OPINIÃO

Artigo: A paz no Sul do Cáucaso está ao nosso alcance?

Correio Braziliense
postado em 13/07/2021 06:00

Por ARMAN AKOPIAN — Embaixador da Armênia no Brasil

O embaixador Elkhan Polukhov do Azerbaijão publicou um artigo no Correio Braziliense em que anunciou o início de uma nova era no Sul do Cáucaso, mas tentou mais uma vez distorcer a imagem da Armênia. A paz em nossa região é de fato um desejo sincero de todos os povos que ali vivem. Mas está ao nosso alcance hoje? Infelizmente, as realidades no terreno não são tão otimistas como as apresentadas no artigo.

É questionável que uma paz genuína em uma região turbulenta possa ser estabelecida por meio de uma violação grosseira do direito internacional. A agressão contra Artsakh (Nagorno-Karabakh) desencadeada pelo Azerbaijão com o forte envolvimento de terceiros, incluindo mercenários islâmicos, resultou na guerra mais brutal do século 21, com milhares de vítimas de ambos os lados.

Foi uma violação não só do direito internacional em geral, mas também dos princípios básicos da resolução do conflito com os quais o Azerbaijão concordou — não uso da força e a ameaça do uso da força, a resolução do conflito exclusivamente por meio de negociações sob a mediação dos EUA, Rússia e França. Hoje, o Azerbaijão está tentando criar a ilusão de que o conflito de Nagorno-Karabakh não existe mais. No entanto, o conflito ainda existe e aguarda sua resolução final que só pode ser alcançada por meios pacíficos.

A conduta destrutiva do Azerbaijão contradiz sua própria propaganda. Quase todos os artigos dos acordos que encerraram a guerra estão sendo violados por Baku. O destino dos prisioneiros de guerra armênios é o exemplo mais cínico e desumano de tais violações.

Os acordos obrigaram ambos os lados a trocarem todos os prisioneiros de guerra incondicionalmente e, enquanto a Armênia respeitou seus compromissos, o Azerbaijão continua detendo dezenas de prisioneiros armênios e tenta usá-los como moeda de troca, como um instrumento de pressão sobre a Armênia. Ainda mais, o Azerbaijão declarou os prisioneiros armênios “terroristas”, encenou procedimentos propagandísticos no tribunal e sentenciou muitos deles a anos de prisão.

Colocar um armênio na prisão no país, onde um homem que decapitou um armênio adormecido foi declarado herói nacional, equivale a uma sentença de morte. O tratamento dos prisioneiros de guerra como terroristas é um fenômeno sem precedentes que vai além de todas as convenções internacionais, transgride os limites da dignidade humana e aguarda sua condenação pela comunidade internacional. Felizmente, alguns prisioneiros foram eventualmente libertados por causa da forte pressão da União Europeia, de vários países e organizações internacionais e dos esforços de mediadores internacionais.

O Azerbaijão segue uma política de intimidação e guerra psicológica. Provocações nas fronteiras e incursões em território armênio tornaram-se uma rotina diária. O incidente com a mina, mencionado pelo embaixador Polukhov, é uma das provocações mais recentes. Não passa um dia sem que o presidente Aliyev soe novas ameaças contra a Armênia, misturadas com discurso de ódio contra armênios. O vergonhoso Park de Troféus em Baku, que exibe degradantes figuras de cera de soldados armênios moribundos, tornou-se um lugar onde as crianças azeris recebem aulas de patriotismo. Aparentemente, hoje toda a noção de patriotismo no Azerbaijão é baseada no ódio aos armênios. Ao cultivar esses instintos primitivos, o regime de Aliyev tenta desviar a atenção de seus próprios abusos flagrantes dos direitos humanos e canalizar o crescente protesto da sociedade civil contra o inimigo externo.

O tratamento do patrimônio cultural cristão armênio nas regiões sob controle azeri é uma outra questão de extrema preocupação. O Azerbaijão tenta eliminar todas as evidências da presença milenar dos armênios em Artsakh e arredores. Antigos mosteiros, igrejas, cemitérios, esculturas e afrescos armênios estão sob ameaça de destruição, alguns já foram destruídos, alguns estão sendo modificados para esconder suas características armênias distintas. O próprio presidente Aliyev ordenou a eliminação de antigas inscrições armênias de uma igreja que ele declarou “não armênia”. Essa é uma manifestação da política de estado que visa apresentar o patrimônio cultural cristão armênio como pertencente aos outros povos.

Sim, todos nós queremos paz e estabilidade para nossa região. Mas, para atingir esse objetivo, esse desejo deve ser sincero e livre do pesado legado da guerra. Estamos no início de um longo caminho que nem a Armênia, nem o Azerbaijão podem terminar sozinhos, um sem o outro. Só assim a paz finalmente estará ao nosso alcance.

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