seleção, ouve-se repetir o mesmo discurso: “você tem um currículo muito rico, mas não está no perfil de que necessitamos”. O que me leva a refletir sobre qual é o meu perfil e se as especificações da seletiva se encaixam com minhas qualificações.
Em 2019, um levantamento do Instituto Ethos revelou que 85% das grandes empresas não possuem programas ou departamentos que incentivem a contratação de pessoas negras em cargos executivos no quadro de funcionários. Segundo um relatório da Why Diversity Matters — Por que uma Diversidade Importa — , realizado em 300 empresas do Canadá, Reino Unido, Estados Unidos, e América Latina, apenas nos Estados Unidos, para cada 10% de contratação de executivos, no perfil étnico racial, houve um aumento de 0,8% no lucro dessas empresas.
Resta a indagação: por que não são inserimos negros e negras nesse contexto? Por que uma boa parcela dessas empresas e indústrias possui um deficit nessas questões e não se debruça perante a temática racial no mercado de trabalho. Essa ausência de planejamentos e reestruturações, focados nesses conceitos, vão distanciando empresas e indústrias desse novo normal que vem se impondo merecidamente ao mercado.
Mas tentativas de aperfeiçoamento já estão presentes e trazem um ânimo. Mesmo que polêmico, com muita mídia envolvida, recentemente, acompanhamos o processo de trainee do Magazine Luiza, exclusivo para negros e negras. Empresas como a Ambev, a Bayer e a Natura também já contam com consultorias específicas para a inclusão dessa população em seus quadros. Em recente entrevista ao UOL, Yolanda Fordelone, economista da Econoweek, pontuou que são vários os aspectos positivos de empresas que adotam políticas de diversidade: diminuição de desigualdade, melhor compreensão da população e mais resultados.
Ainda é pouco. Podemos questionar empresários/as que já aplicam a inclusão racial para contratação: por onde se começam as mudanças e as readequações? Pelas empresas? Pelos gestores dessas empresas ou por meio de uma força maior que se avizinha? O Brasil precisa dessas respostas.
* É gestor em Recursos Humanos, com Especialização em Educação Integral, Cidadania e Inclusão Social pela UFRPE; estudante de MBA em Gestão de Negócios da USP; ex-secretário-adjunto de Igualdade Racial do Distrito Federal e ex-ouvidor Nacional do Ministério das Mulheres, Igualdade Racial e Direitos Humanos.
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