OPINIÃO

Visto, lido e ouvido — Pazuello em seu labirinto

Circe Cunha (interina)
postado em 05/06/2021 06:00

Em O general em seu labirinto, o escritor e prêmio Nobel de literatura em 1972, Gabriel Garcia Marquez (1927-2014), narra, em romance histórico, os últimos dias de vida de Simón Bolívar, conhecido como “O Salvador” e considerado por muitos como o grande herói da independência de parte do continente latino-americano, a Nova Granada.

Nesse livro, o que emerge das páginas é um personagem de carne e osso, com todas as suas contradições humanas, ressaltadas ainda mais pela idade avançada, que faz com que esse herói se dispa de sua imagem de mito, mostrando toda a sua decrepitude de um fim de vida melancólico, aumentada por sua dependência física de seu criado pessoal.

Guardadas as devidas e distantes diferenças entre esse personagem e o nosso já famoso e notório general Pazuello, que caiu nas graças do presidente, o que nos resta, em termos de analogia entre o protagonista do romance famoso e o nosso estrelado militar pode ser resumido apenas no sugestivo título do livro. É justamente nessa espécie de labirinto, à brasileira, que, de repente, ganhou destaque nacional o referido general Pazuello.

Não por suas proezas e façanhas, que inexistem, mas por sua absoluta falta de vontade própria, a transparecer no seu desânimo e apatia acentuados, e que o levou a afirmar que se submetia às ordens de um simples capitão, expulso do Exército. Surpreendentemente, foi sua inércia e subserviência cega que acabaram por deflagrar, ao menos, duas severas crises internas ao governo que serve.

Realmente, Pazuello está enclausurado em seu labirinto, mas não está sozinho. Depois de sua passagem caótica no Ministério da Saúde, numa ocasião em que os brasileiros morriam como moscas nas portas dos hospitais superlotados, fato que o levou a ser o principal depoente na CPI da Covid e que muitos apostam poder lhe custar a liberdade, mais uma vez, esse nosso general às avessas, por seu esmorecimento, subiu inadvertidamente em um palanque político, esquecendo-se de que esse gesto é vedado a militares da ativa, conforme inciso V, parágrafo 3º do Art. 142 da Constituição e o Estatuto das Forças Armadas.

Mesmo contrariando o que dizem as normas, o general, por interferência direta do próprio presidente, não foi punido, como era a expectativa geral da maioria absoluta do oficialato. Com isso, o presidente da República, uma vez mais, fez valer sua vontade pessoal, como várias autoridades do país.

Trata-se, aqui, de uma crise e tanto, cujos desdobramentos podem ser lançados para o futuro, mas que, por certo virão para quem sabe romper com essa ideia estapafúrdia de denominar essa Força de “meu Exército”.

 

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