Ser preto e pobre neste país significa que, em caso de desaparecimento, a ocorrência na polícia não será feita de imediato, apenas no dia seguinte; que as investigações, quando começarem, vão ignorar evidência importante; que, mesmo diante da gravidade da situação, haverá pouca ou nenhuma reação da sociedade. Ainda que se trate de criança.
O caso dos três meninos de Belford Roxo, no Rio de Janeiro, mostra o preço que se paga por ter a cor e a condição social “erradas”. O desaparecimento de Lucas Matheus, 8 anos; Alexandre, 11 (completados no último dia 15); e Fernando Henrique, 11, completou três meses, sem solução. Em 27 de dezembro, eles saíram de casa para jogar bola e nunca mais voltaram.
Começava aí, o calvário das famílias, e o descaso do Estado com o sofrimento delas. No mesmo dia do desaparecimento, elas tentaram fazer o boletim de ocorrência, mas a polícia mandou que voltassem no dia seguinte para, só então, registrar o B.O. Uma perda de tempo irreparável. As buscas deveriam ter sido iniciadas imediatamente para aumentar as chances de localização, assim como a coleta de provas.
A Lei 13.812, de 16 de março de 2019, define, no Art. 3º, que “a busca e a localização de pessoas desaparecidas são consideradas prioridade com caráter de urgência pelo poder público”. A determinação de “prioridade” e “caráter de urgência” foi sumariamente ignorada no caso dos garotos.
As falhas não pararam por aí. No início deste mês, o Ministério Público do Rio de Janeiro encontrou imagens dos meninos andando por um bairro vizinho, o que se tornou a principal evidência da investigação. O conteúdo estava numa câmera de segurança que já tinha sido periciada pela Delegacia de Homicídios da Baixada Fluminense, mas policiais informaram não haver imagens das crianças. O MP requisitou o material e as encontrou!
Além de lidar com a dor de não saber onde e como estão seus garotos, as famílias sentem o desamparo de um Estado que as negligencia. Tivessem eles outra cor de pele e uma posição social diferente, a condução das investigações seria a mesma? Três crianças não desaparecem sem deixar rastros, a não ser que sejam pretas e pobres.
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