Desde 1960

Visto, lido e ouvido — Quando esse dia chegar

Circe Cunha (interina)
postado em 13/05/2021 06:00

É certo que um dia, não muito distante, alguns ou muitos dos figurões envolvidos nas maiores trapaças de corrupção de nosso tempo irão revelar, em suas “memórias”, todo o imenso cipoal de negócios escusos que, durante as duas primeiras décadas de nosso século, quase levaram o Brasil à falência. Principalmente os protagonistas centrais de operações como a Lava-Jato e congêneres.

Até mesmo integrantes das altas cortes do Judiciário, que, nesses episódios, tiveram participações contra e a favor dos delinquentes de colarinho branco, terão muito a revelar quando esse dia chegar. Basta apenas que um desses personagens, acometidos pelos remorsos que a idade avançada traz em sua bagagem volumosa, venha a ter um surto de sinceridade pré-morte, confessando tudo para aliviar o peso excessivo de suas lembranças para a viagem eterna.

A partir daí, como num processo desembestado de inércia todos irão contar o que viram e ouviram, até para não ficarem diminuídos nessa trama farsesca. Por certo, haverá aqueles que, por pretenso dever ideológico, nada dirão. Ou se vierem a narrar suas façanhas, o farão não no papel de vilão, mas travestido do mais nobre dos ideais. Para esses farsantes, a idade avançada tratou de transformá-los não em velhos, mas em velhacos, com todas as suas rugas e resmungos falsos.

Esse, enfim, seria um processo natural de passar o país a limpo e expor os fatos tal como eles ocorreram e não como imaginam a Justiça, a mídia e os bajuladores. O método correto para repor as coisas em seus devidos lugares, como fazem os países civilizados, expondo toda a verdade ao público, para que histórias como essas não voltem a se repetir, deveria ser feito nos tribunais, dando a cada um desses famigerados protagonistas, a pena segundo a atuação de cada um.

Mas, em se tratando do Brasil inzoneiro e do “jeitinho”, o que parecia, num primeiro momento, uma verdadeira revolução de costumes, mandando todos os implicados direto para o xadrez, virou uma ciranda em que aos poucos cada um foi sendo posto em liberdade, revendo todo o gigantesco processo, como se nada tivesse ocorrido de fato.

Pelas firulas e as filigranas jurídicas, um a um foi sendo solto, de volta às ruas e potencialmente a novos crimes. Pelas mesmas brechas, os juízes e rábulas fizeram das leis o seu avesso e hoje condenam aqueles que ousaram condenar gente tão poderosa.

Quando esse dia chegar, é quase certo que muitos desses emplumados advogados de defesa, enriquecidos com os honorários oriundos do farto butim, talvez venham a revelar ao público as confissões inconfessáveis de seus clientes.

De certo, sabe-se apenas que, quando esse dia chegar, se chegar, a maioria dos membros dessa verdadeira quadrilha estatal já estará, para fins da Justiça e da lei redigidas pelos homens, anistiados, perdoados, arquivados, prescritos e até esquecidos. Mas terão, de fato, acertado as contas com o cidadão de bem que tudo acompanhou perplexo? Terão acertados as contas com a ética pública? Estarão, de fato, perdoados pela história?

 

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