De forma trágica, como era a expectativa, chegou ao fim a caçada a Lázaro Barbosa Sousa, 32 anos. Nos últimos 20 dias, as buscas pelo criminoso na região do Entorno do Distrito Federal mobilizaram a atenção de todo o país, chegando a deixar em segundo plano a audiência da cobertura da pandemia e da CPI da Covid. Cerca de 300 integrantes das forças de segurança do DF e de Goiás, além de agentes da Polícia Federal e da Polícia Rodoviária Federal, participaram da megaoperação, reforçada ainda por cães farejadores, cavalaria, drones equipados com visão noturna e helicópteros. Ele foi morto pela polícia na manhã de ontem, em Águas Lindas de Goiás. O ódio a mulheres, que torturava, estuprava e matava a sangue frio, era uma das características mais sombrias e cruéis do assassino. Infelizmente, esse tipo de crime, que tem como principal marca a covardia dos autores, cresce de forma assustadora no país. É preciso estancar a escalada do feminicídio no Brasil.
Em entrevista ao Correio Braziliense, no domingo, a idealizadora e executora do projeto Mulheres Inspiradoras, reconhecido com o 4º Prêmio Nacional de Educação em Direitos Humanos, o 8º Prêmio Professores do Brasil e o 1º Prêmio Ibero-Americano de Educação em Direitos Humanos, Gina Vieira Ponte observa que a base da história brasileira é patriarcal, colonial, racista, sexista e prepara mulheres para se preocuparem quase que unicamente com o culto à beleza, o casamento e a submissão aos homens. “O machismo está em todas as estruturas sociais. Ele está naturalizado: na escola, quando ainda se diz que existe brinquedo de menino e brinquedo de menina; nos jogos de videogame, marcados pela hipersexualização dos corpos femininos e pela celebração da cultura da violência. Ainda que não tenhamos consciência disso, como sujeitos sócio-históricos que somos, o machismo habita todos nós, em menor ou maior grau”, diagnostica.
Mulher e negra, forjada na luta permanente contra o preconceito e a discriminação racial, de gênero e de cor, a professora Gina não se contenta apenas em apontar as causas da tragédia que envergonha todos nós. Ela propõe caminhos para mudar a cultura do machismo. E a arma mais potente que enxerga está em um modelo de ensino que leve a transformações na sociedade. “Não há democracia sem respeito à diversidade”, afirma. “É preciso educar as meninas e os meninos para que eles tenham vidas plenas, sem as limitações dos estereótipos de gênero. É preciso educar as meninas, desde cedo, para se sentirem fortes, inteligentes, capazes e em plenas condições de serem protagonistas das suas histórias”, defende.
Ainda há muitas lutas a serem travadas e um longo caminho a ser percorrido até que transformações como as propostas por Gina Vieira Ponte se tornem efetivamente realidade. Mas os primeiros passos já começam a ser dados. “Não por acaso, em 10 de julho, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação foi alterada e determinou a obrigatoriedade de que incluam em seus projetos político-pedagógicos a proposta de uma educação que promova a valorização de mulheres e que colabore na prevenção, no enfrentamento e no combate à violência contra as meninas e as mulheres”, destaca a educadora.
No Distrito Federal, onde Lázaro iniciou o banho de sangue que o levou a ser caçado e morto no estado vizinho, investigações da polícia o apontam como o autor da chacina que matou uma família inteira — pai, mãe e dois filhos. Antes de matar a matriarca, ele a torturou e a estuprou. Por trás dessa barbárie recorrente contra as mulheres, está o machismo, o gatilho para o feminicídio. No DF, no primeiro semestre deste ano, foram registradas 16 ocorrências desse tipo — uma a menos do que no ano passado inteiro. Dos autores do crime, 14 tinham antecedentes criminais. Por isso, uma nova cultura, a educação desde cedo, é tão importante para mudar essa trágica realidade.
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