OPINIÃO

Visto, lido e ouvido — Revendo a Lei de Segurança Nacional

Correio Braziliense
postado em 23/04/2021 06:00

Por Circe Cunha (interina) // circecunha.df@dabr.com.br Desde 1960 

Nenhum outro ato criminoso possui maior poder de atentar contra a segurança nacional e a ordem política e social do que a corrupção em todas as suas modalidades. Esse enunciado bem que poderia ser inscrito logo no artigo primeiro de toda e qualquer Lei de Segurança Nacional que venha a ser promulgada com o intuito de proteger o Estado democrático. Em princípio, não deveria existir nenhum instrumento jurídico intitulado Lei de Segurança Nacional, pois, tal instrumento, ao colocar o indivíduo sob a alça de mira do poderoso aparato do Estado, explicita, de forma flagrante, a desigualdade entre um e outro, tolhendo logo de saída, toda e qualquer chance de direito à liberdade de expressão e mesmo ao exercício da cidadania plena.

Nada é mais afrontoso e danoso para a segurança do Estado Democrático de Direito do que privilégios e outras prerrogativas de foro e outras mil vantagens de que gozam indivíduos e grupos instalados no topo dos Três Poderes. Esses sim, por suas seguidas más ações, têm atentado contra o Estado democrático de Direito, a cidadania e o futuro de muitas gerações de brasileiros.

Usar e abusar da LSN, como têm feito costumeiramente agora os Poderes do Estado, para perseguir e prender aqueles que ousam criticar os desmandos e a onipotência dessa elite, nem de longe obedece ao que orienta a Constituição de 1988 em seu Art. 5º. Se for para dar continuidade, numa versão repaginada, como querem alguns políticos amedrontados com o crescimento da insatisfação geral da população, que se torne, então, uma lei a ser posta exclusivamente a serviço da sociedade contra os desmandos de muitos personagens instalados nos altos postos do Estado.

Para ser uma legítima LSN, é preciso inverter a ordem dos sujeitos, colocando a nação como vítima direta desses atentados e não áulicos vaidosos e emplumados. Esses atos atentatórios contra a segurança nacional são sentidos de fato quando se assiste ao conluio orquestrados pelos Poderes para manter o status quo de proteção somente das elites. Não se pode falar em segurança nacional quando a nação assiste, aturdia, as repetidas ações de ministros das altas cortes protegendo atos comprovados de corrupção praticados por políticos poderosos, gerando, assim, o que todos já reconhecem como sendo a maior inversão de valores éticos de que se tem notícia nos dias atuais.

A simples menção a uma LSN em meio à insegurança jurídica total provocada pela Suprema Corte, ao anular prisão em segunda instância, anular os julgamentos do ex-presidente Lula e ainda colocar sob suspeição os juízes que condenaram a maior quadrilha já surgida no Ocidente, chega a ser uma ironia fina ao estilo das melhores novelas de realidade fantástica.

Em entrevista recente, o jurista Ives Gandra Martins reconheceu essa realidade ao afirmar: “Esse Supremo, infelizmente, perante o povo, está completamente desfigurado, apesar de ter grandes figuras dentro da Corte. É isso que me entristece e me constrange. É isso que me traz desconforto, porque, para pessoas que admiro, sou obrigado a criticar aquilo que eles ministros estão agindo, da forma como estão agindo”.

Do mesmo modo, do outro lado da Praça dos Três Poderes, o Parlamento insiste em desfigurar leis anticorrupção, mesmo aquelas de iniciativa popular. O parlamento insiste em manter os privilégios já por demais condenados pela população. O mesmo ocorre no Executivo, onde o presidente usa das prerrogativas que possui para blindar sua família contra as bisbilhotices das investigações feitas por agentes da lei, interferir em investigações incômodas para seu governo, além de buscar controlar outros órgãos do Estado, como a Polícia Federal, a Agência Brasileira de Inteligência e outras. São essas e outras muitas ações que, verdadeiramente, atentam contra a segurança nacional, e não críticas de quem quer que seja.

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