OPINIÃO

Artigo: Sobre Cuba e Haiti

Rodrigo Craveiro
postado em 14/07/2021 06:00

Estive três dias em Havana e um em Porto Príncipe, em 2012. A capital de Cuba é uma cidade de povo hospitaleiro, acolhedor e, sobretudo, patriota. Murais e outdoors relembram as figuras de Fidel Castro e de Ernesto Che Guevara, artífices da revolução que depôs Fulgêncio Batista e impôs o socialismo na ilha. Vários cubanos com quem conversei disseram sentir imenso orgulho de sua terra e se ressentiram pelo fato de o sistema econômico impossibilitar que conheçam outros países. É impossível não se apaixonar por Havana. O tradicional Malecón, o calçadão à beira-mar; os velhos casarões da Cidade Velha; o som do Buena Vista Social Club a tocar dentro de uma casa qualquer; os carros Buick e Lada anos 1950. Mas também vi um certo temor de cidadãos falarem com a imprensa. Alguns davam respostas lacônicas, outros afirmavam que estavam sendo observados.

Nos últimos anos, desde a morte de Fidel Castro, o regime impulsionou algumas reformas econômicas. Mas, o bloqueio imposto pelo presidente norte-americano Dwight Eisenhower, em 19 de outubro de 1960, custou muito à ilha, que vive a pior crise econômica dos últimos 30 anos. A pandemia da covid-19 agravou ainda mais a situação. No último domingo, milhares de cubanos saíram às ruas de várias cidades para protestar contra o governo de Miguel Díaz-Canel. Gritaram por liberdade e pediram o fim da ditadura. O regime reagiu com repressão. Talvez Cuba esteja passando por um ponto de inflexão, o despertar rumo a uma guinada do modelo político-econômico. Mas é inexorável que a revolução segue viva em parte da população.

Bastou um dia em Porto Príncipe, capital do Haiti, para perceber como a miséria, a violência galopante e os desastres naturais colocaram 11,1 milhões de pessoas em um futuro praticamente sem perspectiva alguma. Há exatamente uma semana, o presidente Jovenel Moïse foi torturado e assassinado dentro da residência oficial por um comando armado. A polícia prendeu 28 pessoas, além do suposto mandante do magnicídio: um médico haitiano que planejava se tornar presidente.

A morte de Jovenel lança mais incerteza aos rumos de uma nação dominada por gangues armadas. A Minustah, força de paz da ONU comandada pelo Brasil, foi incapaz de estabilizar o Haiti. Os dois países do Caribe passam por momentos talvez decisivos em sua história. Talvez o crime que ceifou a vida de Jovenel seja o catalisador de um comprometimento mais sólido da comunidade internacional com o Haiti. Talvez os protestos sem precedentes em Cuba sejam a oportunidade para uma janela democrática e para os Estados Unidos colocarem fim ao vergonhoso bloqueio.

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