Por SOUZA PRUDENTE — Desembargador federal, diretor da Escola Superior da Magistratura Federal da 1ª Região (Esmaf)
A saúde, como garantia fundamental assegurada em nossa Carta Magna, é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação (artigo 196, da Constituição Federal). Nesse mesmo sentido, a Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas afirma que “os povos indígenas têm direito a suas próprias medicinas tradicionais e a manter suas práticas de saúde, bem como desfrutar do nível mais alto possível de saúde, e os Estados devem tomar as medidas necessárias para atingir progressivamente a plena realização deste direito” (artigo 24).
Com efeito, mostra-se totalmente inadmissível a protelação administrativa em operacionalizar o acesso dos referidos indígenas ao Sistema Universal de Saúde – SUS, considerando-se a essencialidade do bem jurídico pretendido, impondo-se, na espécie, a intervenção do Poder Judiciário Republicano, para assegurar o direito à saúde e à vida das comunidades indígenas, que se encontram constitucionalmente tuteladas (CF, arts. 5º, XXXV e 231, caput e respectivo parágrafo 3º), não havendo que se falar em afronta à separação de Poderes. Por outro lado, a simples existência de política pública especial voltada para a atenção à saúde da população indígena não exime o Poder Público de efetivamente, proporcionar o exercício do direito constitucional à saúde integral, gratuito e incondicional das comunidades indígenas no Brasil, bem assim em todo o planeta.
Ademais, cumpre destacar que, na inteligência jurisprudencial do egrégio Supremo Tribunal Federal, “a cláusula da reserva do possível — que não pode ser invocada pelo Poder Público com o propósito de fraudar, de frustrar e de inviabilizar a implementação de políticas públicas definidas na própria Constituição — encontra insuperável limitação na garantia constitucional do mínimo existencial, que representa, no contexto de nosso ordenamento positivo, emanação direta do postulado da essencial dignidade da pessoa humana. A noção de “mínimo existencial”, que resulta, por implicitude, de determinados preceitos constitucionais (CF, art. 1º, III, e art. 3º, III), compreende um complexo de prerrogativas cuja concretização revela-se capaz de garantir condições adequadas de existência digna, em ordem a assegurar, à pessoa, acesso efetivo ao direito geral de liberdade e, também, a prestações positivas originárias do Estado, viabilizadoras da plena fruição de direitos sociais básicos, tais como o direito à educação, o direito à proteção integral da criança e do adolescente, o direito à saúde, o direito à assistência social, o direito à moradia, o direito à alimentação e o direito à segurança.” (ARE 639337 AgR, Relator(a): min. Celso de Mello, Segunda Turma, julgado em 23/08/2011, DJe-177 Divulg 14-09-2011 Public 15-09-2011 Ement Vol-02587-01 PP-00125).
Em tempo de epidemia global do coronavírus, todos os seres vivos (por óbvio, também as comunidades indígenas do Brasil e do planeta Terra) têm direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, com a preservação de seus ecossistemas essenciais à sadia qualidade de vida, devendo o Poder Público (inclusive, o Poder Judiciário) e a coletividade defendê-los e preservá-los para as presentes e futuras gerações (CF, art. 225, caput), no combate constante ao Ecocídio sócio-ambiental, transfronteiriço e intergeracional.
Nesse propósito, busca-se, sobretudo, a implantação e o fortalecimento do Estado de Direito Ambiental, assim proclamado na Declaração Mundial da União Interamericana para a Conservação da Natureza (IUCN), na conclusão do Congresso Mundial de Direito Ambiental, realizado na cidade do Rio de Janeiro (Brasil), de 26 a 29 de abril de 2016, do qual resultaram princípios gerais e emergentes para promover e alcançar a justiça ambiental, merecendo destaque, dentre outros, o seguinte: Princípio 8 Equidade intergeracional: “A geração atual deve garantir que a saúde, a diversidade, as funções ecológicas e a beleza estética do meio ambiente seja mantida ou restaurada para fornecer acesso equitativo aos seus benefícios para cada geração sucessiva”.
Notícias pelo celular
Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.
Dê a sua opinião
O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.