Num país em que o analfabetismo, segundo estimativas otimistas divulgadas pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua Educação, atinge cerca de 11 milhões de brasileiros, não fica difícil estimar a possibilidade da existência de um significativo número de dirigentes ou de pessoas com cargos ou funções administrativas de relevância com alguém próximo dessa realidade preocupante.
Se formos analisar, ainda, a questão do chamado analfabetismo funcional, que atinge mais de 29% da nossa população e no qual se observa que o indivíduo, mesmo reconhecendo as letras e os números e outros dados em uma leitura, não consegue captar a ideia central e o conteúdo do que está expresso no texto —aí a questão adquire uma amplitude deveras preocupante. Mesmos os eleitores, em diversas ocasiões, puderam verificar que muitos daqueles candidatos políticos ou mesmo ocupantes de cargos de relevância na administração do país podem ser enquadrados como analfabetos funcionais, guindados aos postos por obra de acontecimentos fortuitos como o destino, a sorte ou outra explicação de natureza, digamos, cordial.
Não seria o caso, aqui, de propor um movimento de discriminação de ordem cultural, perseguindo aqueles indivíduos com pouca escolaridade e que ocupam cargos de importância para a vida da nação, mas tão somente, dar aos que têm o devido estofo intelectual e técnico a oportunidade de ocuparem essas funções tão vitais ao país. Dito dessa forma, torna claro, e sem sentimentalismos, que o cargo e a função cabem apenas àqueles que estão à altura e preparados para exercê-los. É assim em todo o país desenvolvido, e tem funcionado muito bem até aqui.
A vanglória do analfabetismo e o combate à cultura, de um modo geral, como temos assistido até aqui por lideranças, inclusive por presidentes da República, que se gabam de não a ter e até zombam daqueles que a tem, é sinal bem claro que passamos da hora de interromper esse disparate.
Não se pode admitir que, até em concurso para vaga de gari ou, como dizem, “agente de limpeza pública”, exija-se currículo e formação em segundo grau, seguido de atestado de bons antecedentes e para outras funções de maior relevância, algumas delas que dizem respeito à segurança do país, esses quesitos sejam simplesmente ignorados.
Temos visto e nos surpreendido com nomeações feitas pelo Poder Executivo de ministros para vagas nas altas cortes, de pessoas que, sabidamente, nunca exerceram a magistratura ou sequer envergaram a toga de juiz, numa afronta, inexplicável, aos princípios mais básicos e salutares para toda e qualquer democracia, e que, não raro, diminuem a qualidade dessas funções, transformando-as em instâncias para atendimentos de natureza pessoal, longe de seu objetivo primordial.
No mesmo sentido, vemos o loteamento de cargos vitais à economia entregues nas mãos de indivíduos pouco ou nada qualificados para a função. O mais surpreendente, se é que ainda possuímos a capacidade de tal indignação, é ver, com assento no parlamento, um conjunto significativo de pessoas que, por seu passado e por suas vidas pretéritas, repleta de malfeitos e de ações na Justiça, jamais deveriam estar naquela posição, exercendo funções que dizem respeito à vida e ao futuro da comunidade.
Talvez, o que falta nesse país seja o estabelecimento de um movimento sério de sabatina, como feito nos Estados Unidos, para cargos como da Suprema Corte, em que os indicados são submetidos à intensa e esmiuçada investigação, que levanta toda a existência do candidato, desde o berço, e que, em alguns casos, duram dias e dias de intensos debates e perguntas. Uma simples e escrupulosa sabatina em nossas elites dirigentes faria com que, pelo menos metade delas, desistissem de suas pretensões. Se fossem realizadas, então, para o cargo de presidente da República, pouquíssimos seriam aqueles habilitados a tal função.
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