FUTEBOL

Colômbia ensina, Conmebol não aprende

Marcos Paulo Lima
postado em 15/05/2021 07:00

Há quatro anos e meio, a Colômbia foi protagonista de um ato de humanidade. O acidente aéreo da Chapecoense, a poucos quilômetros da aterrissagem no aeroporto internacional de Medellín para a final da Copa Sul-Americana, mobilizou o país. Torcedores lotaram o estádio Atanasio Girardot, no dia e horário em que a decisão seria disputada, para chorar pelas 71 vítimas. Interceder pela saúde dos sobreviventes. Enviar mensagens de condolências ao Brasil.

A primeira prova de generosidade foi dada pelo então técnico do Atlético Nacional, Reinaldo Rueda. “Sugeri à diretoria e aos jogadores que a Chapecoense seja proclamada campeã da Copa Sul-Americana. Não precisamos dividir o título. Esses meninos são heróis”, disse à época, em entrevista a este jornalista. Assim foi. A Chape recebeu a taça.

A sensibilidade da Colômbia naqueles dias falta à Confederação Sul-Americana de Futebol (Conmebol) para lidar com a dor da própria Colômbia. A nação filiada a ela está em convulsão social. Manifestações contra a proposta de aumento de impostos enviada pelo presidente Iván Duque Márquez ao Congresso transformaram o país em campo de batalha.

A marcha da insensatez não para. A Conmebol manteve Atlético-MG x América de Cáli, em Barranquilla, como se nada estivesse acontecendo. O jogo foi paralisado quatro vezes. O pau quebrou nos arredores do estádio. O gás lacrimogêneo usado pela polícia na tentativa de dispersar manifestantes chegou ao gramado. Bombas eram ouvidas enquanto a bola rolava.

Jogadores, técnicos, árbitros... ninguém foi capaz de colocar a bola embaixo do braço, dar um basta naquilo e suspender a partida. O show de horrores continuou até o fim. Entre mortos e feridos, salvou-se a tabela e a insensibilidade da Conmebol: o Atlético-MG venceu por 3 x 1.

Acha que acabou? Daqui a menos de um mês, a Colômbia receberá a Copa América. É uma das anfitriãs, em parceria com a Argentina. Os jogos da Zona Norte, grupo do Brasil, têm como sede as cidades de Barranquilla, Cáli, Medellín e Bogotá.

Já vi esse filme. Há 20 anos, a Colômbia recebeu o evento na marra em momento semelhante. Havia terrorismo deflagrado pela crise entre as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARCs) e o governo. Seis atentados, 12 mortes, 161 feridos e os sequestros do coordenador da Copa América e do vice-presidente da Federação colocaram o evento em xeque.

Nem o boicote da Argentina sensibilizou a Conmebol, que convidou Honduras e não cancelou a Copa América 2001. O circo cumpriu a missão política que o refúgio dos covardes exigia: alienou. A Colômbia foi campeã em casa. Era o que interessava. É assim na insensível América do Sul. E continuará sendo enquanto os protagonistas do jogo continuarem sendo fantoches.

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