opinião

Artigo: Um pai que amava a democracia

Ana Dubeux
postado em 08/08/2021 06:00 / atualizado em 08/08/2021 07:04
 (crédito: Reprodução/Free-Photos por Pixabay)
(crédito: Reprodução/Free-Photos por Pixabay)

Hoje vou acordar lembrando do meu pai. E, lembrando dele, talvez eu consiga esquecer por alguns momentos a situação dramática em que vivemos no Brasil. Vou lembrar do homem de bem, anfitrião maravilhoso e agregador, defensor das tradições nordestinas, leitor voraz de jornais e revistas e frasista de primeira linha.

Vou tentar rascunhar aqui no meu pensamento o que ele diria se visse o país combalido, ameaçado por hordas de fascistas, que se aglomeram para atentar contra a democracia brasileira. Vou ouvir Luiz Gonzaga e Quinteto Violado, que talvez afaste da minha cabeça e dos meus ouvidos o tom belicoso da voz de quem detesta a liberdade de ser e de viver do próximo, de quem humilha a honra de um pai que já morreu. Vou tentar fingir que somos governados por pessoas de bem, que lideram o país rumo ao desenvolvimento humano e político.

Papai lidava bem com a falta de dinheiro, mas não suportava a pobreza de espírito. Estaria hoje vibrando com as conquistas olímpicas de atletas que suportaram todo tipo de falta de apoio, mas esbanjaram esforço e confiança para trazer o ouro para nós. Vestiria a camisa do Brasil sem a menor vergonha das cores brasileiras, surrupiadas por quem se acha dono do Brasil. E, sim, celebraria, porque não sabia viver de outro jeito senão com a alegria de sempre e apesar de tudo.

Mais do que o feijão e o arroz de todo dia, meu pai se alimentava de sonhos, aqueles que não envelhecem e nem morrem. Em nenhum momento, duvidaria da nossa capacidade de ressurgir das cinzas e de refazer o caminho. Observador da cena política, papai dizia que a democracia é um banquete, fartura que não se conquista com dinheiro, mas com a certeza de que o país é de todos e para todos.

Neste momento, em que um presidente da República fabrica uma crise com o Poder Judiciário e assume uma postura golpista, liderando uma cruzada contra as urnas eletrônicas, é importante lembrar que somos feitos de algo maior, de homens e mulheres de bem, que certamente honrarão seu voto e a memória de todos os que lutaram bravamente para reconquistar a democracia.

Neste domingo, papai estaria em torno da mesa, comemorando o ouro do futebol nas Olimpíadas e brincando como sempre. Desejo que o seu pai esteja também festejando, onde quer que esteja. Vamos brindar à vida, porque é o que nos resta. Amanhã, a luta continua.

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