Por Carlos Rodolfo Schneider — Empresário, um dos idealizadores do Movimento Brasil Eficiente (MBE), membro do Conselho Superior de Economia da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e do Conselho Empresarial da América Latina (Ceal)
Se existe um problema crônico na gestão pública brasileira é a pressão por mais gastos. Vinda de todos os poderes, nos três níveis da Federação. Por vezes, mais de um, e outras, mais de outro. A realidade é que o Estado brasileiro gasta muito, gasta mal, e cada vez mais. Estudo do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) indicou que o desperdício de recursos públicos no Brasil foi de 4% do PIB (US$ 68 bilhões) em 2019. É o que nos falta para os investimentos que fariam toda a diferença para o crescimento do país, sem gerar risco fiscal.
O economista Márcio Garcia aponta que, ao longo do tempo, várias medidas procuraram conter o contínuo avanço do gasto público, com destaque para a Lei de Responsabilidade Fiscal e o Teto dos Gastos, e que agora “tais controles estão fazendo o sistema ranger, sob a fortíssima pressão política por mais gastos”. Pressão vinda do Congresso Nacional, que inicialmente aprovou um orçamento fictício, inexequível, reduzindo artificialmente gastos obrigatórios que ele mesmo validou e que não podem ser reduzidos, para poder embutir um nível indecente de emendas parlamentares destinadas a atender interesses muitas vezes eleitoreiros de deputados e senadores.
E pior, no meio de grave crise sanitária, esses gastos propostos nada têm a ver com o combate à pandemia. É como se a função pública permitisse ao seu ocupante escolher usufruir os bônus do gasto e transferir a responsabilidade fiscal aos outros. É a recorrente criação de um mundo irreal, de desrespeito à sociedade e às futuras gerações, que tem custado caro ao país. Um Brasil de muitas riquezas e de pouco progresso, que vem há vinte anos crescendo menos do que os demais países em desenvolvimento.
O ano de 2020 foi absolutamente atípico e exigiu gastos inéditos para fazer frente a uma pandemia que praticamente paralisou o planeta. O Brasil foi um dos países que mais gastou com a proteção aos mais vulneráveis e à preservação de empregos, em linha com os países desenvolvidos e, por isso, também teve uma retração do PIB menor do que o esperado. E esse nível maior de gastos também permitiu uma forte recuperação da economia no segundo semestre, especialmente de setores ligados à produção de bens duráveis, intermediários e farmacêuticos, e serviços ligados à saúde, para onde foi direcionado o aumento de poupança proveniente do pacote de ajuda emergencial.
Esse aumento de gastos do governo, todavia, levou ao forte crescimento da dívida pública, que chegou a 89,3% do PIB, e a um deficit primário de R$ 743 bilhões. Como bem alertou o ex-presidente do Banco Central Henrique Meirelles, “os gastos foram necessários, mas é preciso parar, é preciso ter um limite... A pior coisa seria sair de uma crise sanitária e entrar numa crise fiscal”. E essa conta que foi criada precisa ser paga, ou por aumento de carga tributária, que a sociedade não aceita mais, ou por uma trajetória explosiva da dívida pública, que certamente comprometeria o crescimento e nos levaria a um passado de má lembrança, ou por um caminho saudável, que permitiria manter baixas taxas de juros, aumento de investimentos e do emprego, que é o das reformas, somado ao controle dos gastos correntes e obrigatórios do Estado, e dos gastos tributários. E há espaço para esse enxugamento, considerando que a máquina pública custa hoje 20% do PIB, num momento em que o governo não tem recursos para investir, e presta serviços de terceiro mundo à sociedade. É o rabo balançando o cachorro. Desnecessário dizer que a velocidade do programa de vacinação potencializa o processo de recuperação.
Segundo levantamento do economista Fernando Rezende, a proposta orçamentária do governo para 2021 apontava previsão de R$ 1,476 trilhão para despesas obrigatórias e R$ 1,333 trilhão de receitas primárias líquidas. O que significa nenhum espaço para outros gastos, muito menos para os R$ 26,5 bilhões em emendas parlamentares adicionais embutidas pelo relator, o senador Márcio Bittar, na proposta inicialmente aprovada no Legislativo. Para apagar o incêndio gerado pelo embate do governo com o Parlamento na questão do orçamento, foi aprovado o projeto de lei do Congresso Nacional (PLN 2), excluindo do teto e do resultado primário os gastos com a covid-19, uma continha de R$ 110 bilhões, e sem um limite predeterminado. E com o risco, novamente, de tornar permanentes parte desses gastos, como o Pronampe — programa de financiamento às micro e pequenas empresas. Isso remete à pessoa que gasta mais do que ganha e busca um novo cartão de crédito para resolver o problema.
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